REMUNERAÇÃO NEGADA. Instituições de Justiça decidem contra a remuneração na governança popular do AI1 apesar dos apelos das lideranças atingidas 

Foto: Diego Cota/Aedas

A Entidade Gestora divulgou nesta terça-feira (21) comunicado informando que foi negado, pelas Instituições de Justiça, o pedido de direito à remuneração das pessoas atingidas que atuarem nos conselhos da governança popular do Anexo I.1. Denominado de Projetos de Demandas das Comunidades e Acesso a Crédito e Microcrédito, o Anexo I.1 prevê instâncias em que as pessoas atingidas participam do processo de escolha, acompanhamento e execução desses projetos, com o apoio da Entidade Gestora. 

A remuneração de conselheiras e conselheiros é uma pauta das lideranças atingidas, em ofícios construídos com o apoio da Aedas, um apelo que marcou as falas das representações das pessoas atingidas durante a solenidade realizada no dia 05 de junho, que marcou o início do Anexo I.1. Na ocasião, representantes de comissões das Regiões 1 e 2 questionaram se haveria remuneração das pessoas atingidas que vão atuar nos conselhos e quando as IJs responderiam sobre isso. As respostas das instituições, naquele momento, vieram no sentido de que esta seria uma decisão construída com os atingidos. 

Nesta matéria, trazemos um resgate histórico dessa cobrança, que envolveu envio de ofícios, reuniões com Entidade Gestora e pedidos junto às Instituições de Justiça. 

Luta por reconhecimento  

As pessoas atingidas das regiões 1 e 2 da Bacia do Paraopeba têm pautado como centralidade a garantia de remuneração para atuar nas instâncias de participação da governança popular na execução do Anexo I.1, pois assumem funções importantes nos Conselhos e Setores Locais, Regionais e Inter-regional da Governança Popular.  

Para tanto as conselheiras e conselheiros precisam dedicar tempo para participar dos espaços de tomada de decisão, como a construção das diretrizes para os projetos comunitários e as linhas de crédito e microcrédito, ou seja, dedicam tempo de suas vidas na luta por justiça, e reparação integral para todas as pessoas atingidas.  

João Índio, atingido da comunidade indígena Aranã, de Juatuba 

 “Seria importante uma remuneração aos conselheiros do Anexo I.1, porque muitos deixam seus lares e se deslocam para reuniões. Então, se perde um dia inteiro. Muitos têm que deixar o serviço e acaba não sendo remunerado naquele dia”. 

Silas Fialho, atingido da comunidade Parque da Cachoeira, de Brumadinho 

 “O atingido é o único ator e participante do processo que não é remunerado. Para o atingido, a dedicação ao Anexo I.1 vai demandar tempo das pessoas, uma vez que as conselheiras e conselheiros vão ter que “aprofundar nos projetos que visam beneficiar uma coletividade”. 

De quantas lutas se faz uma conquista? 

No dia 05/06/25 ocorreu a solenidade para inauguração do Anexo I.1 onde estava presente as Instituições de Justiças, Entidade Gestora, Assessorias Técnicas Independentes e pessoas atingidas das cinco regiões da Bacia do Paraopeba que,  a partir desse dia, reforçaram o pleito de  remuneração dos conselheiros e das conselheiras pelo trabalho que será necessário executar na Governança Popular do Anexo I.1, sobretudo, a partir da inauguração dos conselhos e setores locais e regionais, reforçando que essa remuneração é essencial para a execução das atividades relativas as tomadas decisão das pessoas atingidas nos Conselhos e Setores.  

Através da Assessoria Técnica Independente, direito das pessoas atingidas, foram encaminhados ofícios reiterando as reivindicações a respeito da remuneração e reafirmados nos espaços de formação da Entidade Gestora na Região 1 e 2, em manifestações e atos e reuniões com as Instituições de Justiça.  

No dia 06/06/25 a Aedas encaminhou o ofício – OF00086/R1R2 com reivindicações a respeito da remuneração das pessoas atingidas que serão conselheiras(os) e irão atuar nas instâncias da Governança Popular do Anexo I.1; 

Nos dias 24/07/25 e 07/08/25 ocorreu a Reunião da Entidade Gestora com os representantes dos Familiares de Vítimas Fatais – no espaço foi levantada a questão da remuneração dos conselheiros(a)s do Setor de Familiares de Vítimas Fatais. O representante da Entidade Gestora respondeu que apoia a demanda das pessoas atingidas por remuneração e oficiou as Instituições de Justiças, porém, ainda não havia decisão delas sobre o assunto; 

“É importante a remuneração das pessoas atingidas nesse processo, pois há 6 anos estão realizando um trabalho voluntário e desprendendo de muito tempo”. (Natália de Oliveira, Comunidade Jota. Reunião Entidade Gestora com representantes Familiares de Vítimas Fatais, 24/07/2025) 

No dia 14/08/25 a Aedas encaminhou o ofício – OF00130/R1/PCT com solicitação de reunião com o Dr. Murilo para dialogar sobre assuntos relacionados ao Anexo I.1, dentre eles o pleito da remuneração das pessoas atingidas que integrarão os Conselhos e Setores; 

No dia 16/08/25 ocorreu a Formação sobre Governança com os Conselheiros e Conselheiras da Região 1 com a Entidade Gestora – durante a formação as pessoas atingidas da Região 1 solicitaram à Entidade Gestora informações sobre a remuneração dos conselheiros e das conselheiras. Muitas das pessoas atingidas presentes na formação condicionaram a sua participação nos conselhos à remuneração; 

“[foi feito] um requerimento solicitando informações sobre a remuneração dos conselheiros, e muitas pessoas condicionaram a participação como conselheiros/as ao recebimento de remuneração. Mas até agora não tiveram respostas.” (Isadora, Comunidade COHAB, Formação sobre Governança com os Conselheiros e Conselheiras da Região 1 com a Entidade Gestora, 16/08/2025) 

“Precisamos de uma resposta, seja sim ou não. Havendo remuneração ótimo, não havendo, algumas pessoas tendem a se afastar.” (Ramon, Comunidade Ponte de Almorreimas. Formação sobre Governança com os Conselheiros e Conselheiras da Região 1 com a Entidade Gestora, 16/08/2025) 

No dia 24/08/25 ocorreu a Formação sobre Governança com os representantes do Setor de Povos e Comunidades Tradicionais da Região 1 com a Entidade Gestora – na formação as pessoas atingidas pontuaram que no dia 14 de agosto de 2025 foi enviado um ofício solicitando reunião com o Dr. Murilo para dialogar sobre assuntos relacionados ao Anexo I.1, dentre eles o pleito da remuneração. Muitas pessoas atingidas ressaltaram que é necessário a remuneração e que se não houver essa decisão, alguns(mas) conselheiros(as) não estarão em determinados espaços da Entidade Gestora; 

“as pessoas atingidas participam das reuniões, com mais de três horas de trabalho, pois largam tudo que tem que fazer (…), desde o ano de 2019 estão nessa luta.” (Evandro, Comunidade Quilombo Sanhudo. Formação sobre Governança com os representantes do Setor de Povos e Comunidades Tradicionais da Região 1 com a Entidade Gestora, 24/08/2025) 

No dia 30/08/25 ocorreu a Formação sobre Governança dos Conselheiros e Conselheiras da Região 2 com a Entidade Gestora – durante a formação com a Entidade Gestora as pessoas atingidas pontuaram a necessidade de saberem sobre a remuneração e que não concordam de iniciarem a participação nos conselhos sem saber se haverá remuneração ou não; 

“(…) é um absurdo começarmos isso sem saber como e quantos vamos ganhar e se vamos ganhar”. Não concordo com o começo do anexo I.1, com tantas pendências assim!” (Santana, Comunidade Vale do Sol II, Formação sobre Governança dos Conselheiros e Conselheiras da Região 2 com a Entidade Gestora) 

“(…) é necessário novos ofícios, audiências e manifestações incisivas sobre o que se quer [a garantia de remuneração para Conselhos e Setores].” (Amarildo, Comunidade Assentamento 2 de Julho, Formação sobre Governança dos Conselheiros e Conselheiras da Região 2 com a Entidade Gestora) 

No dia 06/09/25 ocorreu a Formação sobre Governança com os representantes do Setor de Povos e Comunidades Tradicionais da Região 2 com a Entidade Gestora – as pessoas atingidas presentes na formação pontuaram a importância de uma resposta das Instituições de Justiças sobre a remuneração dos conselheiros e das conselheiras e reforçaram a importância de todas e todos entenderem na integra os processos que estão sendo feitos na execução do Anexo I.1; 

No dia 12/09/25 a Aedas encaminhou o ofício – OF00135/R1 – considerações sobre remuneração para conselheiros(as) no Anexo I.1, com a devida atenção às categorias socialmente vulnerabilizadas; 

No dia 18/09 as Comissões de Atingidos e Atingidas da R2 encaminhou o ofício – OFÍCIO03/2025/R2 – solicitando resposta e orientação sobre remuneração para Conselheiros no Anexo I.1. 

Foto: João Paulo Dias / Aedas Paraopeba

A decisão pela não remuneração de conselheiros e conselheiras é mais uma derrota sentida pelas pessoas atingidas que dedicam seu tempo e vida na luta pela reparação. E mais, chega num contexto de encerramento do Programa de Transferência de Renda, instabilidade e incertezas para os atingidos das Regiões 1 e 2 e demonstra que, mais uma vez, que a centralidade das pessoas atingidas nas decisões não está sendo levada em consideração.