Inventários Participativos fortalecem patrimônio cultural, natural e biogenético de comunidades negras
Iniciativa tem foco nas tradições e ancestralidades de matrizes africanas.

Alimentar, limpar, aguar, plantar, costurar, cuidar. Muitas são as práticas cotidianas em comunidades tradicionais, que entendem o cuidado enquanto algo dado no coletivo, ser Povos e Comunidades Tradicionais é um modo de existir no território, em práticas tradicionais que criaram e estabeleceram formas de expressão, saberes, celebrações, e também biodiversidade.
Nesse sentido, são muitos os aspectos do patrimônio das comunidades tradicionais, conhecimentos que perpassam diversas dinâmicas, sejam aquelas relativas aos recursos naturais do território, sejam as que trazem técnicas de plantio e construtivas, ou os saberes ao manejar ervas, folhas e a própria água.
Há uma perspectiva integral e holística no patrimônio cultural das comunidades tradicionais, pois é resultado das relações entre as existências dessas comunidades e seu território. E é a compreensão do coletivo que promove a salvaguarda de suas tradições, suas manutenções e mudanças, suas resistências e continuidades.
O reconhecimento do patrimônio cultural dos Povos e Comunidades Tradicionais enquanto proteção de seus territórios
As políticas públicas de patrimônio no Brasil apresentam uma gama de perspectivas, entre elas as de patrimônio cultural, natural e biogenético. Boa parte destas políticas são capitaneadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Em Minas Gerais, o órgão que cuida das ações de patrimônio é o Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (IEPHA).
No tocante ao patrimônio natural e biogenético, além do IPHAN, tem-se ainda órgãos como o Ministério do Meio Ambiente e o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio).
Surgido em 1937, o Iphan traz políticas importantes para o patrimônio material, imaterial, natural e arqueológico, com legislações como o Decreto 3.551/2000 que institui a Política Nacional de Patrimônio Imaterial e a Portaria Nº 375, de 19 de setembro de 2018 que instituiu a Política do Patrimônio Cultural Material.
Estas e outras ferramentas jurídicas promovem a proteção do patrimônio cultural, e o que precisamos sublinhar é que essa proteção pressupõe a indissociabilidade entre este e as comunidades, detentores e territórios que o abrigam, dão valor simbólico, conservam e salvaguardam referências culturais, que também constituem a identidade nacional.
Ou seja, promover a conservação e salvaguarda do patrimônio cultural, natural, arqueológico ou biogenético é ação que não se separa da proteção das comunidades tradicionais e seus territórios.
Memória e ancestralidade: o inventário participativo como ação de fortalecimento das comunidades tradicionais
O inventário participativo é considerado pelo Iphan uma metodologia, ou seja, uma forma de aplicar o Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC), ferramenta que possibilita o diagnóstico e a documentação do patrimônio imaterial e também material.
A metodologia nasceu do diálogo do Programa Mais Cultura, ligado ao Ministério da Cultura (MINC), o Programa Mais Educação (MEC), do Ministério da Educação e o IPHAN, em um esforço para o levantamento e sistematização das referências culturais das comunidades, a partir da escola.
Em 2016, foi lançado um caderno de divulgação da metodologia, com passo a passo para a produção dos inventários, desde do entendimento do que é patrimônio cultural, para o Estado e para as comunidades, a entrevistas, questionários, pesquisa e fichas do INRC.
Clique a seguir e acesse ao caderno de divulgação da metodologia:
MANUAL DE APLICAÇÃO – Inventários Participativos
A proposta dos Inventários Participativos é a “mobilização e sensibilização da comunidade para a importância de seu patrimônio cultural, por meio de uma atividade formativa que envolve produção de conhecimento e participação” conforme consta em caderno voltado à sua divulgação.
Participação social é autonomia das comunidades e dos detentores de conhecimentos tradicionais para levantar e sistematizar o que entendem como seu patrimônio cultural, em todos os âmbitos de suas formas de existência. Ou seja, são as próprias comunidades que realizam os inventários, com auxílio de profissionais da área, professores ou outras pessoas que julguem poder colaborar com a realização da pesquisa, caso pensem ser necessário.
No contexto em que foi criada, a metodologia é executada dentro dos espaços escolares, sob a orientação de professores, com entrevistas, pesquisa e levantamento feito pelos estudantes, promovendo também o diálogo intergeracional, pois geralmente as crianças procuram avós, pais, tios e outras pessoas referências da comunidade como fontes de conhecimento de seu patrimônio.
A produção de Inventários Participativos, portanto, é também uma compreensão de um fazer coletivo, que une estudantes, professores, famílias, ou toda a comunidade, na construção de um olhar sobre suas práticas tradicionais, suas referências culturais, naturais ou arqueológicas.
Assim, na construção desse olhar coletivo sobre seu próprio patrimônio, há o fortalecimento comunitário, pois haverá o diagnóstico de suas referências culturais, possibilitando promover, e também demandar do poder público, ações de salvaguarda. E, a partir dessas demandas e ações, garantir ferramentas para a proteção de seu território.
Texto: Janaina Moscal, equipe de PCTs da Aedas Paraopeba