“Quando nos damos conta de como o acordo está sendo trabalhado, é um misto de sentimento que nos atinge: é medo, é revolta, é incerteza”. F. M. R

A Comissão Especial de Ecologia Integral e Mineração da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), a Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário, o Grupo de Trabalho de Ecologia Integral e Mineração do Regional Leste II da CNBB e a Rede Igrejas de Mineração, protocolaram, na quarta-feira, 09 de dezembro, documento relatando e cobrando providências sobre a não participação das comunidades atingidas pelo desastre da Vale em Brumadinho, na construção do acordo entre Vale e o Governo de Minas Gerais. Publicização, transparência ou consulta pública, é o que as entidades reivindicam.

Dom Vicente Ferreira, bispo auxiliar da Arquidiocese de Belo Horizonte e membro da Comissão Episcopal de Ecologia Integral e Mineração da CNBB, disse que após protocolarem o documento receberam como resposta que os atingidos já estão participando. Entretanto, de acordo com a carta protocolada, independentemente da legitimidade das Instituições de Justiça para atuarem na tutela dos direitos transindividuais, o princípio da centralidade das vítimas não pode ser afastado ou olvidado. Dom Vicente, falou com a Aedas, durante atos em frente ao Tribunal de Justiça, na audiência a portas fechadas em 09 de dezembro:

Estamos aqui hoje com os atingidos, durante audiência entre o Estado e a Vale, para tratar desse acordo. A CNBB através da nossa Comissão de Ecologia Integral e Mineração da Região Episcopal Nossa Senhora Rosário de Brumadinho, protocolamos junto ao Ministério de Justiça o pedido de participação dos atingidos no acordo e recebemos como resposta que os atingidos estão participando, então nós fizemos ao longo desses dez dias, uma série de reuniões, principalmente ali na reunião de Brumadinho, e pra nossa surpresa, todos reclamando que não há participação, estamos até dizendo, sem participação não há reparação. Então o nosso grito de justiça é justamente esse, que a gente possa colocar a voz do atingido no centro das negociações desse acordo, porque também é um acordo de pedir justiça, sobretudo o que esse crime representa pra nossa região de Brumadinho e para uma série de comunidades. Estamos apoiando a todos sem distinção, para que nossa voz seja forte, dizendo principalmente ao Governo, ao Estado, que não faça nenhum acordo com a Vale sem, de fato, ter a participação dos atingidos”.

Como afirma o documento, são vítimas desse caso as 272 pessoas que perderam suas vidas, as comunidades destruídas pela lama, as comunidades que até hoje sofrem com o desabastecimento hídrico e com a contaminação ambiental. São vítimas desse caso as populações tradicionais, ribeirinhas, indígenas e quilombolas, agricultores e agricultoras da Bacia do Rio Paraopeba; os familiares de cada uma das vítimas fatais e suas comunidades; os cidadãos dos municípios atingidos e tantos mais, justamente em razão do caráter transindividual dos danos ocasionados.

As entidades da sociedade civil reiteram e expressam suas preocupações acerca do processo de negociação de minuta de acordo a ser celebrado. Para elas, as comunidades atingidas e a sociedade em geral não devem receber somente explicações por parte do Poder Público e das instituições de justiça atuantes.

Isso porque o pressuposto de qualquer processo de reparação de danos, especialmente em casos de graves violações de direitos humanos como o ocorrido na Bacia do Paraopeba, deve ser a centralidade das vítimas.

Por isso, entre os dias 30 e 9 de dezembro, as entidades que assinam o documento com o apoio da Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (Aedas), conduziram escutas comunitárias, principalmente na região de Brumadinho: Tejuco, Quilombos Rodrigues, Marinhos, Ribeirão e Sapé, Pires, Córrego do Feijão, Parque da Cachoeira, Toca de Cima, Ponte das Almorreimas.

As comunidades quilombolas, inclusive, lembraram o Protocolo de Consulta Prévia, Livre e Informada, elaborado junto à SEDESE/MG, como importante instrumento de participação e que não pode ser deixado de lado nesse momento.

Por fim, as entidades recomendam a paralisação das negociações até que seja conduzido processo efetivo de escuta e participação das comunidades atingidas na construção do acordo.