Acredito que só com luta e ação coletiva conseguiremos respostas mais rápidas e concretas

Adilson Ramos Martins, 48 anos, vem de Itaipé, uma pequena cidade no Vale do Mucuri, no norte de Minas. Em Itaipé, sua infância girou em torno da roça e da agricultura, na colheita de café, arroz e feijão, além da pesca: “A natureza e a agricultura sempre fizeram parte da minha vida. Tive uma infância maravilhosa, podendo viver no mato à vontade”, lembra.

Na pré-adolescência, se mudou com a família para Belo Horizonte para estudar. Mais tarde, conheceu sua companheira, e juntos, foram para a comunidade da Reta do Jacaré, em Mário Campos, na Região 2 da Bacia do Paraopeba, onde compraram uma casa própria à beira do rio, cercada pela natureza: “Foi como retornar às minhas raízes, um reflexo da minha infância, onde eu podia plantar e pescar para o nosso sustento”. 

Adilson destaca seu projeto de vida:“Eu pretendo viver de agricultura e piscicultura, sendo a piscicultura a melhor opção para mim. Eu conseguia vender alevinos, tanto para crescimento juvenil quanto para engorda”.

As atividades com a agricultura e piscicultura desenvolvidas por Adilson estavam caminhando a contento antes do rompimento.

“O projeto estava indo muito bem e era gratificante. Trabalhar com peixes é desafiador, mas extremamente prazeroso. Tudo estava indo bem até o rompimento da barragem”

Foto à esq: Tanque de criação de peixes no quintal de Adilson, utilizado para produção antes do rompimento| Foto à dir: Rio Paraopeba, localizado a poucos metros de seu quintal.

Adilson criava peixes em tanques no seu quintal, utilizando água do rio Paraopeba em um sistema que renovava constantemente a água. Após o desastre-crime, ele teve que adaptar sua criação e usar a água fornecida pela mineradora. No começo, enfrentou dificuldades devido ao cloro presente na água: “Inicialmente, os peixes não conseguiam sobreviver, pois são muito sensíveis e não suportam mudanças no pH da água”, relata.

Atualmente, a produção de Adilson diminuiu. É importante ressaltar que ele conta com fornecedores que entregam peixes para sua atividade.

Adilson também relata que, após o rompimento, ele e sua família conviveram, por um período de três meses, com um forte cheiro de rejeito de minério. Além disso, passou a ter insônia, acordando por qualquer pequeno barulho.

Ele reflete sobre sua visão da mineração: “Antes, eu via a mineração de maneira diferente; os danos não eram amplamente divulgados. Quando o problema atinge a nossa própria casa, a perspectiva muda. Eu acreditava que trabalhar para a Vale garantia um futuro seguro, mas na verdade, as pessoas estavam constantemente em risco, sem que houvesse cuidado com a natureza, e a exploração era desleal“.

A mineração causa injustiças e atinge a qualidade de vida, a saúde e as relações comunitárias. Em Mário Campos, por estarmos tão próximos, enfrentamos muitas perdas”

Além do rompimento, a enchente do rio Paraopeba em 2022 agravou ainda mais a situação. Adilson teve seu quintal atingido pelas cheias, que trouxeram lama de rejeito de minério, levando à perda de sua horta, peixes e galinhas, e modificando ainda mais sua segurança alimentar. 

Adilson avalia o Acordo de Reparação: “Alguns aspectos do acordo foram positivos e têm ajudado, mas, em minha opinião, a reparação integral não existe; será sempre parcial, há coisas que não se recuperam. No entanto, devemos persistir na luta para garantir nossos direitos”. 

Ele também expressa preocupação com a saúde da população atingida, solicitando a implementação de um monitoramento contínuo para acompanhar a saúde das pessoas expostas a substâncias químicas resultantes da mineração. Além disso, enfatiza a necessidade de um Protocolo de Saúde específico voltado para os atingidos e as atingidas: “O SUS ainda não oferece exames para detectar metais pesados e é essencial monitorar a população. Muitas pessoas estão enfrentando dores abdominais, coceiras, problemas respiratórios e de pele, o que também impacta a saúde mental”.

Sobre os projetos do Anexo I.1, que incluem as Demandas das Comunidades Atingidas e os Programas de Crédito e Microcrédito, Adilson comenta: “Se conseguirmos validar uns projetos bacanas, isso pode mudar nossa realidade. Temos grandes expectativas. O que queremos é apenas seguir com nossas vidas e alcançar uma qualidade de vida melhor”. 

Para finalizar, Adilson manda um recado: “Acredito que só com luta e ação coletiva conseguiremos respostas mais rápidas e concretas. Mesmo após mais de 5 anos do rompimento, devemos continuar unidos, buscando melhorias para as comunidades. O desastre-crime foi grande, envolvendo muitas pessoas e provocando grandes mudanças. Apenas com perseverança conseguiremos melhorar a situação. Quando conseguirmos concretizar nossos projetos e retomar nossa rotina normal, todos sairão ganhando. Lutar sozinho é muito mais difícil”. 

Texto e fotos: Felipe Cunha | Aedas


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