Cultivo de plantas medicinais, caiaquismo, aluguéis de sítios e bares beira-rio também são apontados no estudo. Confira mapa interativo com pontos da região levantados pela consultoria. 

A Campo – Cultura, Meio Ambiente e Patrimônio, uma das consultorias contratadas pela Aedas na Região 2, apresentou um levantamento de danos às atividades e serviços relacionados às manifestações culturais, às práticas e serviços de turismo, esporte e lazer causados pelo rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão. 

Banhados pelo Rio Paraopeba, os municípios de Mário Campos, Betim, Igarapé, Juatuba, São Joaquim de Bicas e Mateus Leme também são considerados atingidos pelo rompimento e tiveram suas atividades culturais, esportiva e de lazer estudadas pela consultoria. 

Diversos danos foram levantados nesse estudo. Em Betim, por exemplo, a Batalha do Glória e o Concerto Contra o Preconceito. Em Igarapé, o cultivo, coleta e uso de plantas medicinais, o campo de futebol da comunidade do Brejo e as tradicionais cavalgadas. No município de Juatuba, o caiaquismo, o Pontilhão, os aluguéis de sítios e áreas de camping próximos ao rio Paraopeba foram prejudicados. 

Em Mário Campos, o cultivo de hortaliças, a criação de animais, a psicultura e os bares de beira-rio. Em São Joaquim de Bicas, a Prainha do FHEMIG, a Balsa e a pesca para venda de peixes estão entre os lugares e atividades com danos levantados após o rompimento. 

Serra dos Três Irmãos, Mário Campos. Foto: Reprodução Banco de Imagens Consultoria
Principais danos encontrados:  
  • Interrupção da pesca e das atividades de produção associada, comprometendo sobremaneira os ofícios e fontes de renda de pescadores (as), artesãos (ãs), construtores (as) de utensílios específicos para pesca. Bem como a impossibilidade da utilização das águas do Rio Paraopeba para os tanques de psicultura;  
  • Alterações das condições produtivas locais com prejuízos à tradição cultural da agricultura familiar, dos quintais produtivos e criação de animais, gerando comprometimento à soberania alimentar e segurança nutricional, estigmatização do que é produzido nas localidades atingidas;  
  • Alterações profundas nos modos de vida das famílias atingidas, com enfraquecimento de laços comunitários, uso de plantas e raízes coletadas nos ambientes beira-rio prejudicando as tradições relacionadas à saúde a partir do uso de plantas e a transmissão de saberes relacionados.  
  • Interrupção da tradição de visitação aos (às) parentes e amigos bem como a diminuição do fluxo de turistas, prejudicando a geração de renda dos (as) empreendedores (as) locais, desencadeando perdas em vários setores produtivos, como alimentação, artesanato, serviços de passeio e locação de sítios e chácaras.  
  • Interrupção de importantes atividades culturais, como celebrações, festejos e feiras, o que afeta a qualidade do acesso da população à cultura popular e ao lazer acessível, bem como causa danos na geração de renda dos (as) trabalhadores (as) envolvidos (as) nos eventos e festividades, prejudicando a sociabilidade e potencial turístico ocasionado pela movimentação de pessoas;  
  • Interrupção das práticas de lazer e esporte no Rio e suas adjacências e ao patrimônio natural, tais como o nado, piquenique, pesca, contemplação, navegação, trilhas, educação e convivência social. A impossibilidade de frequentar esses lugares, gera prejuízos às redes de sociabilidade e à dimensão imaterial desses locais, ligados à elementos espirituais ou abstratos, como os saberes e os modos de fazer das pessoas atingidas;   
  • As paisagens e os ambientes ligados ao Rio Paraopeba, passaram a ser fonte de memória sobre perdas e danos, de preocupações relativas à saúde e aos demais prejuízos relacionados ao comprometimento qualidade das águas;  
  • Danos às celebrações, às oferendas para as divindades dos cultos ancestrais de matrizes africanas do candomblé e da umbanda, às formas de expressão dos reinados, aos modos de vida tradicionais, aos ritos ligados ao Rio e aos ambientes adjacentes, aos saberes do cultivo, coleta, manejo e preparo de folhas (nsabas – angola; ewé-ketu), aos lugares de referência cultural e sagrada dos Povos e Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA).   
Coleta, cultivo e preparo de “folhas” (nsaba ou ewé) em Betim. Foto: Roger Cipó

A partir do levantamento de dados e das análises realizadas, a consultoria mapeou três circuitos: “Circuito Cultura e Patrimônio Cultural”, “Circuito Esporte e Lazer” e “Circuito Turismo”. 

Para apresentar os resultados do levantamento, foram elaborados materiais em linguagem acessível, como cartilhas, plataformas digitais, e relatórios mais amplos. Confira e baixe os materiais abaixo. 

Pedra Grande de Igarapé. Foto: Reprodução Banco de Imagens Consultoria
Mapa interativo 

A Plataforma Digital “Localize: mapa dos danos ao turismo, cultura, esporte e lazer na Região 02 do vale do Rio Paraopeba” apresenta as referências do Patrimônio Cultural, os lugares, atividades e serviços do Turismo, Esporte e Lazer, situados nos municípios da Região 02 da bacia do Rio Paraopeba. 

Ao acessar a Plataforma é possível interagir com o site realizando buscas por municípios, referências culturais, lugares, atividades e serviços de esporte, lazer e turismo, nessa região. Clique na imagem para acessar a plataforma:

Para construção dos mapas, foram utilizadas imagens do satélite CBERS 4 e, também, com o auxílio da plataforma do Google EARTH. O tratamento dos pontos coletados pelo aparelho de navegação GPS foi realizado no programa Track Maker, onde foi feita a descarga dos dados e o pré-processamento para que posteriormente fossem utilizados na composição dos mapas. 

Quando os estudos foram feitos? 

As consultorias técnicas especializadas contratadas pela Aedas realizaram os estudos entre junho de 2021 e abril de 2022.  

A contratação das consultorias especializadas por parte da assessoria técnica independente (ATI) é fundamental na identificação dos danos relacionados ao desastre sociotecnológico nos territórios atingidos, possibilitando o detalhamento desses danos através da escuta sensível das pessoas atingidas e das idas a campo.   

Erifranklin Santos, coordenador da Área Temática na R2, comenta que os danos voltados para a área de cultura, turismo e lazer, por vezes, são colocados em segundo plano ou são negligenciados. Para ele, devido sua vinculação a outras áreas como saúde, trabalho e renda e socioambiental, os danos da área de cultura e lazer acabam sem uma reparação específica.  

“O aprofundamento dos danos causados nas áreas estudadas reafirma que só com a reparação integral será possível garantir à retomada aos modos de vidas das populações à situação próxima do período anterior ao rompimento da barragem”, comentou Erifranklin. 

Produção Artesanal de Queijo em Betim. Foto: Reprodução Banco de Imagens Consultoria
Metodologia 

O trabalho das consultorias teve início com reuniões de alinhamento com a Aedas e apresentação do Plano de Trabalho às Comissões de Atingidos e Atingidas. As metodologias utilizadas nos estudos foram construídas a partir do cruzamento de dados primários (direto com a fonte dos dados) e secundários (de dados de pesquisas e estudos anteriores). 

No âmbito das fontes secundárias, foram consultados documentos de instituições públicas e privadas. Também foram utilizados dados e informações fornecidas pela Aedas, tais como registros familiares, sistematização de espaços participativos (Grupos de Atingidos e Atingidas, Rodas de Diálogo e Seminários Temáticos), matriz emergencial de danos, mapas, produtos desenvolvidos por outras consultorias pertinentes às áreas do estudo, tabelas de sistematização de informações, dentre outros, respeitando a Lei Geral de Proteção de Dados.  

Já os dados primários foram coletados e organizados a partir de incursões a campo, privilegiando a percepção das comunidades atingidas no que diz respeito às práticas e serviços relacionados à Cultura, ao Patrimônio Cultural, ao Turismo, ao Esporte e ao Lazer.  

PCTRAMA em manifestação às margens do Rio Paraopeba em Juatuba. Foto: Rurian Valentino.
Povos e Comunidades Tradicionais 

Os povos e comunidades tradicionais, dentre eles os Povos e Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA), possuem, como característica comum, uma relação muito ligada à natureza e ao Rio Paraopeba. Na Região 2, por exemplo, foram identificados três segmentos de povos e comunidades de tradição ancestral de matriz africana, sendo a Umbanda, o Candomblé e os Congados e Reinados.

Campo de Futebol em Santa Isabel. Foto: Reprodução Banco de Imagens Consultoria
A Cultura, Esporte e Lazer como um direito! 

Os direitos à Cultura, ao Esporte e ao Lazer são garantias ao bem-estar social previstas pela Constituição Federal de 1988 e regulamentados por legislações estaduais e municipais.  

Desse modo, olhar para os danos referentes às áreas de cultura, turismo, esporte e lazer torna-se imprescindível para um processo de reparação integral, considerando seus efeitos sobre os modos de vida, cotidiano, memória, identidade, vínculos e redes de sociabilidade, compartilhamentos de saberes entre gerações, dentre outros.  

Pode-se dizer que os danos a essas áreas estão correlacionados com outros eixos como saúde (física e emocional), economia, trabalho e renda, educação e com a dimensão socioambiental.  

Casa de Máquina Usina Hidrelétrica Doutor Gravatá (Fazenda Cachoeira). Foto: Reprodução Banco de Imagens Consultoria
Este material faz parte de uma coletânea de sínteses, extraídas de estudos e levantamentos dos danos realizadas pelas consultorias contratadas pela Aedas na Região 2.