Na tarde da última sexta-feira (11), a Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas) participou de um seminário sobre o pagamento emergencial, agora definido como “Auxílio Econômico Provisório”. Na atividade, as Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) apresentaram a fundamentação técnica dos novos critérios propostos pelas pessoas atingidas em processos participativos.

O pagamento emergencial mensal, concedido em virtude do rompimento da barragem da Vale em Brumadinho, é uma medida mitigatória para aliviar os danos econômicos das famílias atingidas. O critério territorial, definido em função da calamidade, teria continuidade até outubro de 2020 e há indicativos de que possa deixar de ter validade.

Além da Aedas, que assessora as regiões 1 (Brumadinho) e 2 (Betim, Juatuba, Igarapé, Mário Campos e São Joaquim de Bicas) também apresentaram seus levantamentos de danos e proposições de novos critérios as outras Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) da Bacia, o Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (Nacab) e o Instituto Guaicuy.

O seminário aconteceu em formato de live no Youtube e foi organizado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas de Gerais (PUCMG) que atua como Coordenação Metodológica Finalística (CMF) do projeto Paraopeba. O seminário também contou com a participação das Instituições de Justiça (IJS).

Agora, as propostas de novos critérios categorizadas pelas três ATIs serão avaliadas pelas Instituições de Justiça (Defensoria Pública e Ministério Público). Estas instituições vão elaborar um documento que será encaminhado ao juiz Elton Nogueira até o dia 25 de setembro. A palavra final sobre os novos critérios será dada pelo juiz.

Região 1

A Aedas iniciou sua apresentação sobre a Região 1 – Brumadinho – com um vídeo com depoimentos de três atingidas, Maria dos Anjos, Valéria da Silva e Sara Cristina, que relataram alguns dos impactos do rompimento em suas vidas. “A gente devia estar tomando providências pra cuidar da saúde, do lazer, da qualidade de vida, mas nem pra isso tenho forças. O emergencial seria pra isso: cuidar da saúde, comprar medicamentos, ir ao médico. Porque a capacidade pra trabalhar acabou. Então vai levar um pouco pra recompor”, desabafa Maria dos Anjos.

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Região 2

Luiz Ribas, da coordenação institucional da Aedas na região 2, iniciou a apresentação sobre os novos critérios – que foram propostos pelas próprias pessoas atingidas nos espaços participativos e sistematizados pela equipe técnica da Aedas – afirmando que, nesse trabalho, a Associação teve a oportunidade de encontrar histórias marcantes, que sensibilizaram as/os profissionais.

Ele também ressaltou que o que foi apresentado no seminário também havia sido compartilhado com os atingidos e as atingidas na Roda de Diálogo sobre o emergencial, que aconteceu na última quarta-feira (9).

Desde abril, a Aedas deu início a construção de um banco de dados com contatos de pessoas identificadas como atingidas. Essas pessoas foram convidadas para participar dos espaços de diálogo promovidos pela Associação. O banco de dados segue em construção, mas já conta com mais de 7 mil contatos.

“Basicamente, temos dois instrumentos de pesquisa e participação. O primeiro é o Registro Familiar, que é um questionário, uma entrevista em profundidade. Com ele buscamos fazer uma conversa individual para que a pessoa reconheça seus danos no contexto do desastre sociotecnológico”, explicou o coordenador institucional.

Confira mais detalhes sobre a apresentação da Região 2 aqui.

Região 3

O Núcleo de Assessoria às Comunidades Atingidas por Barragens (NACAB), que assessora as comunidades atingidas no percurso de 10 municípios e 180 km da calha do Paraopeba (Esmeraldas, Florestal, Pará de Minas, Fortuna de Minas, São José da Varginha, Pequi, Maravilhas, Papagaios, Caetanópolis e Paraopeba), expôs seu levantamento de dados a partir de uma abordagem qualiquantitativa, tendo como base a metodologia do Diagnóstico Rápido Participativo (DRP). A assessoria relatou que, em uma primeira etapa, fizeram o planejamento de uma equipe multidisciplinar, construindo atividades remotas.

A ATI promoveu três rodadas de reuniões de DRP com as comissões de atingidos da Região 3, baseadas em metodologias da Educação Popular. O Nacab mencionou que o trabalho começou com muito entusiasmo, e na última etapa do DRP a assessoria passou por situações adversas, que não os desanimou.

Ângela Rosane de Oliveira, Gerente de Participação e Engajamento do Nacab, ressaltou que as pessoas atingidas demonstraram interesse na discussão sobre o pagamento emergencial, e em fazer o “dever de casa”, contribuindo com o relato sobre o dia a dia nos últimos 550 dias após o rompimento da barragem da Vale.

Maria Cecília Alves, especialista de Participação e Engajamento do Nacab, destacou que muitas pessoas atingidas relatam dificuldades de formas de comprovação para acessar o pagamento emergencial. “A partir de uma chuva de palavras que fazemos, as pessoas da região 3 costumam dizer que o critério de 1km não atende, que falta isonomia no tratamento das pessoas atingidas, que ele gera conflitos e é injusto. Também gera dúvidas: quem vai conferir as comprovações, quem fará os registros?”, explicou, fazendo referência à autonomia da Vale em cobrar e examinar a documentação e determinar quem deve ou não receber o auxílio.

O Nacab descreveu 3 comprometimentos econômicos que podem contribuir paraconsolidação de critérios, que seriam: 1) a atividade econômica e a qual setor a pessoa atingida está atrelada; 2) a posição da ocupação, a partir de uma perspectiva ampla do que é ser trabalhador(a) e 3) a relação com a terra; entendendo aí também os locatários, arrendatários, os ocupantes e caseiros.

Outros critérios prioritários seriam a relação com a margem do rio, a pesca, o uso da água, a saúde, os modos de vida e as atividades de lazer; uma vez que todas essas dimensões foram reduzidas ou interrompidas.

De acordo com a assessoria, o critério de 1 km da calha do rio é arbitrário; e quanto à necessidade de comprovação, Nacab defende a inversão do ônus da prova. “Se a vítima é a pessoa atingida, ela não deve comprovar nada. A Vale, sendo ré, é quem deve comprovar que não houve o dano”, defende Maria Cecília, colaboradora da região 3, apontando também para as possibilidades de comprovação por meio de validação coletiva, declarações e laudos técnicos.

Regiões 4 e 5

A apresentação da construção de critérios para o auxílio econômico provisório referente às Regiões 4 (Pompéu e Curvelo) e 5 (São Gonçalo do Abaeté, Felixlândia, Morada Nova de Minas, Biquinhas, Paineiras, Martinho Campos, Abaeté e Três Marias), foi realizada pelo Instituto Guaicuy, que presta assessoria técnica independente a essas duas regiões.

Logo de início, foi justificado que o mecanismo de dano é sistêmico e se propaga temporalmente e geograficamente e que, apesar do epicentro ter sido a cidade de Brumadinho, há um processo de ampliação desses danos ao longo do território da Bacia Hidrográfica. Além disso, os danos não se limitam ao corpo hídrico, mas irradiam para dentro dos municípios afetados. Foi salientado, ainda, o impacto da pandemia nas comunidades, o que, junto ao rompimento da barragem, potencializa um processo de vulnerabilidade das famílias.

O Instituto Guaicuy relatou que tem sido utilizada uma abordagem ecossistêmica dos resultados da contaminação do rio Paraopeba, levando em consideração as condições de vida e saúde, biodiversidade, relação de trabalho e produção, relações socioambientais, história, cultura e pertencimento. Para a ATI, processo é complexo e sinérgico, resultado de um somatório de efeitos ambientais, econômicos, sociais e de saúde.

Para a definição dos critérios do Auxílio Econômico Provisório, foi apresentada uma tese ecossistêmica, tendo em conta: 1) Percepção do dano ambiental (contaminação dos recursos hídricos, insegurança sobre a qualidade da água e do solo, etc.); 2) Restrições nas Cadeias de Valor (pesca e piscicultura, turismo e lazer e agropecuária); 3) Vulnerabilidade social e de saúde (danos físicos, mentais, sociais e ambientais). O principal instrumento metodológico utilizado pela ATI são os Diagnósticos Rápidos Participativos (DRPs) (foram 16 realizados), além de Rodas de Conversa Temáticas, Acolhimentos Interdisciplinar e Trabalhos de campo.

Em relação aos desafios do Auxílio Econômico Provisório, a ATI Instituto Guiacuy salientou os seguintes pontos: 1) Vencer o passivo do pagamento emergencial, contemplando todos que tinham direito e não receberam; 2) Defesa de que a comprovação das perdas referentes às categorias apresentadas é de natureza coletiva; 3) Garantir a aprovação em juízo dos critérios e formas de comprovação elaboradas pelas pessoas atingidas e; 4) Estabelecer transparência nas inscrições na plataforma da Vale S/A, bem como obrigatoriedade de registro dos documentos apresentados.