Juiz determina a suspensão das ações que pedem indenização individual contra a Vale
A determinação garante celeridade da justiça na defesa das pessoas atingidas pelo desastre crime de 2019

Manifestação em Belo Horizonte . Foto: Aedas
Foram suspensas todas as ações individuais em andamento na justiça, motivadas pelo rompimento da Barragem da Vale em Brumadinho. A suspensão foi determinada no dia 1º de março pelo juiz Murilo Silvio de Abreu, responsável pelos processos de reparação dos danos decorrentes do rompimento.
Em defesa da suspensão dos processos individuais, o juiz afirma que há diversas vantagens para a suspensão das ações indenizatórias, dentre elas:
– Evita o ajuizamento de milhares de ações individuais,
– Reduz atos processuais, valorizando princípios da celeridade e economia processual.
– Na ação coletiva, a prova sobre os danos será produzida de forma mais robusta.
O juiz entende que a facilitação da defesa dos atingidos é um dos principais objetivos da liquidação coletiva. Isto, porque, nas palavras do juiz, “individualmente a força probatória dos atingidos face à Vale S/A é mínima ou mesmo inexistente”. A dificuldade de comprovar de modo individual os danos sofridos resulta na improcedência da maior parte de suas ações.
O juiz afirma que o atingido “poderá livremente optar por continuar na ação individual que ajuizou ou aguardar o resultado desta ação coletiva, onde a prova sobre os danos que sofreu será produzida de forma muito mais robusta”.
Próximos passos
O atingido que tenha ingressado com ação individual contra a Vale e que queira manter o andamento da sua ação individual (ou seja, não quer que a sua ação seja suspensa) deve formular pedido no processo em 30 dias. O prazo começa a contar da intimação da decisão de Dr. Murilo, que suspende as ações individuais, e o requerimento deve ser feito nos próprios autos da ação individual.
Desta decisão ainda cabe recurso pela Vale.
Construção de uma matriz de Danos
O Dr. Murilo afirma que a metodologia para a liquidação coletiva irá garantir que as especificidades de cada atingido sejam observadas na fase de liquidação de modo que o estabelecimento de categorias especificas e faixas/níveis do dano suportado por cada atingido cumpre com a necessidade de particularizar cada resposta judicial a cada caso concreto.
O juiz defende a construção transparente, conjunta e colaborativa da Matriz de Danos e de Reconhecimento por entender que é um instrumento que viabilizará a célere e integral reparação dos danos causados pela tragédia ambiental.
Para a construção da Matriz de Danos e de Reconhecimento, o juízo contará com o auxílio da perita CTC-UFMG na fase de liquidação, que irá construir um sistema que contenha todos os parâmetros para a indenização fundados em elementos objetivos e técnicos.
Abaixo, confira a decisão e mais informações em texto elaborado pela equipe de Estratégias Jurídicas da Reparação:
Confira a decisão na íntegra:
Necessidade da Liquidação Coletiva
A decisão do Juiz Murilo é imperiosa em retomar pontos centrais para a discussão dos direitos das pessoas atingidas, especialmente sobre os direitos à indenização pelos danos sofridos pelo rompimento da barragem da Vale S.A. em Brumadinho em 2019.
O magistrado reforçou a necessidade da liquidação coletiva da sentença, que condenou da Vale a reparar todos os danos decorrentes do desastre crime, incluindo os direitos individuais à reparação pelos danos patrimoniais e extrapatrimoniais sofridos em razão do rompimento de todas as pessoas atingidas individualmente consideradas.
Dr. Murilo reconhece que cada pessoa atingida tem direito subjetivo à indenização por causa da origem comum dos danos, que foi o rompimento da barragem. Para o juiz, este fato é suficiente para determinar que a liquidação coletiva busca reparar um direito individual homogêneo. A extensão e complexidade dos danos justifica o tratamento coletivo dos direitos individuais homogêneos.
A liquidação coletiva tem como objetivo definir quem são os titulares do direito subjetivo à indenização; quais os danos indenizáveis; quais os critérios de comprovação dos danos e da condição de credor da indenização; e qual o valor da indenização devida a cada titular.
A Matriz de Danos e Reconhecimento irá reconhecer, com base em parâmetros objetivos, quem são as pessoas atingidas e titulares de direitos, os danos e seus respectivos valores.
Suspensão dos processos individuais
O Juiz se ampara em decisões do Superior Tribunal de Justiça para determinar a suspensão das ações individuais propostas pelos atingidos contra a Vale até o julgamento definitivo da ação coletiva que tutela os direitos individuais homogêneos, decorrentes do rompimento da barragem de Brumadinho.
O magistrado ainda destacou que a tragédia ambiental em questão é a maior já registrada no Brasil, e a apuração dos danos decorrentes — ambientais, socioeconômicos e individuais — continua exigindo soluções inovadoras por parte do Judiciário. Diante da complexidade das demandas coletivas relacionadas à reparação civil, foi reconhecida a possibilidade de liquidação coletiva, assim como a classificação dos direitos dos atingidos à reparação dos danos patrimoniais e extrapatrimoniais como direitos individuais homogêneos.
O Coordenador da equipe Estratégias Jurídicas da Reparação André Cavalcante concorda com o posicionamento do magistrado por considerar que “o rompimento da barragem em 2019 é o evento gerador comum do qual decorrem inúmeras pretensões indenizatórias, razão pela qual a Ação Civil Pública cumpre o papel de facilitar a defesa das pessoas atingidas, que terão seus direitos apreciados de forma diferenciada e individualizada, através de critérios objetivos estabelecidos pela Matriz de Danos e de Reconhecimento”.
Dr. Murilo afirma que a metodologia para a liquidação coletiva irá garantir que as especificidades de cada atingido sejam observadas na fase de liquidação de modo que o estabelecimento de categorias especificas e faixas/níveis do dano vivenciados por cada atingido cumpre com a necessidade de particularizar cada resposta judicial a cada caso concreto.
Em defesa da suspensão dos processos individuais, o magistrado afirma que há diversas vantagens para a suspensão das ações indenizatórias, incluindo a redução de atos processuais, valorizando princípios da celeridade e economia processual. Afirma que a suspensão busca alcançar máximos resultados, com o mínimo de esforço, desobstruindo as vias judiciais, tendo em vista que evita o ajuizamento de milhares de ações individuais. Diz ainda que estas vantagens implicam na otimização da prestação do papel do judiciário, por reparar e prevenir danos.
O juiz defende a construção transparente, conjunta e colaborativa da Matriz de Danos e de Reconhecimento por entender que é um instrumento que viabilizará a célere e integral reparação dos danos causados pela tragédia ambiental. Segundo o magistrado, a Matriz impedirá a obstrução das vias judiciais com o ajuizamento de diversas demandas e otimizará a prestação jurisdicional, proporcionando tutela jurisdicional mais qualificada em razão dos elementos de prova apurados na ação coletiva.
Para a construção da Matriz de Danos e de Reconhecimento, o juízo contará com o auxílio da perita CTC-UFMG na fase de liquidação, que irá construir um sistema que contenha todos as orientações para a indenização com base em elementos objetivos e técnicos.
O juiz entende que a facilitação da defesa dos atingidos é um dos principais objetivos da liquidação coletiva. Isto, porque, nas palavras do juiz, “individualmente a força probatória dos atingidos face à Vale S/A é mínima ou mesmo inexistente”. A dificuldade de comprovar de modo individual os danos sofridos resulta na improcedência da maior parte de suas ações.
Este fato é suficiente para que o juiz entenda que “a suspensão das demandas individuais em razão do processamento da presente liquidação coletiva mostra-se como solução necessária para garantir a efetividade da decisão parcial de mérito condenatória quanto aos direitos individuais homogêneos”.
Quanto às alegações da ré de que a suspensão das ações individuais contraria o Termo de Compromisso firmado pela Vale e pela Defensoria Pública de Minas Gerais, o juiz entende que o TC não contempla todo os danos, sobretudo os supervenientes – aqueles que aconteceram após o rompimento, mas que decorrem com desastre crime. Também entende que os atingidos não são obrigados a realizar acordos extrajudiciais com a empresa, sobretudo pelo fato de a própria poluidora não aceitar mais cadastros para os atingidos pleitearem indenização individual ou por grupo familiar extrajudicialmente.
O juiz afirma que a suspensão das ações individuais não gera prejuízo para a Vale, posto que havendo a possibilidade de complementação de valor para algum atingido, o valor já indenizado será considerado no montante final.
O juiz afirma que o atingido “poderá livremente optar por continuar na ação individual que ajuizou ou aguardar o resultado desta ação coletiva, onde a prova sobre os danos que sofreu será produzida de forma muito mais robusta”.
Por fim, o juiz determina a suspensão processual das ações individuais de reparação dos danos patrimoniais e extrapatrimoniais que têm como causa de pedir o rompimento das Barragens B-I, B-IV e B-IVA, da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho em 2019, até haja decisão definitiva na ação da liquidação coletiva, que trata dos direitos individuais homogêneos decorrentes do rompimento.
Ressalta-se que a ordem de suspensão não se aplica aos casos e ações em fase de cumprimento de sentença. E é garantido ao atingido o direito de prosseguir com a sua ação individual, conforme requerimento a ser realizado em 30 dias após a intimação no processo individual.
Relembre
Em dezembro de 2024, o Ministério Público Federal pediu a suspensão de todos os processos individuais que pedem indenização pelos danos decorrentes do rompimento da barragem de Brumadinho, em 2019, até decisão definitiva da liquidação coletiva, como medida para garantir a efetividade do sistema judicial.
A Defensoria Pública de Minas Gerais aderiu ao pedido feito pelo Ministério Público Federal, e o Ministério Público de Minas Gerais requereu prazo para que as partes se manifestem em sentido contrário, considerando a possiblidade de já haver ações com chances de êxito.
A Vale S.A se manifestou de forma contrária à suspensão das ações individuais. Argumentou que a suspensão dos processos por causa de ação coletiva deve ser uma exceção e que as hipóteses presentes no Código de Defesa do Consumidor devem ser respeitadas. Alega que as ações individuais têm fundamentos distintos na busca pela proteção dos direitos individuais personalíssimos, quer dizer, direitos acobertados pela Ação Civil Pública que visa proteger direitos individuais homogêneos difusos e coletivos. Por fim, diz que o pedido do Ministério Público Federal contraria o que foi celebrado no Acordo Judicial de 2021.