A Comissão de Atingidos e Atingidas de Itatiaiuçu assinou, no dia 28 de maio de 2025, como anuente, o Segundo Termo de Acordo Complementar (TAC 2). O TAC também foi assinado pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual, como compromitentes, e pela mineradora ArcelorMittal, como compromissária, que é a responsável pelos danos causados, e contou ainda com a anuência do Município de Itatiaiuçu. O acordo foi assinado no Ministério Público Federal (MPF), em Belo Horizonte, com a participação do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), da mineradora ArcelorMittal, do Município de Itatiaiuçu, da Comissão Representativa dos Atingidos e Atingidas, da Aedas e do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).

Foram mais de 4 anos na mesa de negociação para se chegar a este acordo, desde a assinatura do Primeiro Termo de Acordo Complementar (TAC 1), em 2021. Em 2023 foi assinado o Termo de Acordo Preliminar ao Segundo Termo de Acordo Complementar (TAP 2), que estabeleceu o valor de R$436 milhões de reais para a reparação coletiva, sendo R$300 milhões de “valor novo” para as medidas de reparação, que ainda seriam depositados. Após a assinatura do TAP, as negociações continuaram no intuito de descrever detalhadamente as obrigações, os fluxos e os princípios para a execução das medidas de reparação coletiva.

O TAC 2 consolida e registra o resultado dessas negociações, determinando a forma como a mineradora deve reparar os danos causados à coletividade. O acordo prevê como será a execução das 65 medidas de reparação propostas pelas comunidades atingidas, garante a continuidade da Assessoria Técnica Independente no apoio e orientação no processo de reparação, além de assegurar a contratação de entidades independentes para gerir e auditar a execução das medidas de reparação coletiva.

O acordo ainda inclui o reconhecimento formal de responsabilidade e o pedido de desculpas público da mineradora ArcelorMittal pelos danos causados pelo acionamento do PAEBM no dia 08 de fevereiro de 2019 às comunidades de Itatiaiuçu.

Leia o acordo na íntegra:

Participação Informada e Protagonismo Efetivo

A participação informada, efetiva e a construção coletiva, colocam o processo de Itatiaiuçu como um exemplo de habilidade e sabedoria dos atingidos e atingidas na construção da reparação. Desde o acionamento do PAEBM em 2019, com a assessoria da Aedas, as comunidades atingidas participaram ativamente das reuniões, do levantamento dos danos, da construção das medidas de reparação, das tomadas de decisões e dos caminhos que a reparação deveria seguir para, de verdade, alcançar uma reparação que tivesse as pessoas atingidas na centralidade do processo.

“Foram anos de luta, diálogo, entrega, aprendizado”, como explica a atingida e representante da Comissão, Luzia Soares: “Não foi fácil chegar até aqui. Foram vários e vários dias de luta. O Ministério Público aceitou pessoas normais que são atingidos, sentar na mesa, negociar, guardar a sua dor e falar da dor das mais de 1000 famílias que ficaram para trás”.  Patrícia Odione, também atingida e membro da Comissão, afirmou que o processo de negociação do TAC 2 fez com que ela tivesse um crescimento pessoal e ressaltou que a assinatura do TAC é apenas o início de uma nova etapa em busca da reparação.

A assinatura do acordo, segundo o atingido e membro da Comissão, Ezequiel Matias, simboliza a luta das pessoas atingidas e traz a voz do povo para a justiça: “O TAC 2 representa a luta dos atingidos de Itatiaiuçu, para que a reparação seja o melhor possível, para conseguir trazer também a voz do povo pra justiça. Este é o segundo TAC que assinamos.  A ansiedade agora é começar a implementar as medidas”. Já José Roberto Pereira Cândido, o Zezé, ressaltou que a participação do povo atingido traz melhorias ao processo de reparação: “A gente fez diferente e é  bom mostrar para a sociedade que a gente teve um espaço garantido e que não foi um atraso no processo, foi um avanço e uma conquista grandiosa”.

Sônia Mara Maranho, da coordenação nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), sublinhou o caráter histórico do acordo e reafirmou o compromisso do movimento em continuar cobrando a reparação e o cumprimento do TAC 2. 

Amanda Naves Drummond, coordenadora-geral da Aedas em Itatiaiuçu, comentou sobre a importância das conquistas coletivas, mas também ressaltou o duro caminho que as comunidades atingidas tiveram que trilhar para conseguir esse acordo: “Não é com ingenuidade que pensamos assim e tampouco acreditamos que é com ingenuidade que os atingidos e as atingidas encaram essa vitória. Há muito sofrimento neste processo e há muito amor também. Se não fosse o profundo amor que cada membro da Comissão tem pela sua comunidade, nós não chegaríamos até aqui”. 

O Procurador da República, Felipe Augusto de Barros Carvalho Pinto, também comentou sobre a experiência: “As pessoas atingidas participaram desde o início da negociação com a autonomia, com o protagonismo, com a centralidade de maneira esclarecida, de maneira informada. O Ministério Público Federal participou desse processo junto com o Ministério Público Estadual e sai extremamente enriquecido pela participação dos atingidos, pela participação da Aedas e pela participação do MAB”, afirmou. 

Do mesmo modo, o procurador mostrou expectativa na execução do TAC 2, no intuito de melhorar a vida das pessoas atingidas de Itatiaiuçu e reforçou o compromisso com a reparação: “A gente espera que se concretize as medidas de reparação que terão por objetivo diminuir os danos causados, transformar a vida das comunidades atingidas para que a gente tenha uma situação melhor. Nisso tudo, o engajamento dos atingidos contando com a Assessoria da Aedas é fundamental e o Ministério Público Federal conta com isso para continuar desenvolvendo esse processo de reparação”, explicou.

A Promotora de Justiça, Shirley Machado, ainda destacou como a participação das comunidades trouxe criatividade ao processo: “As pessoas estavam sempre à mesa, apoiadas pela Assessoria Técnica, com apoio também do Movimento de Atingidos por Barragem. E isso fez com que ideias criativas, com construções muito maduras fossem feitas. Como a própria construção dos planos de reparação integral que as comunidades construíram a partir de diversas reuniões, com apoio e organização da Assessoria Técnica. Para que agora a gente tenha medidas claras e que este recurso seja destinado também no processo de construção participativa, de diálogos, de criação de consensos. A gente entende que tem que ser cumprido nesse processo o que estabelece a lei de atingidos por barragem, de que as pessoas participem do processo e da construção das medidas. Isso deve ser efetivado cada vez mais, para que a gente tenha reparações sempre justas e respeitando a centralidade das pessoas como autoras do seu destino, autoras desse processo de reparação”, concluiu Shirley Machado. 

Próximos passos

Com a assinatura do TAC 2, a reparação às comunidades atingidas entra em uma nova fase: a construção dos Planos Populares, que são documentos que apresentam como as comunidades atingidas querem que sejam executadas cada uma das medidas de reparação. Os Planos Populares já estão sendo elaborados de forma participativa junto às comunidades e detalham cada medida proposta.

Também ficou assegurada a contratação de auditorias finalística e financeira independentes, a contratação de uma secretaria do processo de reparação coletiva, que ficará responsável pela transparência e publicidade das informações, e, ainda, de uma entidade gestora independente da mineradora, que será responsável por garantir a execução de parte das medidas de reparação. Além disso, para acompanhar a execução das medidas ficou acordada a criação de um Comitê Local de Gestão e Monitoramento, que será composto por seis representantes das comunidades atingidas, uma pessoa da sociedade civil membro de movimento de atingidos por barragem, dois representantes do Município de Itatiaiuçu, dois representantes da ArcelorMittal e duas pessoas representando a Entidade Gestora Independente. 

O acionamento do PAEBM em Itatiaiuçu

Na madrugada do dia 08 de fevereiro de 2019 os moradores das comunidades de Pinheiros, Vieiras e Lagoa das Flores, no município de Itatiaiuçu, foram surpreendidos com o anúncio do risco de rompimento na barragem da Mina de Serra Azul, da ArcelorMittal. Foi acionado o Plano de Ação e Emergência para a Barragem de Mineração (PAEBM) e a área que seria atingida pela lama de rejeito foi interditada e mais de 90 famílias tiveram que sair de suas casas e passaram a viver em casas provisórias. 

Em Maio de 2019, os atingidos e atingidas escolheram a Aedas para prestar Assessoria Técnica Independente (ATI) em Itatiaiuçu. O processo de reparação foi construído pelos atingidos e atingidas, acompanhados da Assessoria Técnica Independente da Aedas, por meio de escuta e diálogo com as comunidades. 

Em 2021 foi assinado o Primeiro Termo de Acordo Complementar (TAC 1) que previu diretrizes para a reparação individual e a matriz de danos com valores para cada tipo de dano.  Já em 2023 foi assinado o Termo de Acordo Preliminar ao Segundo Termo de Acordo Complementar (TAP 2), que estabeleceu as bases e os princípios para se chegar ao documento final do TAC 2.