Povos Tradicionais apresentam denúncia por invisibilidade em possível acordo em Vale e Governo
Os Povos e Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA), da Bacia do Paraopeba, apresentaram ao Ministério Público Federal (MPF) uma nota de repúdio, junto a uma série de documentos sugeridos, para contribuir e fundamentar denúncia diante da recorrente violação de direitos, neste momento materializada por um possível acordo entre Vale, Estado de Minas Gerais e Instituições de Justiça, que trata dos danos decorrentes do rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão e sequer prevê qualquer parte ou ação voltada à reparação dos danos sofridos pelos PCTRAMA. Para além do direito à consulta prévia, o próprio direito à reparação enquanto povos atingidos foi e está sendo violado.
As reivindicações dos Povos e Comunidades tradicionais atingidos, compostas por 28 unidades territoriais tradicionais de Reinados, Umbanda e Candomblé das nações, Angola, Angola Muxikongo, Ketu, Jeje e Omolocô, diante da negativa de participação de fato destas pessoas, estão alinhadas pela Constituição Federal, Artigos 215, 206; Lei Federal 60/40; Lei Estadual 21.147/14 (MG); e a Convenção da OIT de no 169.
Saiba quais documentos foram encaminhados:
1. Nota da Comissão de Atingidos/as dos Povos Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA) de repúdio ao acordo judicial entre Vale S.A., Estado de Minas Gerais e Instituições de Justiça
Denuncia a invisibilidade social e pública dada aos povos africanos desde sua diáspora, do sequestro de ancestrais em terra, e que perdura como estigma. “De lá para cá a jornada dos afrodescendentes sempre foi árdua, cruenta, desoladora, não visível, não percebida pelos variados meios de opressão existentes no país e no mundo”, dizem os PCTRAMA. Ao MPF, eles também cobram responsabilidade por parte da Vale “pelos danos causados, exigindo por ser dever dela, a Vale, a reparação imediata desses danos, para além dos projetos propostos pelo poder público, pelas comunidades, pelos grupos e pessoas atingidas, com suas especificidades coletivas e individuais”.
2.Carta do Centro Nacional de Africanidade e Resistência Afro-brasileira
Além das garantias legais, evidencia a relação dos povos e comunidades tradicionais com a natureza e de como o rompimento da barragem Mina Córrego do Feijão descortinou a dura realidade do racismo institucional que inviabiliza direitos. “A Vale e a justiça agem como se não existimos, como se nunca estivéssemos ali, com nossas práticas, nossas tradições e nossas formas de culto e relação com a natureza. Mas não mais nos calaremos, exigimos respeito às nossas práticas religiosas e formas de vida. Não mais aceitaremos a reprodução do racismo estrutural e estruturante destas relações de negação de nosso sagrado e de nossa vida”, diz um trecho da carta, que segue, entre outros pontos, reafirmando a necessidade de se “identificar, caracterizar, dimensionar e mensurar os danos causados aos modos de vida, fazeres religiosos, liturgias, crenças e memória dos praticantes de religiões de matriz africana”.
3. Protocolo de Consulta Prévia aos Povos Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA) da Região 02 da Bacia do Rio Paraopeba
Um instrumento de organização, luta e defesa dos direitos dos Povos e Comunidades Tradicionais. Confeccionado a partir da Aedas em diálogo com os Povos e Comunidades, este Protocolo de Consulta é inédito no Brasil. É um conjunto de parâmetros, regras, formas feitas pelas comunidades e que devem ser seguidas pelo Estado ou demais organizações quando tratarem de projetos ou assuntos que impactam a vida dessas pessoas.
4.Matriz de Medidas Emergenciais dos Povos Comunidades de Tradição Religiosa Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA) da Região 02 da Bacia do Rio Paraopeba
Reúne medidas voltadas para a retomada e a continuidade das práticas culturais, religiosas e rituais dos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana, a partir da premissa do reconhecimento destes enquanto atingidos pelo desastre sociotecnológico. Essas medidas integram a Matriz e atendem às demandas colocadas por todos os grupos que se autodefinem pertencentes aos Povos e Comunidades Tradicionais de Religião Ancestral de Matriz Africana (PCTRAMA), com o objetivo de parar a continuidade dos danos causados após o Rompimento da barragem e garantir medidas para a mitigação, ou diminuição de danos, para que o Processo de Reparação seja efetivo e integral a essa população.
Os PCTRAMA seguem em articulação entre as regiões, juntamente com as Assessorias Técnicas, buscando participação e visibilidade no acordo, tendo em vista a forma que ele vem sendo construído, o que aponta para uma necessidade de constante articulação e defesa intransigente de pautas fundamentais para a vida de tantas pessoas.
