Atingidos e Atingidas da bacia do Rio Doce na sede do Ministério Público Federal Foto: Pedro Gonzaga

Em seminário organizado pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), ocorrido ao longo da última terça-feira (24), na sede do Ministério Público Federal, as pessoas atingidas pelo desastre-crime de Mariana debateram com as Instituições de Justiça sobre o processo de Repactuação do caso Rio Doce.  Na ocasião, os presentes reafirmaram pautas consideradas importantes na busca por reparação justa e integral. 

Intitulado “Encontro dos Atingidos e Atingidas com as Instituições de Justiça”, o evento reuniu dezena de atingidos e contou com a participação de representantes do Ministério Público Federal, Defensoria Pública do Estado de Minas Gerais e Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo. Diversas lideranças sociais também estiveram presentes. 

Para Thiago Alves, liderança nacional do MAB, o encontro representa ‘mais um passo’ no processo de reparação quando ‘garante e possibilita a participação do povo atingido’. “É importante que as Instituições de Justiça estejam cada vez mais próximas dos atingidos para que eles sejam ouvidos. Para que haja participação popular. É, também, um momento importante para reafirmarmos as pautas da bacia do Rio Doce – já amplamente apresentadas tanto para a Defensoria Pública quanto para o Ministério Público Federal”, pontua. 

O procurador da República e chefe da força tarefa do Rio Doce do MPF, Felipe Barros, afirmou não haver ‘a menor dúvida’ sobre a validade e aplicabilidade da Política Nacional de Atingidos por Barragem (PNAB) aos processos de reparação em curso. O procurador aproveitou o momento para falar sobre ‘celeridade dos processos’ e a importância da ‘centralidade dos atingidos nos diversos processos de reparação’.  

“A aplicabilidade da nova lei reforça a necessidade de participação dos atingidos e isso está presente, por exemplo, na estruturação dos Comitês. Nós [Instituições de Justiça] estamos nesse momento em várias frentes para dar celeridade aos processos. Estamos atuando nas contratações de experts, das ATIs, no orçamento dos atingidos, na consolidação das comissões, na reestruturação dos Auxílios Financeiros Emergenciais e na recolocação dos atingidos no centro da reparação. Estamos no momento de acelerar julgamentos e acelerar aquele processo que ficou muito tempo parado esperando um novo acordo”, afirmou Barros. 

Mobilização das pessoas atingidas em busca de garantia de direitos – Foto: Pedro Gonzaga

Giovana Nobre, coordenadora de Diretrizes de Reparação Integral do programa Médio Rio Doce da Aedas, avaliou o encontro entre os Atingidos e as Instituições de Justiça ‘como um importante momento de diálogo’. “Foi oportunizado tempo de fala para que atingidos e atingidas conseguissem expor todas as problemáticas enfrentadas em quase 9 anos de luta por uma reparação justa e integral”, explica. 

Na avaliação de Giovanna, as IJs responderam as dúvidas trazidas nas falas da população atingida e elucidaram sobre o atual momento do processo de reparação, trazendo atualizações importantes sobre demandas já encaminhadas e sinalizando um momento com grandes possibilidades de avanços e conquistas para as pessoas atingidas. “A participação da Aedas, nesses espaços de diálogo, é essencial para garantir um acompanhamento técnico qualificado para as pessoas atingidas”, concluiu a advogada. 

Em entrevista ao Inter TV 2ª edição, Joaquim Teixeira de Sousa, pescador profissional de Conselheiro Pena assessorado pela Assessoria Técnica Independente Aedas, desabafou sobre os danos que continua sofrendo mais de 8 anos após o rompimento da barragem de Fundão. “Não temos lazer, não temos como pescar. O Auxílio que a Vale paga para a gente é irrisório. Quando a gente pescava, o quilo do peixe era 10 reais. Hoje para você comprar um peixe de ‘poço’ [tanque], custa 25 reais. Então, o que é que você faz com um salário-mínimo e mais 20% de cesta básica?’, questiona. 

A liderança indígena da comunidade Uchô Betlharo Puri, em Aimorés, Deuáma Meire Purí, denunciou, em entrevista à Inter TV, o fim de práticas ancestrais incalculáveis. “Hoje a gente não pode mais praticar a nossa espiritualidade, os nossos batismos e a nossa ancestralidade. As empresas rés (Vale, Samarco e BHP) e a contratada – que é a fundação renova – mataram tudo que nós temos direito, né? Principalmente os nossos direitos à pesca e à vida. E elas [empresas] não querem reconhecer os povos indígenas”, afirma Meire. 

Litoral norte do Espírito Santo é reconhecido como área atingida 
Atingidos e Atingidas da bacia do Rio Doce celebram decisão judicial Foto: Pedro Gonzaga

O Tribunal Regional Federal da 6ª Região (TRF-6), em Belo Horizonte (MG), reconheceu, na tarde da última quarta-feira (24), o litoral norte capixaba como mais uma área atingida pelo desastre-crime de responsabilidade das empresas Samarco, Vale e BHP Billiton. A decisão garante que as populações das localidades Nova Almeida (distrito de Serra), Conceição da Barra, Aracruz, Linhares e São Mateus tenham acesso aos programas de reparação integral previstos no acordo judicial sobre o crime. 

O julgamento ocorreu após ação movida pelas mineradoras contra Deliberação 58, aprovada em 2017 pelo Comitê Interfederativo (CIF), órgão Deliberativo da Fundação Renova, responsável pela reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão. A deliberação 58 reconheceu o litoral capixaba como área atingida, mas a decisão foi suspensa em outubro de 2023. 

Para o procurador Felipe Barros ‘é momento de revigorar as esperanças, reestruturar a nossa luta e o nosso trabalho’. “o que também esteve em julgamento “foi a própria capacidade do Estado de guiar o ritmo desse processo de reparação, de ordenar diretrizes para a Fundação Renova e de recuperar o controle do processo de reparação – trazendo os atingidos para a centralidade desse processo”. 

Texto: Thiago Matos – Equipe de Comunicação Programa Médio Rio Doce