Desde o rompimento da barragem de Fundão, de responsabilidade das mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton, o direito essencial a água de qualidade sofre prejuízos na comunidade, com o tema tornando-se assunto sensível, gerando muitas reclamações, insatisfação e problemas de saúde. 
Pessoas atingidas cobram direito e acesso a água de qualidade em Cachoeira Escura (Belo Oriente) – Foto: Cleiton Santos

Como marco pela data do Dia Mundial da Água, comemorado neste 22 de março, a Comissão de Atingidos e Atingidos de Cachoeira Escura, distrito de Belo Oriente, localizado na região do Vale do Aço, realiza junto a outras pessoas atingidas mobilização com ato público para reivindicar direito e acesso à água de qualidade, além do pagamento do Auxílio Financeiro Emergencial (AFE). Desde o rompimento da barragem de Fundão, de responsabilidade das mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton, o direito essencial a água de qualidade sofre prejuízos na comunidade, com o tema tornando-se assunto sensível, gerando muitas reclamações, insatisfação e problemas de saúde. 

Com cartazes de denúncia, o ato teve início às 8horas da manhã desta sexta-feira (22), com ponto de encontro na Praça José Ramalho, mais conhecida como Praça dos Correios do distrito de Cachoeira Escura. Cerca de 150 pessoas marcharam da praça, localizada no bairro Alex Miller, até o escritório da Fundação Renova, para entregar ofícios da Comissão de Atingidos de Belo Oriente construído com o apoio da Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas), que atua no assessoramento técnico independente das pessoas desta região. 

O ofício trata da lista de pessoas atingidas do município de Belo Oriente que deveriam estar recebendo o AFE, mas não recebem. As representantes da comissão, Alessandra Maria de Oliveira e Maria Aparecida Barbosa, receberam da mão da representante da Renova os comprovantes de protocolo dos ofícios. 

Alessandra Maria de Olivera e Maria Aparecida Barbosa com comprovantes do protocolo dos ofícios sobre AFE – Foto: Mariana Duarte

“Esse momento é grande, só de representar nossa comunidade na luta há mais de sete anos é uma gratificação. Conheço muitas pessoas que moram na Cachoeira há mais de 40 anos e nunca conseguiram esse direito ao AFE”, destaca Mara Aparecida. 

Entre as outras pautas de reivindicação do ato estão:  

  • Garantia da água de qualidade com fonte de captação alternativa ao rio Doce; 
  • Reconhecimento dos danos à saúde e realização de estudos que auxiliem na estruturação do Sistema Único de Saúde (SUS) para que haja atendimento adequado às necessidades da população atingida. Além da execução do Plano Municipal de Saúde, por parte da Renova; 
  • Pagamento do Auxílio Financeiro Emergencial (AFE), com retroativos, a todos atingidos e atingidas que tem direito; 
  • Pagamento do Novel Água a todos que receberam pelo PIM água. 

Raquel Justino, coordenara de Mobilização da Aedas no Médio Rio Doce, destaca que março é um mês de luta dos atingidos por barragens e, no distrito de Cachoeira Escura, levantamento mostra que muitas pessoas deveriam e não receberam o Auxílio Financeiro Emergencial (AFE). Nesta sexta, a ATI foi convidada pelas pessoas atingidas a participar da mobilização. 
 
“Saímos Praça dos Correios para a Fundação Renova para entregar e protocolar o ofício com informações relacionadas às pessoas que fizemos o Registro Familiar e estão dentro dos critérios para receber AFE e não recebem. Então, a gente fez essa entrega com mais de 500 nomes, mas encontramos muita resistência da Fundação Renova, as pessoas esperaram muito para serem atendidas. Mas foi protocolado esse ofício com o nome das pessoas que fizeram registro familiar e não recebem o AFE”, explica Raquel.  

Foto: Cleiton Santos

Eliane Lourenço, que é vereadora em Belo Oriente, denuncia o temor que a população sente com relação ao recurso natural. “O nosso rio ficou doente em 2015 e continua doente até 2024 e a água que está sendo fornecida para a população é a água desde rio doente. Pedimos providências, mais respeito com nosso povo, porque não confiamos nessa água para beber. Precisamos de indenizações justas para todas as pessoas, o Auxílio Financeiro Emergencial que é um direito”, alerta. 

A Comissão de Atingidos e Atingidas junto com a Aedas também protocolou ofícios voltados a demandas de saúde e água na Prefeitura Municipal de Belo Oriente, na Secretaria Municipal de Educação e Companhia de Saneamento de Minas Gerais, a Copasa. 

Água é direito a vida  

A qualidade da água foi um dos principais temas abordados nos Grupos de Atingidos e Atingidas (GAAs) realizados pela Aedas no Médio Rio Doce, neste mês. Na oportunidade, a população de Cachoeira Escura reclamou não apenas da aparência, mas também do temor da contaminação por metais pesados, dano trazido pelo rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em Mariana, em 2015.  

Toda esta preocupação se reflete nos dados do Registro Familiar, levantamento realizado pela Aedas em 2023. O estudo aponta que, por exemplo, 87,25% dos núcleos familiares tiveram contato com a água e solo contaminados após enchentes de rejeitos. A água, por diferentes processos, se tornou uma preocupação constante na vida de atingidos e atingidas. 

“Nossa água vem direto do rio Doce para ser tratada, para vir para nossas casas. As pessoas, nós atingidos, não confiamos nesta água, porque ela está contaminada assim como contaminou os alimentos”, afirmou a professora Maria Rosa, da Comissão de Atingidas e Atingidos de Cachoeira Escura, durante GAA recente realizado em Alex Miller, Cachoeira Escura. 

Grupo de Atingidos e Atingidas (GAA) em Cachoeira Escura – Foto: Aedas/Médio Rio Doce

Os danos trazidos pelo rompimento de 2015 acabou gerando problemas na insegurança da utilização da água, especialmente para consumo humano. A coordenadora da Equipe Socioambiental da Aedas no Médio Rio Doce, Vanessa Maria Rodrigues, explica como uma sucessão de efeitos tem piorado a qualidade de vida população. 

“A população tem nos apontado, através dos espaços participativos e da aplicação do Registro Familiar, danos que tem se prolongado ao longo desses oito anos. Os principais danos apontados são os danos no abastecimento, referentes a interrupção recorrente, captação não segura de água, além de prejuízos à agricultura, criação de animais e pesca, em função de degradação da qualidade do Rio Doce e muito dos seus afluentes”, disse. 

A coordenadora ainda acrescenta: “essa vulnerabilidade hídrica e sanitária que foi causada por esse desabastecimento, pelos problemas causados pelo consumo da água, pela desconfiança na qualidade da água recebida pela população de Cachoeira Escura, na região pós rompimento, é um fator inegável de agravamento à saúde física, metal da população, além dos recursos financeiros, à geração e renda, assim como outras atividades cotidianas”, completa. 

Por causa do tema, este ano, por exemplo, já foram realizadas audiências, reuniões e até ato público pedindo pela melhoria da qualidade e no acesso ao bem natural no distrito.  

Texto: Mariana Duarte – Comunicação Programa Aedas Médio Rio Doce