Demora da análise dos cadastros, poligonais e falta de transparência estão entre as reclamações das pessoas atingidas
Reunião ocorreu no MPMG e contou com a participação de representantes das Instituições de Justiça e FGV. Fotos: Diego Cota/Aedas

Em um dia marcado pela luta das pessoas atingidas por barragens, com um grande ato realizado em Belo Horizonte, atingidas e atingidos das cinco regiões da Bacia do Rio Paraopeba e Represa de Três Marias se reuniram com as Instituições de Justiça (IJs) e a Fundação Getúlio Vargas (FGV) para discutir questões referentes à execução do Programa de Transferência de Renda (PTR). O encontro foi realizado na terça-feira (26/09), na sede do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), região Centro-Sul da capital.

Os principais assuntos levantados pelas pessoas atingidas foram: a demora da análise dos cadastros, a falta de transparência e diálogo da FGV, os estudos e aprovações das Poligonais, além da divisão dos territórios atingidos por meio da definição dessas poligonais, e a dificuldade de comprovação de residência em municípios sem regulação fundiária.

As representantes das comissões Maria Santana Alves, de São Joaquim de Bicas, e Michelle Rocha, de Betim, representaram as atingidas da Região 2, enquanto Lilian Silva representou as atingidas de Brumadinho (Região 1). As Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) deram suporte às falas das atingidas e encaminharam documentações às IJs.

No primeiro momento foi feita a escuta das pessoas atingidas das cinco regiões, que tiveram dez minutos para manifestarem suas reclamações e sugestões.

A atingida Michelle, da comunidade Monte Calvário (Betim), destacou a falta de diálogo da FGV com a população, que tem sobrecarregado as comissões comunitárias e as ATIs, e sugeriu que sejam realizadas reuniões com as lideranças de cada região para que possam ser abordadas as questões específicas dos territórios. Ela lembrou, ainda, que a presença da FGV na gestão do PTR ocorreu através da luta do povo atingido. Por isso, cobrou maior atenção às demandas das comunidades.

Maria Santana Alves, atingida da comunidade Vale do Sol (São Joaquim de Bicas), denunciou a ausência de pontos volantes da FGV na Região 2 e afirmou que esse é mais um problema enfrentado pelas pessoas atingidas. A liderança disse, ainda, que, em função da ausência dos pontos volantes, tem surgido comércios paralelos que cobram das pessoas atingidas para realização do cadastro. Ela sugeriu que a FGV proporcione atendimento acessível para as pessoas atingidas que não têm condições de realizar os procedimentos via internet ou por ligação telefônica. Santana destacou que em diversas ocasiões ela é acionada pela comunidade para prestar algum suporte, que deveria ser dado pela gestora do PTR.

As atingidas associaram a diminuição de pontos volantes da FGV na Região 2 com a definição de um posto de atendimento fixo, localizado na região de Citrolândia, em Betim. Michelle destacou que a localidade não é acessível para atingidos dos outros municípios da região (Mário Campos, São Joaquim de Bicas, Juatuba e Igarapé). Segundo ela, essa foi uma questão levada para a FGV, mas que não foi atendida. O coordenador do PTR pela FGV, Rodrigo Santos, informou que a escolha da localidade foi referente ao maior contingente de pessoas atingidas na Região 2.

A atingida Lilian Silva, da comunidade Aurora, de Brumadinho, cobrou celeridade das IJs e da FGV para a resolução das demandas levadas pelas pessoas atingidas, visando a garantia do direito de recebimento do PTR. Ela cobrou um melhor atendimento da FGV aos núcleos familiares com necessidades específicas para que todos de uma mesma residência possam ter acesso ao programa.

Entre a série de sugestões e questionamentos elaborados pelas comissões de Brumadinho estão a necessidade de veiculação de informações que sejam acessíveis para o entendimento da população, a garantia de interlocução da FGV com os atingidos e a responsabilidade dos Compromitentes em relação à gestão do PTR, pois são quem fornecem as informações técnicas para a FGV.

Aedas solicitou respostas para demandas individuais e pleitos coletivos

A coordenadora do grupo de trabalho do PTR (GT PTR) na Aedas, Ranúzia Moreira, acompanhou a entrega para as IJs de um documento estruturado a partir de demandas individuais e demandas coletivas das pessoas atingidas das duas regiões assessoradas referente a 2023. As questões individuais são principalmente relacionadas aos bloqueios, definições das poligonais e problemas com o comprovante de residência.

Em Brumadinho (Região 1), a principal demanda é a falha no reconhecimento de atingidos residentes na Zona Quente. Nas comunidades de Córrego Fundo e Monte Cristo, algumas pessoas recebem 50% do PTR, sendo que têm o direito de receber o valor integral, que equivale a um salário-mínimo. Ranúzia destacou que resolução tem sido solicitada pela ATI e pelas comunidades por meio de ofícios, pleitos coletivos e abaixo-assinado. Frisou que recentemente alguns casos foram resolvidos, mas que muitas pessoas atingidas ainda aguardam a resolução.

Quanto a Região 2, foi solicitada a resposta para os pleitos coletivos enviados para a FGV e Instituições de Justiça. Um deles é dos Povos e Comunidades Tradicionais de Religião Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA), que reflete sobre os territórios descontínuos, a partir da inviabilização da relação tradicional com o Rio Paraopeba.

Outro pleito que aguarda resposta e que envolve toda a Bacia é o referente ao direito das crianças nascituras na data do rompimento, que tiveram o indeferimento no recebimento do PTR. Ranúzia relembrou que, na época no Auxílio Emergencial, anterior ao PTR, havia sido apontado pela Vale que essas crianças estariam dentro do critério, questão ainda não contemplada.

Representantes das IJs e da Fundação Getúlio Vargas. Foto: Diego Cota/Aedas

A promotora do MPMG, Shirley Machado, afirmou que a inclusão de novas comunidades atingidas no PTR é uma atribuição das IJs, não cabendo essa definição à FGV. Destacou o importante papel das ATIs no desenvolvimento de estudos que caracterizam as comunidades. Lembrou da necessidade de ter critérios estabelecidos, mas que esteja aberto para um olhar diferenciado para a diversidade das realidades atingidas.

A promotora explicou que os próximos passos devem responder às questões apresentadas pelos atingidos e suas assessorias técnicas. Tanto a FGV quanto as Instituições de Justiça devem analisar as reclamações e pleitos dos territórios, para o que compete cada instituição.

Encaminhamentos da reunião

– Será feito um levantamento, a partir do diálogo entre IJs, FGV, ATIs e Comissões, sobre a melhor forma de divulgação de informações sobre cadastros aprovados e a aprovar nas regiões atingidas, visando melhor transparência do PTR;

– Quando as IJs estiverem em visita aos territórios atingidos para assuntos referentes ao PTR, a FGV será convocada para participar das reuniões;

– Vai ser convocada uma reunião com as equipes de comunicação da FGV e ATIs com representantes das pessoas atingidas para alinhar uma melhor forma de divulgação de informações para diálogo com os territórios atingidos;

– As IJs encaminharão as demandas coletivas enviadas pelas comunidades à FGV, que deverá fazer um documento em resposta aos pontos apresentados, destacando também as pendências que estão abertas nas IJs (prazo de 15 dias a contar a partir de 02/10);

– A FGV irá analisar internamente e se manifestará sobre a construção de uma metodologia de georreferenciamento por endereço em uma única visita e a utilização dos dados no cadastro de todas as pessoas atingidas que estiverem se inscrito com o referido endereço, por serem parte do mesmo núcleo familiar (prazo de 15 dias a contar a partir de 02/10).

Texto: Diego Cota

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