Lideranças atingidas da Região 2 receberam devolutivas do MPMG, em Juatuba
Momento foi destinado para retorno às demandas feitas pela população atingida

Fotos: Diego Cota | Aedas
Comissões e lideranças das comunidades atingidas da Região 2 se reuniram na terça-feira (05/03) com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), em uma reunião pública realizada no Centro Administrativo José Martins Gonçalves, em Juatuba. No encontro, que fez parte da programação do MP Itinerante no município, os atingidos receberam respostas para as questões que foram feitas durante a visita da instituição na região, em novembro. Elas também relataram outras situações vivenciadas pelas comunidades atingidas pelo rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, em 2019.
Foram feitas devolutivas referentes à questão hídrica e de saúde específicas das regiões atingidas, informações dos encaminhamentos dados sobre os danos das enchentes na Região 2, a situação do Aterro do Citrolândia e as possibilidades de promover a transparência nas ações da Reparação Socioambiental.
O procurador-geral de Justiça do MPMG, Jarbas Soares Júnior, participou do diálogo e garantiu para as lideranças que a instituição está do lado das pessoas atingidas. “Perdemos tantas vidas, a vida de vocês mudou para muito pior e esta geração não tem esperança de voltar um pouco do que perdeu. Nos comporta agora exigir duas coisas. Uma é a punição dos culpados. O ideal é que o MP, com o apoio das polícias, consiga provar a responsabilidade, porque esse crime tem responsáveis. Nós precisamos de uma resposta da justiça que, no caso hoje, a justiça federal”, disse.
“A outra parte, que é a indenização pelos danos causados, nós fizemos um acordo muito difícil pra nós de assinar com a empresa Vale. Mas nós tínhamos dois caminhos só: o Acordo ou o Processo Judicial. O processo Judicial infelizmente não iria dar uma resposta a nós e talvez muitos daqui, quando o processo tivesse sido julgado no STF, já não estariam aqui”, completou.


A atingida Joelísia Moreira, comissão da comunidade de Satélite, em Juatuba, avaliou que foi um momento necessário para fazer a devolutiva das questões apresentadas pela R2 e reforçou a importância de o MP manter o diálogo no território junto aos atingidos. “Eu acho que qualquer espaço que traga a participação das Instituições de Justiça perto dos atingidos é importante e tem que ter. A gente tem que tirar o maior proveito dele”, afirmou.
“Precisamos que o MP verifique localmente a realidade dos atingidos e as dificuldades que vêm enfrentando, como os problemas de infraestrutura e as deficiências básicas fundamentais para sobrevivência. Essas violações de direito têm que ser verificadas de forma mais próxima. É isso que tem que acontecer, o MP representar, mas com legitimidade. A partir do momento que ele vem a campo, que ouve de fato e que reconheça as nossas dificuldades, que nós possamos transmitir as demandas para que sejam foco das IJs, principalmente do MP”, completou.
Devolutiva sobre a execução do Acordo Judicial
A Roda de Conversa foi realizada no dia seguinte da Assinatura do Termo de Colaboração Técnica, celebrado entre as Instituições de Justiça e Entidade Gestora do Anexo I.1, que marcou o início dos 90 dias para construção de uma proposta definitiva para gestão dos recursos na Bacia do Paraopeba.
A coordenadora da Coordenadoria de Inclusão e Mobilização Sociais (Cimos/MPMG), promotora Shirley Machado de Oliveira, aproveitou o espaço para reforçar a necessidade de as atingidas estarem envolvidas nesse período de construção coletiva. “É muito importante que vocês lideranças e suas comunidades participem. É um momento fundamental para que a forma que vocês entendem que esse recurso deva ser destinado possa ser concretizada e indicada para as Instituições”, afirmou.
Outra solicitação das pessoas atingidas que teve resposta foi referente ao Anexo II do Acordo Judicial, que prevê a Reparação Socioambiental para a região atingida. Esse é um ponto sempre abordado nos espaços participativos, pois não há até então meios para participação e transparência nessa parte da reparação que é tratada como prioridade pelas lideranças.
A promotora informou que o pedido foi levado para o Comitê de Compromitentes e que está sendo construída uma devolutiva. A possibilidade cogitada é que seja realizada por meio de um seminário que abordaria todo o andamento do Anexo II, mas ainda não há essa definição.
Devolutiva das questões relacionadas à saúde e situação hídrica
A promotora Vanessa Campolina Rebello Horta, coordenadora da Coordenadoria Regional das Promotorias de Justiça de Defesa da Saúde, do MPMG, informou que um novo plano de monitoramento da qualidade da água para consumo humano está previsto para ser divulgado pela Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG).
A expectativa é que contenha novas resoluções que envolvam as principais questões que foram relatadas pelas atingidas da Região 2, entre elas a qualidade da água em poços e cisternas que estão depois do limite de 100 metros da margem do Paraopeba. Atualmente, no critério adotado pela mineradora Vale, apenas as pessoas que têm essas estruturas dentro do limite estabelecido são elegíveis para recebimento de água.
Os atingidos afirmam que os danos aos poços e cisternas são observados em localidades mais distantes da margem do Rio. Eventuais mudanças no fornecimento de água serão embasadas nesse novo plano a ser divulgado.
Sobre a atenção à saúde da população atingida, a promotora informou que as questões relatadas no diálogo realizado em novembro foram sistematizadas, por município, e enviadas para as prefeituras, mas que até o momento não houve resposta aos ofícios. As questões relacionadas à saúde também foram enviadas para a SES. A promotora informou que na próxima semana está prevista uma reunião do MP com a secretaria onde serão abordados esses pontos.

Em relação à criação da Política Estadual de Atenção Integral à Saúde para as populações atingidas por barragens, a promotora informou que o MP solicitou, por meio de uma audiência pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), a criação de um Grupo de Trabalho na ALMG com atingidas e órgãos de saúde, mas o pedido não foi atendido pela Comissão de Saúde, que encaminhou a demanda para a SES. Ela disse que o MP ainda tenta viabilizar essa discussão na ALMG, por meio de uma Comissão Especial Temporária, e que a solicitação foi enviada para o presidente do legislativo.
Sobre a situação das populações atingidas pela mineração e que, dessa forma, são expostas a metais, Vanessa Campolina informou que tiveram a resposta da SES que foi construída uma resolução e que até o final de fevereiro de 2024 sairia uma primeira proposta de protocolo, que vai ser levada para discussão e consulta pública.
Segundo ela, esse seria um primeiro momento para que o sistema de saúde possa estar adequado para lidar com as questões apresentadas pela população atingida. “O MPMG entende que a criação desse protocolo é importante, mas tem que ser só o primeiro passo. Só o protocolo não vai resolver, mas é um primeiro passo para a criação de uma linha de cuidado”, disse.
Diferente de quando houve a visita na Região 2, em novembro, nessa Roda de Conversa a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) não pôde participar. Foi informado que as equipes estão mobilizadas nas ações relacionadas ao combate da Dengue.
Inquéritos foram instaurados para investigar danos das enchentes e aterro no Citrolândia
Assim como havia sido informado durante a visita realizada em novembro, a promotora Shirley Machado reforçou que foi instaurado um inquérito civil público, pela Promotoria de Belo Horizonte, com objetivo de investigar os danos causados pelas enchentes à população ribeirinha. Segundo ela, nesse procedimento há um pedido de perícia para avaliar esses danos e a relação com o rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão.
Outra demanda, dessa vez das comissões das comunidades São Salvador e Dicalino Cabral, de Betim, teve a abertura de um inquérito para investigação. A promotora Shirley informou que a Promotoria de Justiça de Betim vai apurar a questão relatada pelas atingidas sobre o aterro do Citrolândia, localizado na comunidade São Salvador.
Busca por reconhecimento no PTR continua como luta de comunidades da R2
Uma equipe da Fundação Getúlio Vargas (FGV), gestora do Programa de Transferência de Renda (PTR), participou do momento de devolutiva. Com isso, as lideranças atingidas puderam reforçar suas demandas para reconhecimento de suas comunidades enquanto elegíveis no programa.
Marcela Jannuzzi, da FGV, informou que o estudo técnico para inclusão da comunidade de Bom Jardim, do município de Mário Campos, está sendo feito e assim que estiver concluído será enviado para definição pelas IJs.
Outra comunidade que busca o seu reconhecimento é a Ocupação Santa Fé, localizada em Juatuba. A atingida Canaã da Silva Farias explicou para as promotoras e para a equipe da FGV que o CRAS, que realizou o cadastramento das famílias, assim como as correspondências que chegam, considera a comunidade como sendo parte do bairro Eldorado, que atualmente está incluído no PTR.

O pleito das atingidas é para que haja esse entendimento também para uma definição da poligonal do bairro Eldorado que considere a área da ocupação. A representante da FGV informou que, pelo estudo feito, com base no Plano Diretor do Município, a Ocupação estaria fora dos critérios adotados.
Canaã contou que não vai desistir dessa luta, uma vez que os moradores sofrem diariamente com os danos e a alteração no modo de vida provocados pelo rompimento. “Quando se trata dos atingidos, tudo é muito complexo. E quando se trata da Ocupação, que está a 1400 metros do Rio, onde a gente pescava, tinha o nosso lazer e tirava até o próprio sustento, a gente tem essa resposta negativa de que estamos fora das poligonais e que o Plano Diretor do nosso município não alcançou. Isso teria que ser colocado, né, a Ocupação dentro desse plano diretor e isso não aconteceu”, lamentou.
“É uma indignação muito grande, mas eu não vou desistir, não posso, porque os problemas são muitos. Pessoas têm morrido na Ocupação, pessoas cadeirantes, acamadas sem um cuidado da parte do poder público. Eu vou insistir na luta. Enquanto houver vida, há esperança”, disse.
As atingidas também cobraram mais transparência da FGV sobre os estudos das poligonais da Região 2. A atingida Tatiana Rodrigues, da comunidade Vale do Sol, de São Joaquim de Bicas, reforçou a solicitação para que os estudos sejam compartilhados com as comissões.
Comissões de Juatuba entregaram ofício com demandas do município para o MP
O espaço de diálogo teve duração de pouco mais de duas horas. Como as pautas dos atingidos são diversas, as questões específicas relacionadas a Juatuba não puderam ser tratadas durante a roda de conversa. Por causa disso, as comissões do município elaboraram um ofício elencando as principais demandas que desejam a atenção do MPMG e entregaram para a promotora Shirley.
As comissões solicitam o diálogo mais aprofundado sobre a Ocupação Santa Fé para debater a regularização fundiária e a oferta de serviços públicos para os moradores; elas buscam melhorias na infraestrutura em algumas comunidades, especialmente as afetadas pelo rompimento, que têm a situação de suas vias agravadas no período de chuvas; e cobram a transparência das ações referentes ao Anexo 1.3 no município.
Outros pontos sensíveis de Juatuba são a oferta do serviço de saúde pública, principalmente nesse momento de elevado número de casos de Dengue, e o enfrentamento à violência contra as mulheres, como aponta a atingida Joelísia Moreira. “Infelizmente Juatuba está entre um dos maiores índices de violência contra mulher, violência doméstica. Então são assuntos, por exemplo, não conseguimos abordar, mas que a gente registrou naquele documento, além das questões específicas das atingidas”, disse.
Atingida da comunidade Boa Esperança entregou carta com denúncia ao MPMG
O período chuvoso por si só já é um gerador de transtornos para as comunidades com pavimentação precária. Em Boa Esperança, no município de São Joaquim de Bicas, a situação dos atingidos está sendo agravada por obras realizadas no bairro. Intervenções essas que são executadas com recursos do Anexo I.3 do Acordo Judicial, conforme afirma a atingida Adeíva Maria da Conceição, da comissão de atingidos.
Ela aproveitou o momento de diálogo com o MP para entregar uma carta para a promotora Shirley. “Eu entreguei aquela carta pelo que está acontecendo na nossa comunidade. Ela sempre foi jogada, sempre não teve atenção política”, conta.

Adeíva descreveu a situação. “Eles – a prefeitura – estão fazendo muitas obras em outros lugares e fazendo mal feito, porque eles vão lá, passam a máquina, abrem uns buracos no meio da rua, fazem uns montes de terra e de capim, principalmente na via principal, e deixa lá. Quando vem a chuva, vira lama e a gente fica sem ter o direito de ir e vir”, contou.
Para ela, as obras acontecem nesses meses devido ao interesse político, por ser ano de eleições municipais. “Aproveitei essa reunião para pedir ao Ministério público para dar uma atenção melhor para a nossa comunidade, porque essas obras são com dinheiro nosso, de nós atingidos, não é dinheiro de política. E eles estão fazendo politicagem. E, além disso, estão fazendo de forma que está prejudicando toda a comunidade do Boa Esperança”, denunciou.
A promotora Shirley informou que vai encaminhar a denúncia para o Comitê de Compromitentes e para FGV Projetos, que realizada a auditoria dos Anexos I.3 e I.4, para averiguar a situação.


Texto e fotos: Diego Cota | Aedas