Durante o evento, as Instituições de Justiça e a Entidade Gestora apresentaram os primeiros passos do Projeto Piloto para as pessoas atingidas

Na tarde do dia 05 de junho de 2025, pessoas atingidas das 5 regiões da Bacia do Paraopeba e Represa de Três Marias, membros das Instituições de Justiça (IJs), da Entidade Gestora, das ATIs, jornalistas, entre outros, estiveram no Salão Vermelho do Ministério Públicos de Minas Gerais (MPMG) para testemunhar os primeiros passos da aguardada execução do Anexo I.1.
Estimado no valor total de 3 bilhões de reais, subdividido em 2 bilhões para projetos e demandas das comunidades atingidas e 1 bilhão para crédito e microcrédito, essa fase inicial do Anexo I.1 contará com uma aplicação teste, o chamado projeto piloto do Anexo, que terá a duração de dois anos e um valor de 326,7 milhões destinado à aplicação.
A Entidade Gestora do Anexo I.1 apresentou o plano de execução que ocorrerá em duas grandes ondas, a primeira prevista até maio de 2026, englobando os projetos e linhas de crédito em nível local e regional e a segunda incorporando os projetos de estruturas e demandas locais e inter-regionais.
A cerimônia foi iniciada apresentando a composição da mesa pelas Instituições de Justiça, o juízo e a Entidade Gestora, após esse momento houve um minuto de silêncio pelas 272 joias ceifadas no desastre crime. E seguido houve a assinatura da ata de entendimentos entre IJs e Entidade Gestora de forma simbólica para início do projeto piloto do Anexo I.1.
Durante o evento, os atingidos não foram representados na mesa de cerimônia a partir dessa ausência registrada, o Procurador de Justiça, Paulo de Tarso Morais Filho, fez um mea culpadurante sua fala, salientando que o protagonismo das pessoas atingidas deveria ter uma representação na mesa e que isso não voltará a ocorrer.
“Nós sabemos muito bem que as pessoas jamais terão uma recomposição integral daquilo que foram os danos provocados pelas tragédias, mas nós temos que mitigar esses problemas. E mitigar implica em deixar com que as pessoas participem do processo de reparação e participem ativamente”, afirmou Paulo de Tarso, Procurador de Justiça.
Também foi ressaltado pelas IJs a inovação do anexo, não apenas pela autonomia e o protagonismo delegado às pessoas atingidas, mas por estar sendo colocado em prática um dos maiores, senão o maior projeto de orçamento participativo do mundo.
Para as pessoas atingidas, embora tardio, é com alívio que receberam o tão aguardado início do Anexo I.1, mesmo com as perdas irreparáveis ceifadas pelo desastre crime cometido da Vale.
“Se não fosse pela morte deles (as 272 joias), hoje a gente não estaria aqui. Não teria nada disso aqui… Para eles não tem mais reparação. Acabou. Meu marido hoje completaria 38 anos. Dele foi tirado o direito de estar hoje conosco”, afirma Nayara Porto – presidente da Avabrum

Joceli Andreoli, coordenador do Movimento dos Atingidos por Barragens, rememora o processo de luta e reafirma que o objetivo das pessoas atingidas é a reparação integral.
“O nosso compromisso não é por dinheiro, o nosso compromisso é por reparação coletiva. E esse dinheiro é insuficiente para garantir a reparação coletiva integral, e esse é um desafio muito grande que nós vamos ter. Porque a Cáritas, a Anab o E-dinheiro, junto com os atingidos organizados e as assessorias técnicas, nós e o movimento, teremos que ter a capacidade de fazer esse dinheiro gerar mais dinheiro porque ele é insuficiente para garantir o direito. Não é favor, não é benefício, é direito, e a Vale vai ter que pagar.”

Para Cláudia Saraiva, atingida representante das comissões da R1, o dia foi um marco na história que demarca a participação das pessoas atingidas referente aos projetos e a reparação em cada região. “É um marco na história que os atingidos falem o que eles querem para poder ser reparados numa coletividade. É muito importante a participação de todos que se sente lesado e que tem um projeto pra poder reparar a sua região. A gente tem que fazer dar certo”, enfatiza.
Na mesma linha, Tatiana Rodrigues, da R2, ressalta a relevância simbólica da data, pois percebe que um ponto da reparação está em curso, além de destacar a importância de participar de espaços onde as dúvidas comunitárias podem ser sanadas.
Questões, posicionamentos e dúvidas são apresentados por lideranças atingidas das 5 Regiões

Na segunda parte da solenidade as pessoas atingidas perguntaram, tanto a Entidade Gestora quanto às IJs, acerca das dúvidas elaboradas por suas respectivas regiões. O tempo para o retorno foi muito curto e a EG e as IJs fizeram um apanhado geral das questões realizadas. Pela R1, apresentaram as questões Claudia Saraiva e Maria dos Anjos (Dudu) e Maria Aparecida (Paré) e Valéria Carneiro; já pela R2 as perguntas foram feitas por Canaã da Silva Farias e Natália Freitas.
As perguntas e posicionamentos feitos pelas regiões e 1 e 2 apontaram questões como divisão de recursos de recursos e seus critérios, e que essa definição fosse responsabilidade das Instituições de Justiça levando em consideração o diagnóstico de danos coletivos, e a caracterizações e especificidades das comunidades, a exemplo do tamanho da população na R2 e os agravamentos referentes ao epicentro do rompimento na R1. Questionaram sobre quais são as comunidades elegíveis e quando haverá essa comunicação. Apontaram ainda a preocupação referente a reparação socioambiental e a contaminação dos seus territórios e como isso interfere diretamente na reparação socioeconômica.
Dentre as questões levantadas, destacou-se a necessidade material e financeira das pessoas atingidas na governança popular, já que é uma demanda antiga e que representa o real protagonismo das pessoas atingidas no processo de reparação.
A Entidade Gestora salientou que elaborou um documento de custeio de recursos e salários para os membros do conselho e o enviou para as IJs. Por sua vez, as IJs encaminharam que irão analisar o documento, mas qualquer retorno teria apenas o viés colaborativo, pois o poder sobre gestão, fiscalização e controle dos recursos pertencem somente às pessoas atingidas.
Por fim, a Entidade Gestora demarcou que a prioridade de contratação para os seus postos de trabalho será das pessoas atingidas, formalizado em um edital que também encaminhará os possíveis conflitos de interesses existentes nas proposições de projetos ou linhas de créditos e microcréditos solicitados pelos futuros membros dos conselhos.

Uma outra questão respondida pela Entidade Gestora é a existência de algumas especificidades em Brumadinho na aplicação do Anexo I.1, como os setores dos Familiares de Vítimas Fatais e o da Zona Quente, que são especificidades já garantidas dentro da Proposta Definitiva.
Acerca da Fiscalização e Transparência, a Entidade Gestora apontou que existirá em seu site uma aba disponível, em tempo integral, para prestação de contas. Além disso, na Estrutura de Governança, será criado o Conselho de Transparência Financeira, com a finalidade de detalhar toda a contabilidade do Anexo e da própria Entidade Gestora. Com uma previsão de lançamento contábil trimestral, o Conselho versará sobre o número de projetos contratados; quantos recursos foram gastos para os tais; quantas operações foram feitas de créditos e microcréditos; qual a taxa de inadimplência etc.
Sobre a preocupação em relação ao andamento do Anexo I.1 frente uma letargia do processo de reparação socioambiental, a Entidade Gestora demarcou a relevância da Câmara de Demandas, que junto aos Compromitentes e equipamentos governamentais, tem a propriedade de realizar análises técnicas dos projetos e buscar alguns caminhos para a viabilidade dos mesmos
Com o início da Execução da Proposta Definitiva do Anexo I. 1, a Entidade Gestora irá se organizar para realizar as primeiras inferências no território. E apresentará um cronograma com os próximos passos com e prazos e atividades, além de elaborar um cronograma detalhado para cada região.
Questões apresentadas por representantes da R1
- Haverá remuneração das pessoas atingidas que vão atuar nos conselhos e quando as IJs responderão sobre isso?
- Como está sendo pensada a contratação de pessoas atingidas para os diversos cargos dentro da Governança Popular?
- Como a Entidade Gestora irá garantir que as pessoas atingidas que atuarão como conselheiras poderão também propor projetos e acessar as linhas de crédito e microcrédito?
- Será feita uma organização jurídica dos conselhos? Teremos acesso às atas das reuniões que forem realizadas?
- Como será garantida a segurança (integridade pessoal) das(os) conselheiras(os), diante de um cenário em que nos culparão de qualquer erro que acontecer?
- Seremos respeitados neste anexo da Governança Popular, nosso direito à voz, voto e decisão? A participação dos atingidos no Anexo I.1 não tem sido para tomar decisões. Esse Anexo é nosso. Nós é que iremos definir?
- Quando será disponibilizado um cronograma das atividades das regiões?
- Queremos também respostas dos questionamentos já feitos por ofícios através da nossa ATI AEDAS em várias ocasiões.
- Como as especificidades de Brumadinho serão levadas em consideração na execução do Anexo I.1 e na divisão dos recursos para cada região? Brumadinho é o epicentro do crime continuado, sofre diariamente com os danos do rompimento e com as obras de reparação, que são uma verdadeira destruição.
- Com base em quais critérios será definida a divisão de recursos? É importante que os danos coletivos sofridos e a intensidade deles em cada região sejam considerados como critérios para a divisão dos recursos. As IJs estão distantes das realidades de cada região, seria importante estarem presentes para entender as realidades, perspectivas e as regiões serem ouvidas a partir das suas especificidades. Inclusive não podem ser esquecidas as questões que tocam as categorias sociais vulnerabilizadas, como os PCDs e os PCTs.
- De acordo com a Proposta Definitiva as IJs devem decidir sobre a divisão de recursos e comunidades elegíveis. Quando será decidido pelas IJs? Quem deve decidir sobre a divisão dos recursos são as Instituições de Justiça, e não as pessoas atingidas, pois isso irá tensionar o território em várias proporções, local, regionalmente e entre as demais regiões.
- Por que houve a escolha pelas Instituições de Justiça de que a continuidade das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) fossem custeadas com os rendimentos do Anexo I.1? Esse recurso será devolvido após a auditoria dos R$ 700 milhões das estruturas de apoio?
- Quando as Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) vão apresentar seu Plano de Trabalho referente ao Anexo I.1, e qual será a função delas dentro do Anexo I.1?
- Quando a Entidade Gestora irá iniciar o trabalho no território? Teremos acesso aos contratos e ao Plano de Trabalho da Entidade Gestora do Anexo I.1?
- Como as IJs e a EG irão cuidar para que os valores do Anexo I.1 não sejam destinados para prestação de serviços que devem ser garantidos pelas políticas públicas?
Questões apresentadas pelas pessoas da R2
- Quando as IJs irão definir e informar quais comunidades atingidas da Região 02 serão elegíveis para o Anexo I.1? Como as comunidades atingidas da R2 se organizam diante de uma insegurança por não termos informação se poderemos acessar os recursos do Anexo I.1? Avaliamos que é fundamental para a reparação justa considerar os danos coletivos sofridos na definição de quais são as comunidades elegíveis.
- Gostaríamos de saber das Instituições de Justiça quais serão os critérios para a divisão dos recursos entre as regiões. Os danos coletivos sofridos pelas comunidades atingidas e o tamanho da população atingida de cada região precisam ser considerados para se calcular essa divisão. É uma preocupação porque no PTR a Região 2 ficou prejudicada e pessoas atingidas ficaram sem acesso, o que deixa mais distante da reparação. Não aceitamos que sejam novamente utilizados esses critérios injustos.
- Considerando que as Comissões da R2 avaliam e concordam que não é responsabilidade das pessoas atingidas definir quais comunidades são elegíveis ao Anexo I.1 nem sobre a divisão de recursos e que de acordo com a Proposta Definitiva são as IJs que devem decidir sobre a divisão de recursos e de comunidades elegíveis, quando isso será decidido pelas IJs?
- Na Região 2 já organizamos nossos conselhos locais e já temos nossas propostas de regras. Além disso, é necessário respeitar a organização das pessoas atingidas na instância regional estruturada a partir das Comissões da Região 2. Como a Entidade Gestora vai acompanhar e dar continuidade na organização da Governança Popular do Anexo I.1?
- Como executar os projetos se o território, o solo e a água, ainda estão contaminados? Como faremos os projetos do Anexo I.1 se ainda não temos segurança sobre como está a reparação socioambiental que influenciará as condições para a realização dos projetos do Anexo I.1?
- Entendemos que é importante avançar ao mesmo tempo no processo de implementação do Anexo I.1 e de reparação socioambiental. Nesse contexto atual em que não temos informações seguras e os próprios Estudos de Avaliação de Risco à Saúde Humana e Risco Ecológico nem foram concluídos, não tendo sido plenamente endereçada a contaminação dos territórios, como as Instituições de Justiça vão ajudar nisso?
- Os empréstimos deverão ser pagos no prazo dos dois primeiros anos de execução do Anexo I.1? E os projetos comunitários
- Há alguma resposta sobre como vamos ter garantia de participação real nos espaços com a continuidade da preparação das pessoas atingidas que já vem sendo realizada pelas ATIs? Como as lideranças serão apoiadas para participar efetivamente do Anexo I.1?