Atingidos questionam problemas referentes ao PTR em reunião com FGV e IJs
Encontro teve representantes das cinco regiões atingidas da Bacia do Paraopeba e Represa de Três Marias

Problemas e dúvidas sobre o Programa de Transferência de Renda (PTR) foram temas centrais de uma reunião entre lideranças atingidas, a Fundação Getúlio Vargas (FGV) e as Instituições de Justiça (MPF, MPMG e DPMG) realizada nesta quinta-feira (1°) na sede do Ministério Público de Minas Gerais, em Belo Horizonte.
O encontro teve formato híbrido, presencial e virtual e contou com a participação de atingidos e atingidas das cinco regiões da Bacia do Rio Paraopeba. Também estiveram representadas as Assessorias Técnicas Independentes (ATIs) Aedas, Nacab e Guaicuy. A reunião foi aberta pela promotora Shirley Machado de Oliveira e pela defensora pública Carolina Morishita.
Em seguida, Rodrigo Gonçalves, da FGV, apresentou um panorama do PTR até o ano de 2023. Na abertura das falas aos atingidos, Claudia Saraiva, de Ponte das Almorreimas, em Brumadinho, relatou que os moradores da comunidade perderam familiares e que, a partir das obras de reparação, a localidade “sofre como Zona Quente”. Ela questionou sobre os critérios que determinam quem recebe e quem não recebe 100% do valor do PTR.
Maria dos Anjos, da Comunidade Tradicional Ribeirinha Rua Amianto, apresentou a necessidade de se considerar a comunidade como Zona Quente.
“Não estamos dentro do acordo que foi firmado em fevereiro de 2021. Então toda vez que vamos reclamar, não temos com quem reclamar. Fizeram um termo de ajustamento de conduta por causa da situação de Ponte. Nós acompanhamos a Vale no território mostrando a situação de Ponte e não sabemos quais informações foram passadas para a FGV sobre Ponte e porque não recebemos o integral. Gostaria de saber das IJs e da FGV sobre a situação de Ponte no PTR, porque hoje Ponte recebe apenas meio salário-mínimo”, indagou.
De acordo com Maria dos Anjos, em resposta a um ofício enviado pela Aedas, em 2021, a FGV alegou que a solicitação da comunidade não poderia ser incluída nos pagamentos do PTR porque a inclusão poderia ocasionar a diminuição do prazo de duração do Programa para outras regiões. Ela apresentou um histórico de várias reivindicações feitas à FGV e Instituições de Justiça com o apoio da Aedas e descreveu os danos causados pelo rompimento na área que fica às margens do Rio Paraopeba.
“Nossa comunidade não pode ser responsabilizada pelo maior ou menor tempo de duração do PTR. Se o critério foi que vai faltar dinheiro, ele não pode proceder, pois o Condomínio Beira Rio é considerado Zona Quente e a gente não, sendo que lá nem foi lama. Gostaria de entender que critério é esse de Zona Quente que a FGV está utilizando e porque não somos Zona Quente. A FGV não respeitou o laudo da Aedas que explicou as características de Zona Quente daqui”, afirmou Maria dos Anjos.
Silas Fialho, do Parque da Cachoeira, iniciou sua intervenção pedindo justiça pelas 272 Joias. Em seguida, ele se posicionou criticando a maneira como se dá o diálogo das IJs e FGV com os atingidos e afirmou que foram [atingidos] pegos de surpresa com a reunião marcada “em cima da hora”. O atingido, familiar de vítima fatal, solicitou respostas da FGV sobre as notas técnicas oficiais, sobre as questões que envolvem a Zona Quente, e a necessidade de uma definição técnica e o porquê algumas localidades não recebem devidamente o pagamento do PTR.
Joelisia Feitoza, de Satélite, em Juatuba, questionou se ainda haverá divulgação de mais poligonais, se haverá novas aprovações. Ela relatou a insegurança de pessoas que estão fora das poligonais e constam como aprovadas no PTR, por exemplo. “A FGV precisa trabalhar alinhada com as ATIs e com as IJs. Continuamos precisando da visita técnica de vocês, principalmente na Ocupação Santa Fé”, pediu.
Robson Oliveira, do Fórum de Atingidos e Atingidas pelo Crime da Vale em Brumadinho e do Comitê Popular da Zona Rural de Brumadinho, reivindicou que haja mais espaço para fala das pessoas da R1, pois se organizaram a partir das diferentes demandas das comunidades.
“O que tá acontecendo hoje é um acúmulo dessas demandas. É preciso a participação direta da FGV em espaços com as próprias comissões. E já foram enviados diversos ofícios à FGV solicitando essas reuniões. (…) Piedade, por exemplo, quando foi que a FGV esteve presente no distrito de Piedade? Nunca! Meu pedido é que a FGV vá ao território”.
Dinalva, moradora do Fhemig, reforçou que alguns ofícios e pedidos já foram encaminhados para o Comitê de Compromitentes pela Aedas a pedido das lideranças da R2. Entre os pedidos, estão o respeito ao fluxo para envio de demandas individuais relacionadas ao recebimento do PTR, o pedido de inserção da Ocupação Santa Fé e dos Povos e Comunidades de Tradição Ancestral Religiosa de Matriz Africana (PCTRAMA) no PTR, cujos direitos tradicionais não estão garantidos pelo critério territorial, e informações sobre novas poligonais.
Também foram questionados o início da quitação do Passivo do pagamento Emergencial e do pagamento retroativo das crianças que estavam em gestação à época do rompimento, além da possibilidade de aprovação de novas poligonais na R2.
Respostas
Sobre os critérios de Zona Quente e de quais comunidades são consideradas, Marcela Galvani Borges, da FGV, disse que isso não foi feito pela FGV e que esses critérios antecedem a contratação da Fundação e da “importância de identificar a responsabilidade de cada instituição”. Marcela disse ainda que o critério de impacto financeiro é um, dentre vários, que são analisados nos estudos técnicos.
A representante da FGV falou que a instituição continua seguindo o fluxo de encaminhamento das demandas individuais. Disse ainda que as poligonais da R2 foram concluídas. Sobre o pagamento do passivo do Auxílio Emergencial que era pago pela Vale S.A., a representante da FGV informou que está sendo elaborado uma proposta de cronograma e, em breve, terá mais detalhes.
Shirley Machado, promotora do MP, disse que a decisão sobre o pagamento parcelado do Passivo do pagamento do Auxílio Emergencial foi tomada pelas IJs, e não pela FGV. E que assim foi pensado para que ficasse mais dinheiro rendendo no Fundo FGV/PTR para que o Programa dure o máximo possível. A promotora informou que a questão Zona Quente será tema da próxima reunião com os Compromitentes.
A defensora Carolina Morishita disse que as decisões podem ser criticadas, que há decisões que cabem sugestão e deliberação pelas pessoas atingidas e outras são responsabilidades das IJs. Outras questões enviadas para a reunião via participação virtual serão organizadas pelo MPMG e enviadas para a FGV em até 20 dias.
FGV
Segundo os representantes da FGV, o PTR já pagou mais de R$ 2 bilhões às pessoas atingidas de toda a Bacia até o momento. Rodrigo Gonçalves falou que houve um acréscimo de mais de R$ 900 milhões a partir do rendimento do dinheiro no Fundo FGV/PTR. Ainda de acordo com a Fundação, somadas todas as regiões, foram 9.745 cadastros em 2023, sendo 1.416 na R1 e 3.887 na R2.
Nos pontos volantes, a FGV diz terem sido feitos 3.592 cadastros em 2023, sendo 7 na R1 e 1.195 na R2. Na apresentação, também informaram que foram recebidos 136 recursos, sendo 18 na R1 e 110 na R2. Sobre coletas geográficas, em 2023, foram 20.211 no total, sendo 276 na R1 e 6.158 na R2.