Justiça determina que a CAMF corrija estudo de complementação de valores para continuidade das atividades da ATI nas Regiões 1 e 2
Juiz entende que os parâmetros utilizados pela CAMF em estudo de complementação de recursos foram injustificadamente desiguais, gerando possíveis prejuízos ao assessoramento técnico independente nas Regiões 1 e 2

Relembre
No início de agosto, as Instituições de Justiça (IJs) apresentaram Embargos de Declaração contra o despacho do Dr. Murilo, que pediu informações e documentos sobre as decisões contidas no Termo Aditivo para continuidade das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) pelos próximos 22 meses, no acompanhamento das atividades do projeto piloto do Anexo I.1. As IJs afirmaram que a decisão judicial foi omissa e continha obscuridades. Para além disso, reafirmaram o papel da CAMF e apresentaram defesa do estudo orçamentário desta instituição realizado em 2024 e atualizado em 2025.
Julgamento do recurso
O juiz negou os pedidos dos Embargos de Declaração apresentado pelas Instituições de Justiça, por se tratar de recurso apresentado contra despacho. O despacho é um ato de comunicação dentro do processo, que geralmente não possui caráter de decisão. Recursos são cabíveis somente contra decisões. Além disso, na oportunidade, o juiz também decidiu sobre os Termo Aditivos, com base nas informações apresentadas pelas IJs no recurso.
Em sede de contextualização, o juiz reafirma a importância da ATI para a execução do Anexo I.1, que somente se iniciou em 5/6/2025. Na decisão o juiz entende que, diante do início tardio de execução da proposta definitiva do Anexo I.1, o direito ao assessoramento técnico não estaria garantido pelo Termo de Compromisso (TC) firmado em 2023, já que o mesmo prevê o encerramento das ATIs em janeiro de 2026.
Tais constatações foram base para as IJs deliberarem sobre o novo aporte máximo de R$62.526.696,28 (sessenta e dois milhões quinhentos e vinte e seis mil seiscentos e noventa e seis reais e vinte e oito centavos) para viabilizar as atividades das ATIs, que são indispensáveis para a Execução do Projeto Piloto do Anexo I.1.
A decisão relembra que o valor total acima descrito constava na deliberação das Instituições de Justiça sobre a execução do Projeto Piloto do Anexo I.1 que foi homologada pelo Juiz em decisão anterior, mas a forma de distribuição dos valores por região não. Tendo solicitado documentos às IJs para entender melhor como se deu a definição, o juiz conheceu o “Ofício CAMF n.º 02/2025”, até então desconhecido, o que fundamenta a necessidade da decisão atual.
O juiz afirma que é preciso avaliar a forma de complementação dos recursos para as ATIs, que foi apresentada pela CAMF, para as atividades relativas à execução da Proposta Definitiva do Anexo I.1. Para isso, Dr. Murilo analisou as premissas apresentadas pela CAMF no ofício nº 02/2025, e entendeu que que a CAMF “não fez uso de um critério único para redefinir o gasto de cada ATI com recursos humanos ou justificou, adequadamente, as razões para a utilização de critérios diversos de tratamento”.
O ofício em análise apresentou o “Teto para complementações orçamentárias”, que consiste na diferença entre a estimativa do saldo orçamentário disponível de cada ATI em 01/03/2025 e as despesas com recursos humanos ajustadas de acordo com a proposta da CAMF, custos com logística e outros custos e despesas.
Para Dr. Murilo, o documento da CAMF não apresentou justificativa plausível para o tratamento diferente entre as três ATIs. Para fundamentar seu entendimento, discorre sobre os seguintes pontos do estudo da CAMF: colaboradores até o 12º mês; percentual de redução de colaboradores para o 2º ano de atividades; e orçamento complementar requerido.
Colaboradores até o 12º mês
O estudo da CAMF observa haver maior concentração de atividades das ATIs no primeiro ano do Anexo I.1, sendo esta premissa usada como justificativa para manutenção de maior número de colaboradores nos 12 primeiros meses de implementação da Proposta Definitiva e posterior redução a partir do segundo ano de vigência do Termo Aditivo.
A proposta final da CAMF estabeleceu número de colaboradores para as três ATIs referenciando os últimos meses de 2024, restando estabelecido em número e percentual de redução: 93 para a Guaicuy (redução 2,11%); 135 para a Aedas (redução de 23,29% em setembro de 2024 e 1,45% a partir de janeiro de 2025); e 85 para a Nacab (aumento de 7,59%).
Para o juiz, a CAMF não apresenta justificativa robusta para a escolha do mês de referência do Plano de Trabalho 06 das ATIs para estabelecer o parâmetro do corte de Recursos Humanos (RH). Segundo o juiz, “a definição do mês de referência no PTr06 como base de avaliação para apresentação da proposta de readequação do RH pela CAMF é de extrema relevância e causa significativo impacto no resultado e valores disponibilizados para cada ATI”.
Deste modo, não havendo razões específicas e dados concretos para utilização de meses de referência distintos para a proposta de readequação de RH, Dr. Murilo entende que para regularizar a situação deve haver uma simetria nos meses de referência utilizados nas propostas de ajuste de RH apresentadas pela CAMF para cada ATI. Isto, tendo em vista que para a Guaicuy foi prevista a manutenção da estrutura próxima ao estabelecido no plano de trabalho atual, para o Nacab não houve alteração, enquanto para a Aedas houve a redução de 54 postos de trabalho. Ou seja, não se justifica para a Aedas uma redução percentual discrepante quando comparada com as demais ATIs.
Segundo o juiz, o critério adotado pela CAMF de justificar a redução com base na desmobilização prevista não faz sentido, tampouco há detalhamento que indique alguma especificidade da ATI ou da região em que atua que oriente a distinção de parâmetros.
Percentual de redução de colaboradores para o 2º ano de atividades
Sob o segundo ponto de discussão, o juiz afirma que a CAMF aplicou percentuais distintos de redução de colaboradores para o 2º ano de atividades das ATIs. Isto porque o estudo da CAMF previu a manutenção de um maior número de colaboradores nos 12 primeiros meses de implementação da Proposta Definitiva do Anexo I.1 e posterior redução no 2º ano de vigência do Termo Aditivo, estabelecendo os seguintes percentuais de redução: 37% para a Guaicuy; 43% para Aedas; e 37% para Nacab.
Segundo o juiz, esse diferencial “resulta em uma maior diminuição no número de colaboradores para realizar as atividades de monitoramento da participação informada dos atingidos das Regiões 1 e 2 e de controle das ações já implementadas no âmbito da execução da Proposta Definitiva do Anexo I.1”.
Orçamento complementar requerido
A decisão traz uma comparação entre as propostas da CAMF, comparadas com as enviadas pelas ATIs em dezembro de 2024, na seguinte tabela:

O juiz destaca que a CAMF reduziu o orçamento de RH requerido pelas ATIs em 33,42% para a Guaicuy, 35,93% para a Aedas. Em situação totalmente oposta, a CAMF promoveu um aumento de 11,33% para o Nacab, sendo este valor superior ao requerido por esta ATI.
Em consonância com os argumentos anteriores, Dr. Murilo afirma que, devido à ausência de critérios objetivos e específicos para estabelecer os recursos previstos nos Termos Aditivos, não é possível homologar seu conteúdo.
Nas palavras do juiz, “a CAMF utilizou critérios distintos sem apresentar justificativa adequada para a diferença de tratamento dispensado a cada uma das ATIs”. Adiante, o juiz afirma que não pode corroborar com a divisão de recursos proposta pela CAMF, pois importaria em tratamento desigual entre os atingidos, ferindo o princípio da isonomia.
O juiz entende que diante da situação, o cenário ideal ensejaria novo estudo pela CAMF. Porém, este novo estudo atrasaria execução da Proposta Definitiva do Anexo I.1, razão pela qual, o próprio juízo se dispõe a fazer.
Como as ATIs Guaicuy e Nacab assinaram o Termo Aditivo, entende-se manifesta a capacidade de executar as atividades relativas ao Anexo I.1 de acordo com o limite orçamentário previsto pela CAMF. Por essa razão, mantém os valores estabelecidos para essas duas ATIs.
Em relação à Aedas, o juiz afirma haver incongruências na proposta de RH apresentada pela CAMF, sendo elas: percentual de redução no número de colaboradores; ausência de justificativa para redução significativa de colaboradores da Aedas, mesmo cumprida a desmobilização à época do estudo; percentual de redução dos colaboradores no 2º ano de execução da Proposta Definitiva superior às demais ATIs.
Segundo o juiz, homologar o Termo Aditivo significa “disponibilizar orçamento máximo insuficiente para que os atingidos das Regiões 1 e 2 tenham uma assessoria técnica independente de qualidade durante a execução do Anexo I.1”, motivo pelo qual entende ser necessário fixar parâmetros para estabelecer o valor máximo para o assessoramento técnico independente nas Regiões 1 e 2 do território atingido.
Os parâmetros apresentados pelo juízo são os seguintes:
- Mantida a distribuição feita ao Guaicuy e ao NACAB, deverá ser aplicada a média do percentual de redução/aumento do número de colaboradores em relação ao PTr06 de dezembro de 2024: aumento de 2,75%;
- Assim como feito com o Guaicuy e com o NACAB, deverá ser aplicado o percentual 37% de redução das atividades no segundo ano de execução da “Proposta Definitiva”;
- Deve ser adotado o índice de inflação geral de 5% para a correção do custo do RH das ATIs, conforme periodicidade das Convenções Coletivas de Trabalho (CCT) aplicáveis;
- Deve ser aplicado o percentual de desmobilização (redução) com base na proposta do Guaicuy de 64,13% do Custo de RH (referência nov/2026), nos últimos três meses da projeção (dez/2026, jan/2027 e fev/2027);
- Deve ser considerada a estimativa de saldo orçamentário disponível em 01/04/2025 da AEDAS, constante da Tabela 08 do “Ofício CAMF nº 08/2025”.
A alteração de critérios para fixar custo de RH estimado para as Regiões 1 e 2 resultará na modificação do valor máximo de R$ 62.526.696,28, implicando na não homologação dos Termos Aditivos.
Dr. Murilo afirma que a revisão dos critérios para definição de orçamento para as ATIs tem “o objetivo de garantir a observância do princípio da isonomia e evitar prejuízo à qualidade do assessoramento técnico dispensado aos atingidos de todo o território afetado pelo rompimento das barragens do Córrego do Feijão”.
Dessa forma, o juiz também pontuou a necessidade de oportunizar à Aedas que manifeste interesse em se manter como Assessoria Técnica Independente nas Regiões 1 e 2 nos moldes apresentados acima.
Por fim, o juiz decidiu:
- Negar o pedido de homologação dos Termos Aditivos;
- Determinar o limite orçamentário paras as regiões 3, 4 e 05, conforme valores já assinados pelo Guaicuy e Nacab, que deverão ser atualizados pelo índice IPCA desde 01/04/2025;
- Intimar as IJs, no prazo de 02 dias, para informar o andamento dos Planos de Trabalho das regiões 3, 4 e 5, bem como sobre eventual requerimento de liberação do valor inicial correspondente a 06 meses de trabalho das respectivas ATIs;
- Oficiar a CAMF para que apresente, em 02 dias, a estimativa de complementação orçamentária para atuação da ATI nas Regiões 1 e 2 no âmbito da execução da Proposta Definitiva do Anexo I.1 do Acordo Judicial, de acordo com os critérios apresentados na decisão.
Estudos de Risco à Saúde Humana e Risco Ecológico (ERSHRE)
O juiz intimou o Grupo EPA para, no prazo de 05 dias:
- Depositar em custódia, para guarda em cofre as cópias do(s) HD(s) contendo as subpastas, dentro da FASE I, com atas e gravações de RP2 (Reunião Preparatória 2), RN1 (Reunião de Nível 1) e RN2 (Reunião de Nível 2), bem como o banco de dados utilizado para alimentar o Power BI, que contempla os dados levantados nas reuniões de nível 1, nível 2 e questionários, incluindo ainda a entrega dos dados brutos e banco de dados em via física, através da disponibilização de uma mídia como um HD ou Pen Drive;
- Efetuar a entrega integral das informações, procedimentos técnicos e banco de dados (planilhas de dados brutos, procedimentos de validação dos dados A/QC, dentre outros), lista de contatos das ATIs e lideranças comunitárias.
Observa-se que o material a ser disponibilizado deverá estar desbloqueado e em formato editável, quando aplicável.
Acesse a decisão na íntegra:
Vitória das pessoas atingidas das Regiões 1 e 2
Essa decisão é resultado da mobilização das pessoas atingidas, que se organizaram para reivindicar justiça e garantir a manutenção do direito à participação informada e Assessoria Técnica Independente nas Regiões 1 e 2.
No dia 24/07, lideranças das Regiões 1 e 2 protocolaram uma carta ao juiz, pedindo a revisão da proposta de complementação de recursos para assessoramento das atividades relacionadas ao Anexo I.1 e denunciando violações ao princípio da participação previsto no Acordo Judicial.
A luta coletiva e a organização das pessoas atingidas segue sendo fundamental para assegurar que todas as regiões atingidas tenham condições justas de acompanhamento técnico no processo de reparação.
Confira: Nota pública em defesa dos direitos da população atingida das Regiões 1 e 2 – Aedas.
Próximos passos
Após cumpridos os requerimentos judiciais pela CAMF e IJs, o juiz deverá decidir sobre os valores para ATI nas Regiões 1 e 2. Também foi determinado que a Aedas se manifeste sobre o interesse em continuar como Assessoria Técnica Independente nas referidas regiões.