Seminários Temáticos marcam novo momento de participação popular na construção de pautas do Médio Rio Doce
Aedas promove, neste sábado (12), seminários temáticos “Do rio ao mar: justiça é construção popular!”: Diálogos entre Raça, Gênero e Povos Tradicionais no Médio Rio Doce

O primeiro ciclo dos Seminários Temáticos da Aedas (Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social) acontecerá neste sábado, 12 de agosto, com objetivo de estabelecer mais um espaço de diálogo, compreensão e ação conjunta com as pessoas atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão (Samarco, Vale e BHP Billiton) no Médio Rio Doce. Os seminários levam como tema “Do rio ao mar: justiça é construção popular!”: Diálogos entre Raça, Gênero e Povos Tradicionais no Médio Rio Doce e acontecerão nas regiões do Vale do Aço e Leste de Minas, nos municípios de Ipatinga e Conselheiro Pena.
Neste momento, os seminários são voltados às Mulheres, Pessoas Negras, Indígenas, Quilombolas e Povos e Comunidades Tradicionais. No contexto pós-rompimento da barragem, é fundamental abordar as dimensões de raça, gênero e tradicionalidade tão presentes nos territórios atingidos, mas, ao mesmo tempo, negligenciadas nos processos de reparação.
A realidade encontrada nos territórios demonstra, por exemplo, que as mulheres chefes de família não tiveram seus direitos reconhecidos e seus danos reparados. Após quase 8 anos de rompimento, ainda sofrem com a perda de renda, com a falta de acesso ao trabalho formal e ao AFE (auxílio financeiro emergencial), com o dano à água, à saúde, ao meio ambiente e muitas vezes são responsabilizadas pelos cuidados com as crianças, idosos e pessoas adoecidas em um território violado e injustiçado.

E é por isso que os Seminários Temáticos têm o propósito de criar ambientes de discussão focados em temas que existem como interesses compartilhados. O objetivo é garantir que todos tenham a oportunidade de participar ativamente do processo de reparação e obtenham informações sobre o que a assessoria tem levantado dos temas/assuntos para a comunidade.
Mayara Costa, advogada e coordenadora da equipe de Raça e Gênero da Aedas, explica que tanto no Vale do Aço quanto no Leste de Minas, o momento contará com a presença de lideranças que acumulam anos de luta na busca por justiça e reparação.
“É essa voz, principalmente quando você fala de povos tradicionais, essa voz respeitada dentro da comunidade. São mulheres, em sua maioria, que tiveram, em muitos casos, a negativa de acesso ao auxílio financeiro emergencial ou até mesmo ao Novel”, destaca acrescentando que a estratégia adotada durante o cadastramento das famílias, após o rompimento, pela Fundação Renova, impediu a validação de muitos modos de vida.
“No momento do cadastro, quando as mulheres diziam que estavam junto a seus companheiros em práticas de trabalho que dependiam do Rio Doce, elas não eram identificadas como pescadoras. Eram tidas como pessoas que prestavam “auxílio na prática do homem”. Esse critério não é de acesso, pois é colocado como um auxílio à prática do homem do núcleo familiar cadastrado. Então, por exemplo, as pescadoras que registram a atividade da pesca como ofício, elas não são cadastradas como pescadora, elas são cadastradas como auxiliar de pesca e auxiliar de pesca não é elegível para recebimento da indenização”, exemplifica.
Dados de resistência
A presença de quilombolas e de povos e comunidades tradicionais faz parte da essência do Brasil. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE) foram identificados 494 Territórios Quilombolas oficialmente delimitados no país, que abrigavam 167.202 quilombolas. Assim, apenas 12,6% da população quilombola residia em territórios oficialmente reconhecidos. Os dados são do Censo 2022, que investigou pela primeira vez esse grupo, integrante dos povos e comunidades tradicionais reconhecidos pela Constituição de 1988.


O Estado de Minas Gerais é o terceiro com o maior número de pessoas quilombolas, segundo as Unidades da Federação. Nos municípios em que a Aedas atua como Assessoria Técnica Independente constam, por exemplo, 20 domicílios de presença quilombola em Ipatinga, 13 domicílios em Santana do Paraíso, quase 1000 pessoas identificadas como quilombola em Belo Oriente.
Dados que reforçam que os povos negros presentes no território mineiro e fixados a partir de processos históricos, também se organizam a partir de tradicionalidades e modos de vida diversos que foram, de forma continuada, impactados desde o rompimento da barragem de rejeitos de Fundão.
Indígenas na luta por reparação
O Seminário também destaca a participação de outro grupo que historicamente tem sido invisibilizado no processo de reparação: os indígenas. De acordo com os dados mais recentes do IBGE, os indígenas no Brasil são hoje mais de 1,69 milhão de pessoas. Esse número representa 0,83% do total da população brasileira.

Os números mostram um grande aumento em relação aos dados do último Censo, em 2010, quando a população indígena era de 896,9 mil e representava 0,47% do total da população. Nos 15 municípios em que a Aedas atua enquanto Assessoria Técnica Independente (do Vale do Aço ao Leste de Minas) foram registradas presença indígenas, com total de 1.045 pessoas identificadas.
Somente no Leste de Minas, nos municípios atendidos pela Aedas como Aimorés, Resplendor, Conselheiro Pena e Itueta, são mais de 700 pessoas identificadas como indígenas. Em todo o Estado de Minas Gerais, mais de 36 mil.
Francisco Phelipe, historiador e coordenador da equipe de Povos e Comunidades Tradicionais, explica a necessidade de um seminário que aborde essas marcas de territorialidade. “Pelo Censo do IBGE, vemos que o Vale do Aço é marcadamente um território de presença quilombola, enquanto no Leste de Minas esse registro é de povos indígenas. Temos os Puris, no município de Aimorés; os Maxakali em Conselheiro Pena; em Resplendor o povo Krenak e Puri. Isso nos mostra a necessidade de um seminário próprio falando de um território com essas marcas”, explica.
Francisco ainda reforça a importância do espaço de participação. “É nesse espaço de acolhida que as pessoas atingidas poderão dialogar sobre os danos sofridos pelo rompimento e como eles impactam de forma específica a vida de cada pessoa atingida enquanto sujeito e enquanto coletivo, e apontar caminhos para uma reparação justa, participativa e integral.”, explica.
Ao longo dos meses, os próximos espaços também abordarão novos temas indicados pelas pessoas atingidas diante de suas realidades.
A garantia de espaços participativos são um compromisso da Aedas em debater conjuntamente com a população atingida todo o impacto do rompimento da barragem em suas vidas, construir os debates dos danos, no entendimento que reparação só acontece com participação popular.
PROGRAMAÇÃO
14h – Início do Seminário Temático
– Acolhida
– Apresentação da Aedas + Diálogos sobre Processo de Reparação
– Trabalho em grupo – Tema: Insegurança Alimentar
Intervalo (30minutos)
-Apresentação Grande Roda
17h – Fim o Seminário Temático
Texto: Glenda Uchôa – Equipe de Comunicação da Aedas do Programa Médio Rio Doce