Recomendação do Conselho Nacional de Direitos Humanos reforça aplicação da PNAB e garantia dos direitos das populações atingidas
CNDH recomenda aplicação imediata de normas de direitos humanos, como a Política Nacional dos Atingidos por Barragens, em casos pendentes de reparação integral, incluindo o desastre-crime da Vale em Brumadinho

A Recomendação nº 08, de 08 de agosto de 2025, do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), recomenda a aplicação imediata de normas de direitos humanos vigentes, como a Política Nacional dos Atingidos por Barragens (Lei Federal 14.722/2023), a casos pendentes de reparação integral, mencionando explicitamente o crime do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho/MG
ENTENDA:
O Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), órgão colegiado independente, de caráter deliberativo e consultivo, que integra a estrutura da administração pública federal, expediu, nesta sexta-feira (08), a Recomendação nº 08/2025, recomendando que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), o Estado de Minas Gerais e as Instituições de Justiça (IJs) adotem, de forma imediata, o que dispõe a Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB – Lei 14.722/2023) em todos os casos pendentes de reparação, como o do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho.
O CNDH monitora o caso do rompimento de Brumadinho desde 2019, e suas recomendações anteriores, como a do auxílio emergencial não foram cumpridas integralmente. O documento retoma que há danos continuados e atrasos na reparação, além de cortes no orçamento da garantia do direito de assessorias técnicas independentes. Além disso, aponta que o Acordo Judicial (AJRI) de 2021, em Brumadinho, não abrangeu danos individuais e supervenientes e denuncia a criminalização e as ações judiciais contra defensores de direitos humanos conduzidas pela empresa Vale.
BREVE RESUMO DA RECOMENDAÇÃO Nº 08/2025 DO CNJ
O CNDH corrobora o entendimento defendido pelas pessoas atingidas e pelas Assessorias Técnicas Independentes, que compreendem a aplicação da PNAB como imprescindível para a garantia de direitos previstos na Constituição Federal, em diversas legislações nacionais e acordos internacionais ratificados pelo Brasil, visando a reparação integral dos danos causados pelas ações e omissões da mineradora.
A PNAB, aliás, é apontada pelo CNDH como legislação essencial para assegurar direitos fundamentais de comunidades atingidas, assegurando desde assessoria técnica independente – escolhida pelos próprios atingidos e custeada pelas empresas – até auxílio emergencial capaz de manter o padrão de vida das famílias enquanto não há recuperação das condições anteriores ao rompimento, por exemplo.
O documento ressalta os princípios norteadores da reparação integral, como o respeito à centralidade das vítimas, considerando especificidades culturais, territoriais e de modo de vida, especialmente de povos indígenas, quilombolas e comunidades tradicionais. Igualmente, a Recomendação identifica que a PNAB estabelece parâmetros claros para prevenção de novas violações e elenca dispositivos cuja finalidade é salvaguardar a participação direta dos atingidos nas negociações, nas decisões sobre indenizações e medidas de mitigação, no intuito de construir um caminho real para a devida reparação integral.
Além de cobrar o cumprimento de dispositivos legais e constitucionais, o CNDH denuncia atrasos e cortes orçamentários que dificultam o trabalho das Assessorias Técnicas Independentes e critica tentativas de empresas em criminalizar defensores de direitos humanos. Menciona os Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos, que abordam o dever do Estado de proteger contra abusos por terceiros (incluindo empresas), a responsabilidade corporativa de respeitar direitos humanos e o acesso a recursos para as vítimas.
O Conselho também frisa que a PNAB, ao consolidar direitos em nível federal, cria uma barreira sólida contra acordos que fragilizem garantias e contra a repetição de tragédias socioambientais.
EM SÍNTESE, QUAIS FORAM AS RECOMENDAÇÕES?
O Conselho indica ao CNJ a criação de um Grupo de Trabalho Nacional, com participação da sociedade civil e do CNDH, que acompanhe junto aos Tribunais de Justiça a implementação da Recomendação de nº 163/2025 do CNJ, que versa sobre processos estruturais.
De maneira ampla, é recomendado ao CNJ, ao TJMG, às IJs, ao Estado de Minas Gerais e à própria Vale S/A, maior transparência nos processos indenizatórios, divulgação integral de estudos e planos de reparação, consultas significativas às comunidades atingidas, para garantir a efetiva participação popular na estruturação e execução da reparação integral, inclusive o respeito a todos os direitos das Comunidades Tradicionais, Quilombolas e dos Povos Indígenas, observando o seu direito ao autogoverno e à manutenção da vida tradicional.
Abaixo estão especificadas as recomendações a cada uma das instituições e órgãos. Veja:
AS PRINCIPAIS RECOMENDAÇÕES SÃO DIRECIONADAS A: | |
Conselho Nacional de Justiça (CNJ) | Criar Grupo de Trabalho nacional para processos estruturais e aprovar nota técnica para aplicação da PNAB, garantindo auxílio emergencial e assessoria técnica independente. |
Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) | Aplicar imediatamente normas de direitos humanos e a PNAB, assegurando auxílio emergencial e assessoria técnica independente com participação dos atingidos. |
Ministério Público Federal, MPMG, MPT e Defensoria Pública de Minas Gerais | Assegurar a participação das comunidades atingidas nas negociações dos direitos previstos na PNAB, e respeitar os processos de escolha das Assessorias Técnicas Independentes. Também devem reforçar a transparência ativa sobre o fundo coletivo da reparação trabalhista. |
Empresa Vale S.A | Adotar medidas para garantir consultas significativas, assegurar a reparação integral (incluindo Povos Indígenas e Comunidades Tradicionais), respeitar seus direitos e assegurar a não repetição de danos. Deve abster-se de ajuizar novas ações contra defensores de direitos humanos. |
Estado de Minas Gerais | Divulgar imediatamente estudos ambientais e planos de reparação, e garantir acesso a informações para as assessorias técnicas independentes. |
IMPORTÂNCIA DAS RECOMENDAÇÕES E PRÓXIMOS PASSOS
A Recomendação n.º 08/2025 do CNDH é de extrema importância para as populações atingidas por barragens pois reitera a exigência da aplicação imediata da Política Nacional dos Atingidos por Barragens – PNAB (Lei Federal 14.722/2023) a casos ainda pendentes de reparação integral. As recomendações do CNDH funcionam como diretrizes e balizadores para a atuação judicial, visando a padronização e a efetivação de direitos, como o auxílio emergencial e a assessoria técnica independente para as pessoas atingidas por barragens. Para cobrar a efetivação de uma recomendação do CNDH, é necessária a participação organizada das comunidades atingidas para pressionar pela implementação.
Ou seja, para que a Recomendação ajude efetivamente na luta das pessoas atingidas, é fundamental que suas determinações sejam implementadas de forma imediata e integral por todas as instituições e pela empresa Vale S.A. Isso inclui a aplicação da PNAB aos casos pendentes, garantindo o direito ao auxílio emergencial com parâmetros definidos e duração adequada, bem como o acesso à ATI.
A recomendação impulsiona a participação ativa e direta das pessoas atingidas nas negociações e decisões sobre sua reparação, exige a transparência dos estudos e planos de reparação, e coíbe a criminalização de defensores de direitos humanos, protegendo quem atua na defesa dessas populações.
Ao impor responsabilidades ao sistema de justiça, à empresa e ao Estado, a recomendação serve como uma ferramenta poderosa para garantir a reparação integral e a não repetição de violações, fortalecendo a voz e os direitos das pessoas atingidas.
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Equipe de Estratégias Jurídicas da Reparação: Larissa Assunção e Daniel Silva