Com risco de colapso no assessoramento técnico às comunidades atingidas das Regiões 1 e 2, Aedas interpõe recurso e defesa no Tribunal de Justiça de Minas Gerais diante da possibilidade de mais de 300 mil pessoas serem prejudicadas e ficar sem assessoramento

Atingidas e atingidos carregam cartazes pedindo a permanência da Aedas durante ato realizado no dia 5 de novembro de 2025, data que marca o desastre-crime em Mariana | Foto: Joyce Silva

A Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas), em 24 de outubro, ingressou no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) com agravo interno, instrumento processual que pede a revogação urgente da decisão que suspendeu o repasse de recursos destinados à continuidade do assessoramento técnico às comunidades atingidas nas Regiões 1 e 2 da bacia do Paraopeba, e apresentou contrarrazões ao recurso interposto pelas Instituições de Justiça. 

A Aedas, que é a Assessoria Técnica Independente (ATI) atuante nas regiões 01 e 02, escolhida democraticamente pelas pessoas atingidas, pediu a revogação de decisão que suspendeu recursos e provocou o início da desmobilização do projeto, colocando seu quadro profissional em Aviso Prévio. No agravo interno e nas contrarrazões apresentadas em processos que correm no Tribunal de Justiça, a Aedas demonstra que ações judiciais e recursos das Instituições de Justiça ameaçam a Reparação Integral e o direito das comunidades das Regiões 1 e 2 à Assessoria Técnica Independente.   

A medida foi necessária após decisão monocrática do desembargador Leite Praça, que atendeu o segundo pedido das Instituições de Justiça e suspendeu decisões anteriores do Dr. Murilo Silvio de Abreu. Essas decisões de 1ª instância garantiam tratamento isonômico entre as Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) que atuam no Acordo Judicial de Reparação Integral.  

Por outro lado, a decisão do Des. Leite Praça, proferida em 10 de outubro de 2025, atendeu aos pedidos elaborados pelas Instituições de Justiça (Ministério Público Federal, Ministério Público do Estado de Minas Gerais, Defensoria Pública de Minas Gerais), cujos efeitos implicaram no processo de demissão em massa de profissionais da ATI e a paralisação do assessoramento técnico independente das comunidades atingidas das regiões 01 e 02, que correspondem a 70% do total de pessoas atingidas.  

O corte de recursos é uma ameaça concreta à sobrevivência da estrutura de apoio técnico e social que garante a participação informada das famílias atingidas no processo de reparação.  

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Com o agravo interno interposto, a Aedas busca, em caráter de urgência, a revogação da decisão monocrática e a restauração das decisões de primeiro grau que asseguravam a continuidade do assessoramento técnico nas Regiões 1 e 2, com condições isonômicas. O recurso demonstra que a decisão do Tribunal se baseou em processo administrativo suspenso, utilizado indevidamente pelas Instituições de Justiça para justificar a interrupção do assessoramento e a retirada da Aedas.   

A entidade aguarda a apreciação do recurso pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, reafirmando seu compromisso com a defesa do direito das pessoas atingidas à reparação integral e ao assessoramento técnico independente, tendo em vista que o Desembargador Leite Praça, responsável pelo caso, está temporariamente ausente de suas funções, as quais estão sendo executadas pelo Des. Carlos Henrique Perpétuo Braga.  

O substituto Des. Carlos Perpétuo Braga, no dia 29 de outubro, recebeu o recurso apresentado pela Aedas, mas entendeu que as partes e as pessoas atingidas devem aguardar o retorno às funções do Des. Leite Praça, no dia 07 de novembro, por supostamente não haver perigo ou urgência na demora que ameace os direitos discutidos. Isso, sem levar em consideração o momento crítico da instituição Aedas e, mais que isso, o contexto de violação de direitos e atraso na reparação integral aos quais as pessoas atingidas padecem. 

Confira a decisão do Des. Carlos Henrique Perpétuo Braga: 

Pessoas atingidas ocupam a linha do trem em Mário Campos | Foto: Lucas Jerônimo

Enquanto aguarda o retorno de Leite Praça, em compromisso com o trabalho prestado e na busca pelo direito das pessoas atingidas, a Aedas tem garantido a participação informada das pessoas atingidas, defendido continuidade do trabalho de assessoria técnica e denunciado a tentativa das Instituições de Justiça de inviabilizar o direito dos atingidos. 

Nesse sentido, a Aedas apresentou contrarrazões ao Agravo de Instrumento, recurso interposto pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Ministério Público Federal (MPF) e Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG), coletivamente chamadas Instituições de Justiça (IJs), que tinha como objetivo suspender as decisões de primeira instância que garantiam a permanência da ATI e do direito das pessoas atingidas.

Embora não seja parte no processo que discute a homologação dos Termos Aditivos para as ATIs que atuam na Bacia do Paraopeba, a Aedas apresentou as razões de fato e de direito que fundamentam a necessidade de ser ouvida no processo judicial sobre isso. As contrarrazões é uma defesa legítima feita contra o recurso das Instituições de Justiça, que prejudicou tanto a Aedas, quanto o próprio direito à assessoria técnica das pessoas atingidas das Regiões 1 e 2. 

Isto, porque, o Des. Leite Praça atendeu ao pedido feito pelas Instituições de Justiça e suspendeu as decisões da 2ª Vara da Fazenda Pública Estadual que, dentre outras coisas, havia autorizado a liberação de 15% dos valores destinados às Assessorias Técnicas Independentes (ATIs), medida que garantiria a continuidade do trabalho da Aedas junto às comunidades das Regiões 1 e 2 da Bacia do Paraopeba, epicentro do rompimento da barragem do Córrego do Feijão, pertencente à Vale, em Brumadinho.   

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No documento, a Aedas demonstra aquilo que vem informando às comunidades atingidas em suas comunicações: que o agravo das IJs coloca em risco o direito das pessoas atingidas à Assessoria Técnica Independente, conquistado após anos de árdua luta e reconhecido judicialmente no Acordo Judicial de Reparação Integral (AJRI) assinado em 2021 e nas leis Estadual nº 23.795/2021 (Política Estadual dos Atingidos por Barragens – PEAB) e Federal nº 14.755/2023 (Política Nacional dos Atingidos por Barragens – PNAB).  

Nas contrarrazões, a Aedas exemplifica que as Instituições de Justiça vêm adotando condutas que atentam contra a entidade, extrapolando suas prerrogativas constitucionais, utilizando o processo judicial como instrumento de poder político-institucional, e não como meio legítimo de tutela. Ao agir dessa maneira, as IJs, que tem como dever principal a defesa dos direitos dos atingidos, da população vulnerabilizada pelo desastre-crime, transparece querer controlar os recursos da reparação para além dos limiares definidos pelo Acordo, buscando limitar a autonomia das assessorias técnicas.  

Para formular o agravo de instrumento, as IJs se basearam em estudos técnicos elaborados pela Coordenação de Acompanhamento Metodológico e Finalístico (CAMF), que reduziram injustificadamente os valores destinados à Aedas, mesmo as Regiões 1 e 2 concentrando mais de 70% das comunidades atingidas.  

Enquanto isso, áreas com menor número de atingidos receberam, proporcionalmente, até cinco vezes mais recursos. Isso quebra a proporcionalidade de repartição histórica dos recursos.  

Ao verificar essa a distorção dos estudos, o juízo de 1ª instância agiu com correção e equilíbrio, modificando os valores, mas tomando como critério os percentuais históricos repassados a cada uma das ATIs, apenas garantindo tratamento isonômico e autorizando a liberação de parte dos valores necessários para manter o trabalho técnico junto às comunidades.  

Dessa maneira, o juiz, Dr. Murilo, não criou nenhuma obrigação nova, mas apenas corrigiu uma distorção que prejudicava diretamente as Regiões 1 e 2, sem extrapolar suas competências. A atuação do juízo, aliás, foi essencial para preservar a efetividade da reparação e o direito fundamental das populações atingidas à participação informada.  

Nas argumentações utilizadas em seus documentos, as Instituições de Justiça induziram o Tribunal ao erro, que ocultaram informações relevantes, como a existência de decisão judicial anterior que já garantia a continuidade da atuação da Aedas e suspendia um processo administrativo aberto contra a ATI. Ao omitir essas informações vitais, as Instituições de Justiça violam os princípios da lealdade e da boa-fé processual, caracterizando litigância de má-fé.  

Além disso, as IJs não apresentaram documentos e dados exigidos pelo juízo de 1ª instância e tentaram introduzir provas novas apenas na fase recursal, o que é juridicamente proibido.  

Equipe técnica da Aedas em Campo | Foto: Acervo Aedas

A Aedas, no entanto, junto às suas contrarrazões, elaborou uma Nota Técnica que analisa criticamente as informações equivocadas disponibilizadas pela CAMF para as IJs. Esse documento indica que os recursos destinados às Regiões 1 e 2 foram reduzidos ao longo dos anos, mesmo essas regiões concentrando a maioria da população atingida. Enquanto as Regiões 1 e 2 somam cerca de 70% dos atingidos, receberam apenas 41% dos recursos totais das ATIs. Já as regiões 3, 4 e 5, com cerca de 30% da população, ficaram com quase 60% dos valores.  

A análise técnica aponta que o estudo da CAMF não apresentou critérios objetivos, nem transparência nos cálculos, adotando metodologias casuísticas que beneficiaram determinadas regiões em detrimento das demais. Segundo a entidade, a CAMF reconheceu publicamente que não aplicou parâmetros padronizados entre as regiões e que seus cálculos poderiam ser “aprimorados” caso considerassem dados posteriores à sua elaboração — o que reforça a falta de consistência do estudo utilizado pelas Instituições de Justiça.  

A Aedas também demonstra que as decisões das IJs resultaram em prejuízo cumulativo às Regiões 1 e 2, impondo reduções sucessivas nos repasses, o que acabou criando um quadro que ameaça a continuidade do assessoramento técnico.  

Confira Agravo Interno 

Confira as Contrarrazões 

Confira a Nota Técnica  

Próximos passos  

O recurso Agravo Interno apresentado pela Aedas deve aguardar o retorno do Des. Leite Praça, que acontecerá no dia 07 de novembro. A partir desta data é que o recurso será apreciado, sem data para julgamento.  

No tocante à defesa apresentada contra o Agravo de Instrumento das Instituições de Justiça que suspendeu as decisões de primeira instância, a Aedas precisa ter, primeiramente, suas contrarrazões aceitas pelo relator do recurso, o Des. Leite Praça.  

Caso isso aconteça e o documento seja analisado, uma decisão relativa à apreciação das contrarrazões da Aedas poderá definir o futuro da Assessoria Técnica Independente nas Regiões 1 e 2, que reúne mais de 200 (duzentas) comunidades atingidas pelo rompimento da barragem do Córrego do Feijão, pertencente à Vale.  

Como os recursos financeiros destinados às ATIs na decisão do Dr. Murilo tiveram que ser devolvidos, em razão do aceite do segundo pedido de tutela antecipada pelas IJs, as equipes técnicas da Aedas já estão em aviso prévio e as atividades de assessoramento e participação informada serão interrompidas em breve, o que invariavelmente irá comprometer a execução de projetos de reparação coletiva em toda a Bacia do Paraopeba.  

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