A Procuradoria de Justiça Especializada pede que a decisão da liquidação prevaleça e pedido da mineradora não seja acolhido
Prédio do Ministério Público de Minas Gerais, em Belo Horizonte. Foto: Reprodução MPMG

A Procuradoria de Justiça Especializada na defesa dos Direitos Difusos e Coletivos (MPMG), atuando como fiscal da lei, que significa defender o que está previsto em lei, apresentou parecer jurídico defendendo a manutenção da decisão pelo procedimento da liquidação coletiva. A procuradoria apresentou os seguintes argumentos: 

  • A legitimidade do Ministério Público
  • A inexistência de perícia de duplicidade
  • A manutenção da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) como perita judicial, responsável específica pela liquidação coletiva;
  • Inversão do ônus da prova, em favor da defesa técnica das pessoas atingidas 
  • A existência do Termo de compromisso (TC) firmado com a Defensoria Pública, não impede a indenização dos atingidos pela via judicial 

Abaixo seguem mais informações sobre cada um dos argumentos.

Legitimidade do Ministério Público (MPMG) 

Defendeu que passados mais de quatro anos sem o ingresso na justiça de pessoas interessadas em número compatível com a gravidade do dano, o Ministério Público (MPMG) tem legitimidade, ou seja, pode, pela lei, promover a liquidação e a execução da indenização devida dos direitos individuais homogêneos, conforme art. 82 do Código de Defesa do Consumidor. 

Afirmou que a realidade complexa e multifacetada do processo coletivo exige a adoção de técnicas coletivas diferenciadas também nas fases de liquidação e cumprimento da sentença, para que se confira efetividade à condenação da Vale, ou seja, para que as pessoas sejam de fato indenizadas pelos danos que sofreram devido ao rompimento. 

Sustentou que tratamento coletivo da demanda possibilita a uniformidade do julgamento de casos semelhantes e demonstra a relevância social do interesse defendido pela ação coletiva, qual seja, a liquidação coletiva. Além de dar rapidez à resolução do caso. 

Inexistência de perícia em duplicidade 

Argumentou que é possível definir pela perícia as pessoas atingidas, o prejuízo sofrido por cada uma. 

Disse que o produto da indenização será repartido entre elas, de acordo com a matriz de danos, a ser construída com a participação delas e com a atuação do perito judicial, o que tem fundamento no direito a um processo efetivo, previsto nos arts. 37, 5º, XXXV e LXXVIII, da CF e nos arts. 4º, 8º e 139, IV, do CPC. 

Explicou também, que a especificidade e complexidade do processo exigem novas perícias devido aos danos supervenientes, que são aqueles que não eram conhecidos no momento do acordo. 

Afirmou ainda, que após a sentença condenatória genérica é necessária a ampliação do objeto da perícia com a construção de uma matriz de danos e a nomeação de assistência técnica independente e especializada (ATI’s), para acompanhar as vítimas durante o processo, a demonstrar a necessidade do tratamento coletivo da questão. 

Além disso, disse que a nova perícia terá os objetivos de identificar os danos, as pessoas atingidas, as formas de comprovação da condição de atingido e a quantificação da indenização, que não estão incluídas nas perícias em andamento.  

Manutenção da UFMG, como perita judicial, responsável específica pela liquidação coletiva 

O MPMG defendeu a decisão judicial que instaurou o procedimento de liquidação coletiva, relativamente ao direito dos atingidos à reparação e indenização individual de seus danos, patrimoniais e extrapatrimoniais. 

Ademais, argumentou favoravelmente à designação da UFMG, como instituição responsável por  

realizar os estudos periciais que irão subsidiar a elaboração da matriz de danos, na fase atual do processo, qual seja, a liquidação coletiva. Vencida a etapa anterior, em que os estudos periciais verificaram o quadro geral de ocorrência dos danos, com base em amostragem extraída da população atingida, agora encaminha-se para uma nova fase.  

A etapa atual tem como objetivo a definição dos parâmetros da reparação individual (identificação dos danos, dos atingidos, das formas de comprovação da condição de atingido e quantificação da indenização). Conclui-se, assim, pela pertinência do trabalho pericial, que agora tem um novo desafio, diverso e complementar ao anterior. Com isso, o MP rejeita a alegação da Vale S.A de que estaria a ocorrer duplicidade dos trabalhos periciais.  

Inversão do ônus da prova, em favor da defesa técnica das pessoas atingidas 

O MPMG rejeita a tese da Vale de que o juízo já teria decidido, na fase de conhecimento, de forma contrária à inversão do ônus da prova. A mineradora alega se tratar de uma decisão definitiva (coisa julgada), com repercussões para fase de liquidação. Já o MP, em concordância com o juízo, afirma que agora estamos diante de uma nova decisão, relativa a uma nova situação jurídica, qual seja, a liquidação dos danos.  

Com a decisão judicial que inverte a responsabilidade probatória – para facilitar a elaboração da matriz de danos-, caberá à mineradora, toda vez que denegar o direito individual de um atingido, apresentar as provas que sustentam a sua versão. Ou seja, ela terá que comprovar as “refutações que fizer às afirmações das Instituições de Justiça, da Perícia e das Assessorias Técnicas Independentes que estejam lastreadas em laudos ou relatórios técnicos, ou na experiência comum subministradas pela observação do que ordinariamente acontece”  

Essa decisão levou em conta o princípio da centralidade do sofrimento dos atingidos por barragens, que estão em situação de desigualdade diante da evidente superioridade técnica e econômica da parte contrária, a Vale S.A. 

A existência do Termo de compromisso (TC) firmado com a Defensoria Pública, não impede a indenização dos atingidos pela via judicial 

O MPMG reafirma que a celebração do TC e a sua utilização como meio de efetivação das indenizações individuais não impede a existência de outras formas, complementares e simultâneas, de materialização dos direitos das pessoas atingidas. A existência de diversas vias, pelas quais possam se efetivar as indenizações individuais, corresponde a uma realidade atual e deriva do instituto jurídico chamado “sistema multiportas”. Assim, é legítima e adequada a via da liquidação coletiva, como meio para a efetivação dos direitos individuais dos atingidos, daquelas muitas milhares de pessoas que ainda não receberam a parte lhe cabe da indenização. 

Próximos Passos 

O caso agora segue para julgamento perante a 19ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e terá a relatoria do Desembargador André Leite Praça. 

Acesse o parecer jurídico clicando abaixo:

Texto: Estratégias Jurídicas da Reparação