Atividade incluiu debate sobre lei de atingidos, direitos violados, medidas de reparação e elaboração de ofícios
Pessoas das comunidades atingidas apresentam trabalhos realizados na Oficina de Ofícios. Foto: Felipe Cunha/Aedas 

No último sábado (31/08) aconteceu a Formação em Direitos Humanos nas regiões 1 (Brumadinho) e 2 (Betim, Igarapé, Juatuba, Mário Campos e São Joaquim de Bicas). Os encontros ocorreram de forma simultânea em Brumadinho e Betim, reunindo cerca de 90 pessoas atingidas para debater sobre a Política Nacional dos Atingidos por Barragens (PNAB), a Política Estadual de Atingidos por Barragens (PEAB), os direitos violados pelo crime da Vale e as medidas de reparação. Além disso, as lideranças comunitárias também participaram de oficinas para aprender a elaborar ofícios para denunciar irregularidades, apontar necessidades coletivas e levar informações aos órgãos competentes para cada caso.

O coordenador da equipe de Estratégias Jurídicas da Reparação (EJR), André Cavalcante, explica que a metodologia da atividade foi elaborada a partir do diálogo com as pessoas atingidas e os aprendizados da formação podem ser replicados em cada comunidade. “Foi um processo de diálogo e construção que vai ser possível replicar nos espaços de organização, de associações, de comunidades para que essas demandas de fato sejam encaminhadas para os órgãos devidos e que as pessoas tenham respostas”, avalia Cavalcante. “Também compreendemos coletivamente que a formação foi muito positiva para contribuir, enquanto papel de assessoria técnica, na construção técnica junto as atingidas no entendimento de quais são os principais instrumentos para reivindicações dos direitos”, completa.

A moradora do bairro Campo Verde, Natália de Freitas, comenta que um dos principais direitos violados a população de Mario Campos é o direito a saúde. “Hoje tem um impacto de pessoas de fora que vieram para a cidade. O posto de saúde do bairro, por exemplo, está superlotado. Você não consegue mais consultar”, explica Natalia. Além disso, ela aponta que os danos ao meio ambiente, segurança, acesso ao lazer e aumento do custo de vida também são preocupantes. “Muitas pessoas deixaram de utilizar do rio. O pequeno agricultor deixou de vender as suas mercadorias, as suas hortaliças para fora de Mário Campos, haja vista a suspeita de regar essas hortaliças justamente com água contaminada do rio. Hoje se encontra um excesso de caminhões, trazendo poluição para a cidade e o aumento do custo de vida. Antigamente, Mário Campos tinha um custo de vida x, hoje é x ao quadrado, tanto no supermercado, aluguel, em tudo”, finaliza.

Formação reuniu lideranças de diferentes comunidades em Brumadinho e Betim. Foto: Felipe Cunha/Aedas

O coordenador da equipe de Mobilização da região 1, Janderson Santos, destacou a diversidade de lideranças de Brumadinho presentes, com comunidades da zona rural, da zona quente e da sede do município que se apropriaram de diferentes ferramentas de reinvindicação de direitos. “Ao final da atividade, houve uma boa avaliação das lideranças de que a oficina realmente instruiu as pessoas atingidas a conseguir cobrar as instituições. Também entregamos uma cartilha que tem todas as instituições com números de telefone que os atingidos podem buscar para cobrar sobre diferentes temas”, destaca.  

Veja as Cartilhas

Elaboração de ofícios  

Durante a tarde, a equipe da Aedas realizou uma oficina para mostrar como fazer um ofício de forma coletiva. Divididas em grupos, as pessoas atingidas escolheram um caso para debater como sintetizar as informações necessárias e para quais instituições encaminhar. 

Irani Aparecida de Morais, moradora da comunidade Córrego Ferreira (Brumadinho), avalia que a oficina será útil para todas as comunidades terem mais autonomia. “Eu acho que isso vai ser interessante, porque nós não temos muito estudo, mas vamos conseguir colocar o assunto para que as pessoas que recebam ofício tenham noção do que está acontecendo e do que se passa na nossa região”, diz.

Comunidades apresentaram ofício elaborado coletivamente em oficina. Foto: Júlia Rohden/Aedas 

Catarina Magalhães, da comunidade Monte Cristo (Brumadinho) também destacou a importância da oficina de elaboração ofícios para fortalecer a comunidade. “Eu gostei muito da parte dos direitos humanos e gostei também dessa parte dos ofícios, porque é uma coisa muito forte que você consegue colocar ali e consegue alguma resposta através do ofício”, afirma.   

Maria Santana (São Joaquim de Bicas) avalia que o acesso à informação é fundamental. “Eu acho que esse papel de informação às pessoas e de formação com as pessoas é ideal para conhecerem os seus direitos e fazerem o uso da ferramenta que elas têm na mão”, explica. 

Direitos das crianças e adolescentes 

As crianças e adolescentes também debateram seus direitos em atividades lúdicas na Ciranda. Dentre as atividades, foram feitas cartografias das infâncias, nas quais cada criança localizava sua casa, sua rua, seu bairro e município.  

Depois, foi elaborado um Mapa dos Direitos. “Através de gravuras, nós contextualizamos alguns dos direitos que a criança e o adolescente têm”, explica Julimagda Medeiros, educadora da Ciranda. Miguel, de sete anos, participou da Ciranda e dá alguns exemplos de direitos ilustrados no mapa. “Tinha uma bola que era do [direito ao] lazer e brincar. O coração é [do direito] do amor, proteção e carinho. A banana é [direito à] alimentação saudável. A árvore é [direito ao] meio ambiente”, conta ele que mora do Tejuco (Brumadinho). 

Na ciranda, crianças e adolescentes montaram o Mapa dos Direitos. Foto: Isis Oliveira/Aedas 

Scarlet Souza, educadora da Aedas, comenta que a Ciranda é um momento muito importante de formação para as crianças. “Respaldados pela PEAB E PNAB e junto com a Constituição Federal e o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), a gente reforçou com eles o direito a um ambiente equilibrado, à educação, alimentação e lazer. A gente fez essas ligações com o cotidiano deles, pois são crianças atingidas e muitos desses direitos foram violados, então é muito importante que eles tenham acesso a essa discussão também. A gente partiu da territorialidade deles, construindo do micro para o macro: a rua, a cidade, bairro, estado, o país, para a gente mostrar essas instâncias, que tem uma política estadual e nacional, que está assegurando esses direitos” aponta.  

Texto: Isis Oliveira e Júlia Rohden