Recurso da Aedas para habilitação no edital foi negado sem ter os fundamentos avaliados, em expressa violação à segurança jurídica e ao direito das pessoas atingidas

Foto: Nívea Magno

Ontem, 04/12, as Instituições de Justiça (IJs) realizaram uma live de apresentação das entidades habilitadas no Edital de Chamamento Público para contratação de nova Assessoria Técnica Independentes para as Regiões 1 e 2, sem a participação da Aedas, que foi a única inabilitada após fase de análise de recursos.    

Embora a Aedas tenha apresentado recurso para reconhecer a nulidade da decisão de inabilitação e a, consequente, habilitação da candidatura da entidade, as Instituições de Justiça negaram todos os pedidos.  

As IJs mantiveram a decisão de inabilitar a Aedas do processo seletivo para contratação de Assessoria Técnica Independente para as Regiões 1 e 2, atingidas pelo rompimento da barragem de Brumadinho. A decisão se fundamenta na suposta necessidade de substituição da Aedas após recusa de assinatura de Termo Aditivo. No entanto, a Aedas já vem pautando que as condições ofertadas no edital se diferem substancialmente do que havia sido definido pelas IJs para as regiões 01 e 02, tanto em relação aos valores, quanto à fonte do recurso.  

Para as IJs, a Aedas não pode concorrer devido ao conflito de interesses, tendo em vista que o objeto do edital busca a sua substituição, o que inviabiliza juridicamente a participação e descumpre a finalidade do edital de chamamento. 

Confira aqui a deliberação das IJs

Toda argumentação das IJs tem sido profundamente rebatida pela Aedas, como se demonstra pelos fundamentos do recurso administrativo apresentado contra a inabilitação da entidade.   

Recurso da Aedas contra inabilitação 

A Aedas ingressou com recurso administrativo contra decisão das Instituições de Justiça que negaram o direito de participação da entidade na seleção de assessoria técnica para as Regiões 1 e 2. De forma geral, a Aedas afirma que a decisão das IJs é ilegal, viola o próprio edital, desrespeita todos os Protocolos de Consulta Livre, Prévia, Informada e de Boa-fé dos Povos de Comunidades Tradicionais (PCTs), e fere o direito de escolha das pessoas atingidas conforme previsto na Política Nacional de Atingidos por Barragens (PNAB). 

A entidade cumpriu com todos os requisitos objetivos do edital, constantes na cláusula 2.2, sem qualquer impedimento técnico ou documental. Deste modo, a inabilitação não poderia ser motivada por qualquer critério inexistente no edital. As IJs equivocadamente afirmaram que a Aedas se recusou a assinar o Termo Aditivo por ausência de interesse em continuar como ATI das Regiões 1 e 2, e, por isso, seria justificada a sua inabilitação. Ao utilizar critério subjetivo e fora dos limites do edital, as IJs violam o princípio da vinculação ao edital, cujos limites deveriam orientar as decisões. Isto é, não há absolutamente nada previsto no edital, que impede a habilitação da Aedas .

A Aedas sempre demonstrou publicamente e validou com as pessoas atingidas o interesse em permanecer como ATI dessas regiões. Por outro lado, apresentou oposição legítima a partir de fundamentos técnicos sobre os cortes orçamentários propostos pela CAMF e aplicado pelas IJs. 

A atitude das IJs se demonstra arbitrária, discricionária e afronta tanto a isonomia quanto a segurança jurídica, posto que a motivação do ato não existe, é incoerente e baseada em fato controverso ainda em discussão em processo judicial. 

Desde 2019, a Aedas acompanha as Regiões 1 e 2, contribuindo na organização das comissões e, desde 2020, enquanto ATI dessas regiões, produzindo diagnósticos, estudos técnicos, plataformas, metodologias e mecanismos de participação. Devido ao compromisso assumido com as pessoas atingidas, a Aedas se posiciona contra os cortes orçamentários não isonômicos entre as regiões da bacia e sem critérios objetivos, o que, na prática, se configura como cortes de direitos para as Regiões 1 e 2.  Estes cortes foram questionados e atualizados pelo judiciário. A CAMF foi intimada pelo juiz para refazer os cálculos, aplicando critérios isonômicos para o custeio da ATI e complementação dos valores para o assessoramento técnico nas Regiões 1 e 2.  

O poder judiciário reconheceu a necessidade de continuação da Aedas como ATI dessas Regiões, determinou a liberação de recursos, e pediu a atualização dos planos de trabalho. Todas estas ações do judiciário refutam a tese sustentada das IJs.  

No âmbito do processo seletivo, as IJs violam o direito das pessoas atingidas, o princípio da vinculação ao edital, princípio da legalidade, motivação e segurança jurídica, e o direito à reparação integral. 

É garantido pela PNAB e pela Política Estadual de atingidos por Barragens (PEAB) o direito das populações atingidas escolherem sua assessoria técnica. Este direito é central na reparação integral, está previsto nas legislações acima citadas e reconhecido por decisões judiciais. A retirada das Aedas sem a consulta prévia e contra decisões judiciais viola a Constituição Federal, legislações específicas para as populações atingidas, convenções internacionais, bem como o próprio Termo de Compromisso firmado entre ATI e IJs. 

O conflito jurídico instaurado sobre a continuidade da Aedas nunca esteve relacionado com a capacidade técnica da entidade ou em recusa de atuação, mas, tão somente, à fixação orçamentária que expôs tratamento não isonômico por parte da CAMF e das IJs para as Regiões mais populosas da bacia, incluindo o epicentro do desastre-crime. O poder judiciário em primeira e segunda instância reconhecem a manifestação da vontade da Aedas em continuar assessorando as Regiões 1 e 2, assim como compreendem que a paralização das atividades da entidade fragiliza o processo reparatório ao prejudicar o direito de participação das pessoas atingidas, gerando retrocessos.  

Em sentido contrário ao defendido pelo judiciário, as IJs lançaram edital de substituição em momento de fragilidade institucional da Aedas provocada pela suspensão do orçamento e pela necessidade de iniciar as demissões, decorrentes de decisões provisórias. As IJs criaram artificialmente a “vacância” da Aedas, imputando uma suposta recusa inexistente e ignorando os efeitos das decisões do Juízo.  

A exclusão da Aedas por meio de edital ocorreu sem a participação das pessoas atingidas, que manifestaram publicamente o interesse na permanência desta entidade, violou protocolos de Consulta Livre, Prévia, Informada e de Boa-fé dos PCTs, e não possui autorização judicial para acontecer. Deste modo, as IJs provocam efeitos gravíssimos ao direito à reparação integral das pessoas atingidas das Regiões 1 e 2, tendo em vista a quebra de confiança, dissolução de vínculos institucionais, perda de memória técnica, desmobilização de equipes, interrupção de formações e danos irreversíveis ao processo de participação informada.  

Acesse o recurso administrativo da Aedas: 

Próximos passos 

A Aedas reforça o interesse em seguir atuando como assessora técnica das Regiões 1 e 2 e segue apresentando recursos judiciais para garantir o direito das pessoas atingidas à participação informada e à reparação integral. De igual modo, segue à disposição para dialogar com todas as instituições envolvidas.  

A respeito do cronograma do edital, a votação para escolha de nova ATI acontecerá no período de 9 a 14 de dezembro e será realizada de maneira totalmente digital, online, por meio do sítio eletrônico www.voteati.com.br, criado unicamente para este processo. A Aedas também tem denunciado que o formato de votação é igualmente violador de direitos, dado que exclui as comunidades em situações de maior vulnerabilidade social, além de desrespeitar os protocolos de consulta. 


Texto: Estratégias Jurídicas da Reparação – Aedas Paraopeba