Consultoria da Aedas detalha danos à biodiversidade em municípios da Região 2
Junho é o mês da biodiversidade, data em que a Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas) apresentou os resultados relativos ao trabalho da primeira consultoria contratada pela Assessoria Técnica Independente (ATI), que apontou a gravidade dos danos socioambientais à qualidade de vida das pessoas atingidas de Brumadinho, na Região 1 da Bacia do Paraopeba. Agora, a Aedas apresenta também a extensão deste cenário de impactos na biodiversidade dos municípios da Região 2: Mário Campos, São Joaquim de Bicas, Betim, Igarapé e Juatuba.
Os danos levantados e listados nos documentos entregues pela consultoria ambiental GeoEng foram concluídos a partir de dados secundários dos estudos realizados por pesquisadores e pesquisadoras de universidades, monitoramento de órgãos públicos, relatórios de investigações, ONGs e até mesmo estudos encomendados pela Vale. Na síntese destes documentos, a consultoria destacou que, além dos mais evidentes, a identificação de alguns danos demandou a “utilização de equipamentos, análises em laboratórios, utilização de imagens de satélite ou programas específicos de computador.”
Vanessa Sousa, engenheira florestal e técnica da equipe socioambiental da Aedas na Região 2, comenta que, a partir dos resultados da consultoria, é possível avaliar a gravidade dos danos socioambientais, que impactam na qualidade de vida das pessoas atingidas. “Esses resultados servirão para discutir formas de comprovação dos principais danos ainda não confirmados, orientando a construção de um plano de amostragem (indicação de critérios e locais de amostras para análises) que orientarão etapas posteriores no processo global da assessoria”, comentou.
Os resultados identificados pela consultoria foram resumidos em dois documentos sínteses. No primeiro deles, foram detalhados danos que, mesmo possuindo a mesma origem, são mais relacionados ao meio físico, que diz respeito ao espaço que acomoda os seres humanos e demais seres vivos, como as águas, os solos, o ar, a radiação solar etc. Outros, mais relacionados ao meio biótico, que se refere ao conjunto de seres vivos em determinado território e as relações que estes seres estabelecem entre si e ao meio físico. Essa relação é o que resulta nos ecossistemas.

Ao meio físico, o estudo especificou de forma explicativa e didática danos que provocaram alteração das feições fluviais, modificação do fluxo do rio, redução da descarga fluvial, assoreamento do curso d’água, aumento das trocas químicas nos solos e águas, contaminação das águas superficiais , contaminação das águas subterrâneas, perda de qualidade das águas, contaminação dos solos/sedimentos , intensificação dos processos erosivos, mudança no padrão de sedimentação fluvial, aumento da possibilidade de inundações, aumento da pressão sobre os recursos hídricos, diminuição da estabilidade das margens fluviais, entre outros. Já sobre o meio biótico, os detalhes são para os danos que se relacionam com a modificação de habitat, alteração de microbiota aquática, os efeitos toxicológicos em diferentes níveis tróficos, danos à fauna silvestre ou à fauna doméstica, mortalidade de fauna silvestre, danos à flora cultivada, proliferação de vetores e doenças, perda de biodiversidade e outros.
MATRIZ DE SIGNIFICÂNCIA
No segundo documento síntese, foram apresentados os impactos nivelados por uma Matriz de Significância, que busca analisar os danos de forma integrada, considerando aspectos ambientais e sociais. A matriz é composta por uma linha referente a cada dano e uma coluna relacionada a cada serviço ecossistêmico, que são benefícios que o ser humano obtém a partir da relação com a natureza e de suas funções. O relatório dos resultados explica que “essas funções ambientais existem independente das atividades humanas, mas podem ser alteradas e mesmo comprometidas a depender dos danos sobre elas.” Pela Matriz de Significância, a consultoria pôde identificar o grau de significância de cada dano sobre cada serviço ecossistêmico, e os efeitos combinados de diversos danos sobre cada um desses serviços.
A Matriz de Significância contribuiu também para pontuar atributos aos danos que se ampliam de acordo, por exemplo, com o território, renda, intensidade de agropecuária e infraestrutura sanitária das comunidades. O documento síntese demonstra que “os efeitos desses danos sobre o meio ambiente se combinam e se agravam mutuamente, fazendo do evento muito mais que um desastre pontual, mas uma fonte contínua de violações sobre o meio ambiente e as comunidades atingidas.” Por exemplo, as comunidades onde a população é majoritariamente não branca são mais periféricas, com piores condições de renda e saneamento, o que agrava os efeitos dos danos. Os estudos apontam que “aspectos raciais têm influência nos riscos a que são expostas determinadas populações. Isso expressa o racismo ambiental que sistematicamente promove a concentração de não brancos em setores periféricos e rurais, mais vulneráveis aos riscos socioambientais.” Nesse sentido, é fundamental que os processos de recuperação ambiental tenham em conta os efeitos e produtos do racismo ambiental na distribuição das populações pelo território.
Cabe apontar, ainda, que também foram destacadas as especificidades dos efeitos dos danos sobre a realidade das mulheres. Os resultados reafirmam que elas são impactadas de forma mais profunda e têm maiores dificuldades em retomar suas formas de vida, uma vez que são elas as responsáveis pelos cuidados do lar e da família. Assim, danos que aumentam a necessidade de tarefas domésticas ou de cuidados acabam reforçando a carga de trabalho realizada pelas mulheres.
PRÓXIMOS PASSOS
Ainda segundo a técnica Vanessa Sousa, com base nos resultados da análise empreendida nesses estudos, serão apontadas estratégias para a segunda fase do Levantamento de Danos Relativos aos Aspectos Ambientais. “Essa próxima etapa terá atuação de uma nova consultoria que já contará com a indicação de pontos e parâmetros considerados de interesse para a comprovação e melhor caracterização dos danos. Assim, em breve serão realizadas coletas de dados e amostras nas comunidades da Região 2 que trarão resultados a respeito da qualidade de água de poços, cisternas, nascentes, córregos e água para consumo humano e dessedentação animal, além da qualidade do solo e contaminação de animais aquáticos.” E conclui que “os dados produzidos a partir das amostragens e análises sugeridas permitirão avançar na identificação e caracterização dos danos socioambientais decorrentes do desastre e seus efeitos na vida das pessoas atingidas.”
Em paralelo ao levantamento de danos Fase 2, serão realizados também estudos sobre a recuperação do Rio Paraopeba, afluentes e águas subterrâneas e sobre as áreas degradadas em decorrência do rompimento da barragem, ambos construídos de forma participativa com as comunidades atingidas.