Cristina de Medeiros, moradora da Comunidade Tradicional Ribeirinha da Rua Amianto, sonha com uma cidade mais acessível

Cristina de Medeiros nasceu e cresceu na Comunidade Tradicional Ribeirinha Rua Amianto, em Brumadinho. A comunidade tradicional se formou ao longo de seis gerações da família Gonçalves e Medeiros, tornando-se um território de identidade e pertencimento para muitas famílias.

Aos 52 anos, com um filho e uma vida inteira de lembranças construídas nesse território, viu sua história ser atingida pelo rompimento da barragem e, posteriormente, por enchentes. Dois primos seus não sobreviveram ao desastre-crime. A rua que antes era sinônimo de aconchego e pertencimento virou um espaço de resistência.

“Nasci aqui, foi de geração para geração, éramos uma família grande, praticamente metade da rua morava minha família”, conta. “Era tranquilo, tínhamos liberdade de brincar, ir à beira do rio, pescar, plantar, ficar à vontade… e depois do rompimento, tudo ficou comprometido”.

A lama secou, mas as marcas ficaram. A casa onde morava segue em pé, trincada, ameaçando ruir a qualquer momento. Hoje, Cristina vive de aluguel social,
mas ainda na mesma rua, se agarrando às suas raízes.

Em 2020, Cristina precisou se submeter a uma cirurgia na coluna devido a um comprometimento do nervo ciático que a levou usar andador. “Antes disso, já sentia dificuldades na perna, mas ainda conseguia usar a bengala. Passei a usar andador depois do rompimento. Minha perna piorou por causa do quadril, que ficou mais comprometido”, comenta.

Os danos do crime ambiental estão no corpo e na alma. Os problemas respiratórios se agravaram. Doenças de pele surgiram sem explicação, tratadas com pomadas que aliviam por um tempo, mas nunca curam, e os olhos já não enxergam como antes – oito graus de miopia dificultam ainda mais a jornada.

“Na Rua Amianto, era todo mundo unido”, lembra. Mas agora a rua também é dor. De um lado, o trem carregado de minério que corta a cidade rumo a outros países. Do outro, o rio Paraopeba, que um dia foi fonte de vida e hoje leva consigo resquícios de contaminação. A cada chuva forte, o medo volta.

O barulho da sirene ainda ecoa em sua memória: “Ficamos com aquilo na cabeça, aquele medo de acontecer de novo. No dia do rompimento, o rio foi enchendo… Ficamos traumatizados. E a gente vai perdendo a graça”.

Ela sonha com uma cidade mais acessível, com transporte adaptado para pessoas com deficiência, pois quem tem mobilidade reduzida, enfrenta mais desafios e perde sua autonomia. Almeja também que a Vale, responsável pelo rompimento da barragem, olhe para os atingidos, que saia dos gabinetes e enxergue de perto o impacto humano e ambiental de sua atividade.

“A Rua Amianto, na minha vida, antes era uma bênção. Hoje, fizeram ela perder o valor, perdeu o encantamento, a alegria. Mas a comunidade ribeirinha é luta e união pela retomada de nossos modos de vida”.

Cristina segue resistindo. A rua que um dia foi sua, ainda é, mas agora, também é terra de batalha.

Comunidade Tradicional Ribeirinha da Rua Amianto

Texto e fotos: Felipe Cunha | Aedas

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