ATIs e lideranças atingidas contestam projeto de lei do governo de MG em audiência pública na ALMG
O Projeto de Lei (PL) 2.508/21, de autoria do governador Romeu Zema, foi tema de discussão numa audiência pública convocada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na manhã da última sexta-feira (25). Durante o debate, lideranças de comunidades atingidas das regiões da Bacia do Paraopeba, movimentos sociais e representantes das Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) denunciaram os riscos do PL que autoriza a utilização dos recursos do acordo judicial para a reparação dos danos causados pelo rompimento da barragem da Vale em Brumadinho.
A deputada estadual Beatriz Cerqueira (PT), responsável por convocar a audiência, destacou que a necessidade do debate público sobre o PL é consequência da exclusão das pessoas atingidas e do legislativo no processo de negociação sobre os recursos previstos no acordo. “O projeto de lei versa sobre R$11 bilhões e o destino desse recurso é o que precisa estar em discussão para garantir uma fiscalização e o controle pela população”.
Além dos apontamentos feitos pela deputada, o PL ameaça também a garantia do direito às ATIs e, consequentemente, do direito de participação informada e a centralidade do sofrimento das vítimas, como detalhou Ísis Táboas, da coordenação institucional da Aedas. “O objetivo é retirar parte da verba destinada às assessorias técnicas e entregar esse dinheiro às estruturas do próprio Estado. Não é aceitável que o pagamento dessas estruturas retire mais direitos da população atingida. Sem as ATIs, as pessoas atingidas não têm condição de participar do processo em pé de igualdade com a empresa que está do outro lado do processo”. Ísis declarou ainda que “por ferir os direitos de toda a população atingida no Paraopeba, este projeto de lei não tem o apoio da Aedas.”
A moradora da zona rural de Brumadinho Fernanda Perdigão, que integra a Comissão de Atingidos e Atingidas e o Comitê Popular da Zona Rural de Brumadinho, relatou algumas violações de direitos diárias nas comunidades e denunciou que nem o acordo nem PL prevêem a garantia de não repetição. “Somos revitimizadas por diversas ações, desde o rompimento da barragem, e fico espantada com a capacidade do governo de Minas em construir uma realidade paralela à realidade das famílias atingidas que lutam por justiça”, falou na audiência.
RECURSOS PARA OBRAS DO RODOANEL
Uma das previsões de uso destes recursos são as obras do rodoanel, que também receberam críticas da parlamentar e das lideranças atingidas presentes na audiência. O bispo auxiliar da Arquidiocese de Belo Horizonte, dom Vicente de Paula Ferreira, disse que há risco de políticos usarem essa parcela dos recursos, prevista no projeto de lei, para se promoverem em campanhas eleitorais em 2022 e apontou que “causa indignação saber que essa pequena parcela de dinheiro paga pela Vale vai também servir à ela.”
Já o Movimento dos Atingidos e Atingidas por Barragem (MAB) chamou a atenção de parlamentares para a possibilidade de serem feitas alterações no projeto de lei com emendas que podem excluir as obras do Rodoanel. “Nós defendemos que o dinheiro proposto para o rodoanel seja depositado em um fundo social de controle popular, para a população escolher onde precisa investir, seja na saúde, na mobilidade, na educação e na defesa das comunidades tradicionais”, declarou Joceli Andreoli, dirigente do movimento.
Em acordo com a proposta do MAB, Joelisia Feitosa, que é representante da Comissão de Atingidas e Atingidos do Satélite, em Juatuba, recusa que os recursos sejam destinados ao benefício próprio da Vale e também propõe uma alternativa. “Os recursos precisam ser destinados à assistência social para as vítimas que estão em vulnerabilidade, à fiscalização da exploração do minério em nossa região e à manutenção das Assessorias Técnicas Independentes”, concluiu.
O projeto de lei ainda tramita no legislativo e, segundo a deputada Beatriz Cerqueira, outras audiências públicas serão convocadas para que sejam recebidas propostas de alteração no documento.