As perspectivas indicam que a execução dos projetos dos Anexos I.3 e I.4 será iniciada em 2025

Quilombo Marinhos, em Brumadinho | Foto: Felipe Cunha – Aedas

Após a consulta popular específica para os Povos e Comunidades Tradicionais (PCT), realizada em 2022, o Comitê Pró-Brumadinho divulgou, em março de 2023, os projetos dos Anexos I.3 e I.4 de reparação socioeconômica. Esses projetos foram pré-selecionados pelos Compromitentes para cada município e validados pelos Povos e Comunidades Tradicionais.

Em 2024, em Brumadinho, Região 1, entrou na fase de detalhamento o projeto que prevê a construção de quatro Centros Culturais para as comunidades quilombolas de Marinhos, Ribeirão, Rodrigues e Sapé. Esses centros visam o fortalecimento institucional e fomento às diversas formas de expressão cultural local para geração e circulação de renda nestas comunidades tradicionais quilombolas de Brumadinho.

Na Região 2, os povos e comunidades tradicionais, com suporte da Assessoria Técnica, finalizaram, em setembro de 2023, a elaboração de documentos orientativos. Estes documentos, que estabelecem diretrizes para a execução dos projetos em colaboração com as 14 Unidades Tradicionais Territoriais (UTTs) dos Povos e Comunidades Tradições de Matriz Africana (PCTRAMA), tiveram como principais temas Segurança Hídrica, Segurança alimentar e Cultura. Os projetos têm o objetivo de garantir acesso à água através da aquisição e instalação de caixas de água nas Unidades Territoriais Tradicionais, fortalecer práticas alimentares da segurança alimentar e estruturar Centro Cultural de referência para o PCTRAMA.

Os Povos e Comunidades Tradicionais selecionadas para receber os projetos são:

Brumadinho

PROJETO | Programa de fortalecimento institucional e fomento às diversas formas de expressão cultural local para geração e circulação de renda nas comunidades Quilombolas e demais comunidades da região de Brumadinho.

  • Quilombo de Marinhos
  • Quilombo de Ribeirão
  • Quilombo de Sapé
  • Quilombo de Rodrigues

Betim

PROJETO | Garantia de acesso a água aos PCTRAMA

  • UTT Centro Espírita Umbandista São Sebastião e Santa Bárbara
  • UTT Tenda de Preto Velho Luz de Aruanda

Igarapé

PROJETO | Construção de Centro Cultural de Referência para o PCTRAMA

  • UTT Ilê Axé Palácio de Oxóssi (Projeto convertido)

Juatuba

PROJETO | Garantia de acesso a água aos PCTRAMA.

  • UTT Terreiro Vovó Maria Conga
  • UTT Nzo Atim Oya Oderim – Nzo Atim
  • UTT Ilê Olu Ayê
  • UTT Ilê Axé Alá Tooloribi
  • UTT Ilê Axé Baba Odé Orum Omi

Mário Campos

PROJETO | Fortalecimento das Práticas Alimentares dos PCTRAMA.

  • UTT Aldeia de Canjira

Mateus Leme

PROJETO | Garantia de acesso a água aos PCTRAMA.

  • UTT Associação Cultural e Tradicional de Matriz Africana Bakise Mona Ixi
  • UTT Bakise Bantu Kasanje
  • UTT Nzo Nguzu Kukia

São Joaquim de Bicas

PROJETO | Garantia de acesso a água aos PCTRAMA.

  • UTT Tenda Espírita Cabocla Janaína
  • UTT Centro Cultural e Religioso Ile D’Loyá

Povos e Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA) | Foto: Felipe Cunha – Aedas

Os projetos escolhidos pelos Povos e Comunidades Tradicionais (PCT) passarão por várias etapas até serem efetivamente implementados nas Comunidades Quilombolas (R1) e Unidades Territoriais Tradicionais (R2). Durante o ano de 2024, foi iniciado o processo de detalhamento dos projetos de reparação socioeconômica previstos nos Anexos I.3 e I.4, direcionados a esses povos e comunidades. Atualmente os projetos continuam na fase de detalhamento e consulta.

O Formulário de detalhamento de iniciativa (FDI), que é um planejamento que ocorre antes do início da execução, é realizado pela Vale. A empresa possui a obrigação de execução destas iniciativas após a autorização para início, concedida pelos Compromitentes – Governo de Minas, Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), Ministério Público Federal (MPF) e Defensoria Pública de Minas Gerais (DPMG).  

A responsabilidade pelo detalhamento dos projetos está a cargo da Vale. A fase de detalhamento com os PCTRAMA, na região 2, deu início em 08 de novembro de 2023, nas UTTs contempladas. É papel da ATI mediar as agendas entre Vale e as lideranças das UTTs, além de acompanhar as reuniões para dar apoio técnico às comunidades.

A empresa poluidora Vale deveria entregar, dentro de um período de 90 a 180 dias, um planejamento que inclua o escopo, o cronograma, estimativas de custos, análise de riscos, resultados almejados, indicadores de progresso, metas estabelecidas e marcos para a entrega dos projetos.  

Entretanto, em resposta ao ofício enviado pela Aedas no dia 14/10/2024, que questionava o cumprimento desses prazos a empresa informou que os Compromitentes deliberaram pela suspensão dos prazos em projetos com especificidades, como aqueles que envolvem agendas com comunidades, para evitar o consumo do prazo regular. Com isso, todas as iniciativas tiveram os prazos prorrogados. A empresa ainda não indicou a situação atual, a data de início da suspensão e os prazos vigentes.

            Em 25/10/2024, os Compromitentes reafirmaram que, conforme a cláusula 5.3.4 do AJRI, o prazo para o detalhamento das iniciativas pode ter duração máxima de 270 dias. Adicionalmente, em 24 de maio de 2024, os Compromitentes firmaram entendimento de que, exclusivamente para os projetos detalhados no âmbito da Consulta Popular com PCTs, e considerando a necessidade de devolutiva dos detalhamentos às comunidades participantes, o prazo de 90 dias poderá ser temporariamente suspenso nas seguintes condições:

 1. Nos casos em que houver necessidade de revisão do detalhamento, o prazo será suspenso entre o envio da prévia de detalhamento pela Vale S.A. e o retorno pelos Compromitentes, encaminhado pela Secretaria Executiva, sobre os cenários a serem criados com base na disponibilidade orçamentária definida para a respectiva iniciativa;

2. Nos casos em que houver autorização dos Compromitentes, encaminhada pela Secretaria Executiva, para prosseguimento à conclusão do detalhamento, o prazo será suspenso entre o envio da prévia de detalhamento pela Vale S.A. e a reunião de devolutiva com a respectiva comunidade;

3. Os casos que não se enquadrarem nas hipóteses acima deverão ser analisados e deliberados pelos compromitentes. Após o processo de detalhamento, os projetos serão submetidos para uma nova avaliação pelos compromitentes, sendo encaminhados para a auditoria socioeconômica realizada pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). 

Esta auditoria tem a função de verificar se a estruturação dos projetos está em conformidade e se os custos e prazos propostos estão alinhados com os padrões de mercado. Se a auditoria da FGV emitir um parecer positivo, indicando que os projetos são tecnicamente e financeiramente viáveis, as autorizações para início poderão ser concedidas.

Atividades realizadas pela Assessoria Técnica Independente (ATI):

Povos e Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA) | Foto: Felipe Cunha – Aedas

Nesse ano, 2024, na R1, foram acompanhadas 15 reuniões relativas aos projetos das Comunidades Quilombolas, sendo:

  • 08 Acompanhamento das etapas de construção da Formulário de Detalhamento de Iniciativa
  • 06 Visitas técnicas com as Comunidades Tradicionais referentes as demandas dos projetos
  • 06 Elaborações de relatórios para as Comunidades Tradicionais a partir das visitas técnicas

Para R2, em 2024, foram acompanhadas 34 reuniões relativas aos projetos das Unidades Territoriais Tradicionais, sendo:

  • 30 Acompanhamento das etapas de construção da Formulário de Detalhamento de Iniciativa
  • 04 Visitas técnicas com as Comunidades Tradicionais referentes as demandas dos projetos
  • 04 Elaborações de relatórios para as Comunidades Tradicionais a partir das visitas técnicas

Além disso, foram enviados 41 ofícios, dos quais 16 abordaram demandas dos Quilombos da R1 e 25 as demandas das UTT da R2.

Desafios:

Foto: Felipe Cunha – Aedas

A conquista da Consulta Pública de Priorização dos projetos dos Anexos I.3 e I.4, específicos para Povos e Comunidades Tradicionais, destaca a importância dessas comunidades no processo de reparação. Reconhecem-se, assim, seus direitos e especificidades culturais, visando assegurar que as medidas de reparação considerem as necessidades e particularidades socioeconômicas desses grupos, que frequentemente enfrentam vulnerabilidades históricas e socioambientais. Além disso, o Acordo (cláusula 11.11) enfatiza, a participação ativa dessas comunidades na elaboração e execução de políticas de reparação, garantindo que suas vozes sejam ouvidas e que suas práticas e saberes tradicionais sejam preservados e respeitados por meio de consulta prévia, livre e informada.

Para promover uma reparação mais justa e inclusiva, que efetivamente atenda às demandas dessas populações, é necessário enfrentar os principais desafios para a implementação dos projetos dos Anexos 1.3 e 1.4. Esses desafios incluem o não cumprimento dos prazos estabelecidos, a necessidade de adaptações dos projetos em função das limitações financeiras e as contrapartidas propostas pela empresa Vale S.A. que impõem grande responsabilização às comunidades pelos danos causados durante a execução dos projetos, por exemplo. Além disso, há o descumprimento das tratativas referentes ao respeito aos Povos e Comunidades Tradicionais, além da falta de transparência em relação aos prazos e orçamentos dos projetos.

As comunidades tradicionais têm expressado preocupações legítimas sobre a transparência e a eficácia das ações compensatórias propostas, uma vez que, frequentemente, essas contrapartidas não parecem atender às necessidades reais da população local. Além disso, a inviabilidade técnica e financeira mencionada pela Vale S.A. como justificativa para a não implementação de ações mais alinhadas à realidade local carecem de embasamento técnico robusto. A ausência de estudos detalhados e fundamentados que comprovem a viabilidade das propostas levanta dúvidas sobre as compensações oferecidas.

Garantir a participação efetiva das comunidades nos projetos de reparação socioeconômica é fundamental para o sucesso e a sustentabilidade dessas iniciativas. É crucial manter a transparência em todas as ações, compartilhando informações de forma nítida e acessível. Isso inclui a divulgação de cronogramas, orçamentos, relatórios de progresso e quaisquer mudanças nos planos. Além disso, é essencial respeitar e incorporar os conhecimentos tradicionais e culturais das comunidades nos projetos, garantindo que as soluções sejam culturalmente apropriadas e aceitas; e reflitam as perspectivas e modos de vidas destes povos. Incluir as comunidades no monitoramento e avaliação dos projetos permite que elas forneçam feedback contínuo e façam ajustes conforme necessário, assegurando que os projetos atendam às suas necessidades e expectativas.

Próximos passos:

Quilombo Ribeirão, em Brumadinho | Foto: Felipe Cunha – Aedas

As perspectivas indicam que a execução dos projetos dos Anexos 1.3 e 1.4 será iniciada em 2025, possibilitando que os Povos e Comunidades Tradicionais recebam os projetos destinados a eles. Espera-se também um aumento na transparência ao longo de todo o processo, incluindo a divulgação dos cronogramas e o envio dos projetos executivos, o que permitirá que as comunidades participem de forma mais efetiva nas reuniões.

Na etapa de execução das obras é fundamental que sejam contratadas empresas certificadas, treinadas e com histórico de serviços realizados em conformidade legal, validadas pelas comunidades. Essas empresas devem apresentar cronogramas e previsões de execução das obras, realizando consultas para respeitar o modo de vida e o calendário tradicional, religioso e festivo das comunidades tradicionais. Além disso, a contratação de pessoas das comunidades deve ser validada pelas lideranças locais. A empresa contratada deve respeitar os modos de vida tradicional, evitando gerar ônus ou responsabilização indevida as pessoas atingidas.

A Vale S.A. deve promover um diálogo contínuo e construtivo com as comunidades, adotando uma abordagem colaborativa para estabelecer estratégias que garantam a preservação dos objetos e espaços sagrados durante a execução das obras. É essencial que a empresa reconheça a importância cultural, tradicional e espiritual desses locais, implementando medidas que respeitem e protejam suas tradições. A empresa deve assumir a responsabilidade por quaisquer danos que possam ser causados a esses patrimônios, comprometendo-se a buscar soluções e reparações adequadas para preveni-los e mitigá-los, fortalecendo a confiança e o respeito mútuo com as comunidades envolvidas.

Por fim, é esperado que sejam seguidos os regramentos básicos estabelecidos pelo Protocolo de Consulta dos Povos e Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA), pelo Protocolo de Consulta Prévia, Livre e Informada para o Trabalho de Reparação Integral Comunidades Quilombolas de Brumadinho, pela Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), pelo Decreto nº 6.040 de fevereiro de 2007, pela Lei nº 21.147 de 14 de janeiro de 2014, bem como pelas normas do Direito do Consumidor e do Direito Civil, na medida aplicável.

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