A decisão tratou de temas pendentes nos processos judiciais para reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho

Foto da Rua Amianto, em Brumadinho | Felipe Cunha – Aedas

No último dia 24 de novembro, o Dr. Murilo Silvio de Abreu, juiz da 2ª Vara de Fazenda Municipal, que acompanha o caso de reparação dos danos do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, proferiu decisão sobre temas que afetam diretamente o direito das pessoas atingidas da Bacia do Paraopeba e Represa de Três Marias a uma reparação justa e integral. 

A decisão tratou de temas pendentes nos processos judiciais para reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem da Vale, em Brumadinho/MG, como os Estudos de Risco à Saúde Humana e Risco Ecológico (ERSHRE), as Perícias da UFMG em andamento e continuidade do trabalho das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) no que diz respeito às atividades relacionadas ao processo judicial. 

Leia a decisão judicial abaixo

Saiba mais com Gabriela Cotta, coordenadora da equipe de Estratégias Jurídicas da Reparação (EJR), da Aedas Paraopeba:
Perícias da UFMG 

Foto: Equipe de pesquisa do Subprojeto 58 do Projeto Brumadinho UFMG

A decisão traz um breve histórico do processo de criação do Comitê Técnico-Científico que auxilia o juízo no processo, realizando perícias para o levantamento de informações sobre os efeitos pós-rompimento nos territórios atingidos. A execução é realizada pela UFMG após assinatura de um Termo de Cooperação Técnica, que deu origem a uma série de 67 pesquisas de investigação (denominadas chamadas) iniciadas após audiência no dia 05 de março de 2020. 

Após a celebração e pactuação do Acordo Global em 2021, várias dessas chamadas foram extintas ou readequadas. No entanto, em decisão do dia26 de julho de 2022, foi determinado pelo juízo que diversos relatórios finais de chamadas já extintas fossem tornados públicas. A Vale questionou a decisão e manifestou no sentido de não publicação dos resultados, pois seriam perícias extintas. 

Em sua recente decisão, o juiz da 2ª Vara de Fazendas e Autarquias, determinou que “o conhecimento produzido pelo perito do juízo deve se tornar público, acessível às partes, seus assistentes técnicos e à sociedade em geral, dada a gravidade e amplitude dos danos causados pelo rompimento das Barragens B-I, B-IV e B-IVA.” 

Ainda, na exposição de seus motivos, o magistrado apontou que os dados colhidos, os resultados e conclusões podem ser aproveitados no processo de reparação, confirmando o direito de acesso às pesquisas já realizadas, garantindo o direito de acesso e informação às pessoas atingidas. Nesse sentido, a UFMG foi intimada para que informe no processo sobre o estado atual de todos os Subprojetos inicialmente previstos. 

Estudos de Risco à Saúde Humana e Risco Ecológico – ERSHRE 

Foto do Rio Paraopeba | Felipe Cunha – Aedas

A decisão tratou também dos estudos que avaliam o impacto do rompimento à saúde humana e o risco ecológico causado por seus efeitos, elaborado pelo Grupo EPA. Os estudos são para avaliação dos potenciais riscos e, caso necessário, definição de estratégias de acompanhamento de saúde pública.  

Os estudos desenvolvem etapas para levantamento e avaliação da informação do local, levantamento das preocupações da comunidade, geração de dados ambientais, seleção e validação de dados que sirvam de base para quantificação do risco e avaliação da exposição, considerando características específicas de cada população potencialmente exposta, análise de toxicidade detalhada e orientada ao entendimento do risco adicional de efeitos adversos por endpoint no organismo humano, associado a exposição à múltiplos contaminantes. 

O juiz ordenou a apresentação dos projetos/planos dos “Estudos de Risco à Saúde Humana e Risco Ecológico – ERSHRE” pela Vale S/A, bem como determinou a intimação da UFMG após a apresentação dos estudos, com a abertura de um novo procedimento de acompanhamento do ERSHRE. 

Assessorias Técnicas Independentes 

Espaço participativo com Aedas e pessoas atingidas | Foto: Rurian Valentino

O debate sobre a fonte de custeio das atividades desempenhadas pelas Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) vem sendo discutido há bastante tempo no processo e tem efeito na definição de onde devem sair os recursos que pagam as atividades das ATIs para o assessoramento das pessoas atingidas. 

A Vale vem alegando que os recursos pagos às ATIs devem sair de forma integral dos R$700 milhões previstos no Acordo Global, na cláusula 4.4.11, como forma de limitar o alcance das atividades das assessorias técnicas e diminuir o volume de recursos disponíveis para contratação de estruturas de apoio à reparação das pessoas atingidas. 

Acontece que, desde a celebração do referido acordo, as ATIs vêm desempenhando um duplo papel, atuando tanto no acompanhamento das atividades previstas no Acordo, como também nas demais atividades que permanecem sendo tratadas no processo judicial. 

Por esse motivo, as Instituições de Justiça, as pessoas atingidas e as próprias ATIs vêm se posicionando no sentido de que os valores previstos pelo Acordo Global devem ser usados somente para custear as atividades previstas no acordo, sendo de responsabilidade da Vale o pagamento, de forma independente, das demais atividades das ATIs no assessoramento de assuntos relacionados ao processo judicial. 

Esse foi o posicionamento na recente decisão, que confirmou que as Assessorias Técnicas Independentes vêm de fato atuando em atividades para além do acordo e que dizem respeito a temas específicos do processo judicial, como as demandas emergenciais de água e alimentação animal, os danos supervenientes, os estudos de risco (ERSHRE) e perícias, além dos danos individuais.  

Assim, em relação às atividades relacionadas ao processo, foi reconhecida sua importância. Além disso, o juízo de primeira instância reconheceu que “as atividades das ATIs que se relacionam com a reparação dos danos supervenientes, individuais e individuais homogêneos não se submetem à fonte de custeio prevista no acordo (R$ 700 milhões de reais, cláusula 4.4.11)”. 

A decisão ainda destacou que para fins de diferenciar a fonte de custeio, ou seja, o que sai dos R$ 700 milhões do acordo e o que a Vale deve pagar de forma independente, era necessário que fosse feita uma separação através dos Planos de Trabalho das Assessorias Técnicas, o que ocorreu em 09.03.2023.  

Nesse sentido o juízo entendeu que entre a data da celebração do acordo (04.02.2021) até a apresentação dos Planos de Trabalho do Processo (09.03.2023), todos os valores para financiar as atividades das ATIs deveriam mesmo ser descontados da verba prevista na clausula 4.4.11 do Acordo (R$700 milhões de reais). Após a apresentação do Planos de Trabalho do Processo, as atividades realizadas para o processo devem ser pagas pela Vale e as atividades referentes ao acordo continuam a ser paga pelos R$ 700 milhões. Sendo assim, as Instituições de Justiça foram intimadas a se manifestarem sobre os Planos de Trabalho do Processo, para que o juiz possa decidir sobre a sua aprovação, uma vez que a própria Vale já se manifestou.  

Outras determinações 

Juiz Dr. Murilo Silvio de Abreu com lideranças atingidas na 2ª Vara da Fazenda, em Belo Horizonte, no dia 26 de setembro de 2023 | Foto: Felipe Cunha – Aedas

O juiz do caso, Dr. Murilo Silvio de Abreu, determinou ainda que o Banco do Brasil realize uma transferência bancária para repor o saldo da conta judicial criada com finalidade específica de cumprir o disposto no Anexo I.1 do Acordo. 

Outra determinação diz respeito à autorização de “utilização pelas Assessorias Técnicas Independentes do valor já liberado em dez/2022 para as atividades do processo (30% à época)”. 

Por fim, o juiz homologou o Termo de Compromisso assinado entre as Instituições de Justiça e as Assessorias Técnicas Independentes, que contempla as atividades do Acordo, determinando que as Instituições de Justiça informem sobre os valores que devem ainda ser depositados para os Planos de Trabalho do Acordo pela Vale, em conta judicial específica.