25 de janeiro: Romaria e homenagens a vítimas fatais marcam 5 anos do rompimento; veja fotos
Confira aqui a cobertura das atividades em Brumadinho em denúncia e memória após 5 anos do rompimento da barragem da Vale
Atualizada às 19h08

Homenagens às joias no dia 25 de janeiro de 2024 | Foto: Felipe Cunha – Aedas
Nesta quinta-feira (25), dia que marcou o quinto ano do rompimento da barragem Mina Córrego do Feijão, centenas de pessoas se reuniram no município de Brumadinho em busca por direitos, justiça e reparação.
O crime socioambiental, um dos maiores da história recente do Brasil, ceifou a vida de 272 pessoas, sendo que três delas ainda não foram encontradas. Além disso, causou uma devastação ao despejar mais de 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério de ferro na Bacia do Rio Paraopeba e Represa de Três Marias, percorrendo mais de 300 km, atingindo os modos de vida de 26 municípios e que seguem na busca por reparação integral.
As atividades do dia que começaram com a V Romaria pela Ecologia Integral em Brumadinho, organizada pela Renser em colaboração com diversos movimentos e organizações. Por volta das 7h30 houve a acolhida dos participantes em torno do Santuário Arquidiocesano Nossa Senhora do Rosário.
Programação:
Coletiva de Imprensa
Iniciando o dia de atividades dos 5 anos de rompimento da barragem em Brumadinho, na V Romaria pela Ecologia Integral a Brumadinho, uma coletiva de imprensa abordou os temas centrais desse momento. Em suas falas, os membros da mesa destacaram a impunidade dos responsáveis pelo desastre crime, o prolongamento de danos e o pedido por justiça.
Participaram da entrevista o bispo auxiliar da Arquidiocese de Belo Horizonte, Dom Joel Maria dos Santos, responsável pela Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário (Renser); Andresa Rodrigues, mãe da Joia Bruno Rodrigues e presidente da AVABRUM; Flávia Gondim, Gerente Geral da Aedas; Maria Aparecida da Silva Soares, atingida do Tejuco e o Cacique Sucupira, da comunidade indígena Naô Xohã.
Em seguida, os romeiros participam de uma celebração eucarística no Santuário de Nossa Senhora do Rosário presidida por Dom Joel e participação de Dom Francisco Cota, bispo da diocese de Sete Lagoas e presidente da Comissão para Ecologia Integral e Mineração do regional leste 2 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

Andresa Rodrigues, mãe de Bruno, vítima do rompimento – Foto: Felipe Cunha – Aedas
A presidente da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidob (AVABRUM) reafirmou o compromisso da entidade com a luta por justiça e cobrou respostas urgentes
“É com eles e por eles que nós seguimos fazendo a luta por justiça”
“A AVABRUM nasceu da dor, ela nasceu do luto, mas ela também nasceu do amor pelas 272 joias, sempre presentes, então é com eles e por eles que nós seguimos fazendo a luta por justiça, por pelo encontro das três joias ainda não encontradas e pela memória, afinal, o que a memória ama permanece vivo e aquilo que não é dito não é lembrado é esquecido e nós jamais permitiremos que eles caiam no esquecimento e que esse crime também caia no esquecimento. Lutamos pelo direito dos familiares e nesse conjunto todo fazemos a luta diariamente pela não repetição do crime. Então, enquanto não houver justiça, não haverá reparação. Sem justiça, não há alento para este sofrimento.”

Maria Aparecida da Silva Soares, a Paré, moradora atingida do Tejuco, em Brumadinho é agricultora e familiar de vítima fatal. Ela perdeu o irmão no desastre-crime e lamenta o sofrimento diário que passou a viver o dia 25 de janeiro de 2019.
“Tejuco, Parque da Cachoeira, Pires, Monte Cristo, vive uma saga todo dia.”
“Desde esse dia da tragédia começou a nossa saga. A gente não tem sossego pra nada. A gente não vive, os agricultores não vivem. Não tem reparação. Não tem água, a água toda contaminada, nós não temos água. Tejuco, Parque da Cachoeira, Pires, Monte Cristo, vive uma saga todo dia. Nós morre todo dia. Nós não temos reparação”, desabafou Paré.

Coletiva de imprensa com lideranças em Brumadinho – Fotos: Felipe Cunha e Lucas Jerônimo – Aedas
A gerente geral institucional da Aedas Paraopeba, Flavia Maria Gondim, pontuou que a palavra Justiça deve ser reforçada no dia 25, cinco anos após o rompimento. Ela comentou da desigualdade nessa busca frente a uma mineradora internacional.
“Quem pode falar de reparação são as pessoas que estão aqui, são as pessoas que perderam as 272”
“A assessoria técnica (ATI) é um direito porque do outro lado a gente tem a Vale que é responsável pelo desastre-crime que foi cometido 5 anos atrás e que precisa ser responsabilizada por isso. Hoje a palavra que a gente tem que reforçar cada dia é Justiça, a impunidade não pode prevalecer. Do lado de lá tem a Vale que tem divulgado dia após dia, em diversos meios de comunicação, investido em publicidade pra falar que há reparação. Quem pode falar de reparação são as pessoas que estão aqui, são as pessoas que perderam as 272 joias com o crime que foi cometido. São as pessoas que dia após dia não têm acesso à água, são as pessoas que têm seus alimentos contaminados, são as pessoas que não têm sido reconhecidas. São essas pessoas que podem falar da Reparação que não está acontecendo”, disse Flávia.
“As pessoas atingidas podem falar. São elas as protagonistas dessa luta”
A gerente da Aedas também criticou a narrativa da poluidora pagadora Vale, que tem investido em uma propaganda de reparação nos territórios. “A reparação que a Vale divulga não é uma reparação real. Não se trata dos valores exorbitantes que eles disponibilizam. O que tem sido feito com esses valores? As pessoas atingidas podem falar. São elas as protagonistas dessa luta”, afirmou Gondim.
Celebração Eucarística
Os romeiros participam de uma celebração eucarística no Santuário de Nossa Senhora do Rosário presidida por Dom Joel e participação de Dom Francisco Cota, bispo da diocese de Sete Lagoas e presidente da Comissão para Ecologia Integral e Mineração do regional leste 2 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Frente à persistente impunidade ao longo de cinco anos e às contínuas violações de direitos socioambientais enfrentadas pelas comunidades atingidas, a Renser escolheu como tema para este ano o lema bíblico: “Das alturas, orvalhem os céus. E das nuvens, que chova justiça” (Isaías 45,8), marcando assim o quinto ano do desastre-crime.
Durante a celebração eucarística, os romeiros ergueram placas com o nome das joias e uma homenagem as três joias que ainda não foram encontradas.











V Romaria Pela Ecologia Integral – Celebração eucarística – Fotos: Felipe Cunha – Aedas
Missa no Córrego do Feijão
272 nomes, cada um deles de pessoas com sonhos e histórias, que hoje estão na memória de familiares e amigos. As joias foram celebradas nesta quinta-feira (25/01), em missa realizada na Igreja Nossa Senhora das Dores, na comunidade do Córrego do Feijão, em Brumadinho, epicentro do desastre-crime causado pela Vale S.A.
No primeiro momento de comunhão, os presentes rezaram 272 Ave Marias para cada uma das joias, no campo de futebol situado em frente a igreja. A localidade abriu as portas, exatamente há 5 anos, para receber a operação de resgate das vítimas pelo Corpo de Bombeiros.
A missa foi celebrada por Dom Joel Maria dos Santos, que lembrou da importância de fazer memória às joias e da busca pela justiça e responsabilização dos responsáveis pela tragédia. Às 12h28 o sino da igreja ecoou 272 vezes em homenagem às vítimas.
A atingida Carmen Sandra Barbosa de Paula, nascida e criada na comunidade, destacou que a fé é fundamental para os atingidos do Córrego do Feijão. “Se não fosse pela fé, eu acredito que coisas piores poderiam ter acontecido. Ela que nos dá força para acordar, pra poder trabalhar e viver cada dia nessa comunidade, que não tem sido fácil”, disse.
“É a fé que nos dá força”
“É a fé que nos dá força para ver as mães, que ainda moram aqui e que perderam seus filhos, ver cada parte da comunidade onde a gente tinha encontro com essas pessoas. É essa fé que faz a gente confiar e crer que dias melhores podem vir”, completou.








Ato religioso em memória das 272 joias – Fotos: Diego Cota – Aedas
Caminhada

Caminhada até a Praça das Joias, em Brumadinho – Fotos: Felipe Cunha – Aedas
Do Santuário Nossa Senhora do Rosário, os romeiros de diversas regiões atingidas do Paraopeba e de outros territórios seguiram em Caminhada até a Praça das Joias. Um grupo de familiares de vítimas fatais seguiu à frente, carregando faixas e uma cruz com os nomes das 272 joias assinados em sua superfície.
Comunidades pastorais, grupos auto-organizados de atingidos de outras regiões da Bacia do Paraopeba, indígenas e demais organizações seguiram pelas ruas de Brumadinho segurando suas faixas e entoando seus cantos e mensagens.











Fotos: Felipe Cunha – Aedas
Geralda Rosária, mora no bairro Salgado Filho em Brumadinho. Vestindo a camisa com a foto do sobrinho, ela fez o percurso emocionada acompanhada de familiares, que também prestavam homenagem. Para Geralda, passados cinco anos, a saudade do sobrinho só aumenta.
“Não sara, muito ruim. É cinco anos, mas muito difícil. A saudade é muito grande, imensa. A gente grita por justiça. Cadê os culpados, porque foi premeditada a morte deles. A gente entende que podia ter sido evitada. Quanto mais o tempo passa, mais dor”, revelou.

Reinaldo Fernandes é morador de Brumadinho, no bairro Lurdes. Ele critica a impunidade e a ausência da reparação nos territórios, sendo vista e vivenciada pelos atingidos.
“Nós chamamos de falsa reparação. O que sabemos é que tem entrado dinheiro nos cofres das prefeituras, mas não vemos isso transformado em serviços. Continuamos numa luta constante por justiça. Passados 5 anos, os réus continuam soltos e ainda recorrendo para não ser julgado. O que nós passamos paro Brasil inteiro é que o crime compensa, que pode minerar do jeito que quiser, que pode matar. Temos ameaças dos minérios pesados sobre nós, que estamos respirando. A reparação tem muito de propaganda bilionárias em redes de televisão. Mas a reparação verdadeira não tem justiça, e esse ato de hoje é muito em função disso”, pontuou Reinaldo.
“A quinta romaria é um momento para pedirmos justiça para um crime que até hoje não tem ninguém preso, muito pelo contrário, a mineradora lucra em cima dos sangues dos nossos, juntamente com governo do Estado que dá aval para todas as atrocidades acontecidas aqui”, comentou Cláudia Saraiva, da comunidade de Ponte das Almorreimas, em Brumadinho.
Cláudia também conta que, apesar da dificuldade, a cobrança por justiça não pode parar. “A gente tem sim que lutar, porque a gente lutando já está difícil, imagina se a gente desistisse? Se não houver condenação, o crime não teve justiça. É preciso que lutemos para não repetição desse crime, porque temos muitas mineradoras em risco. Cinco anos de dor, pedindo por justiça, momento que relembramos aquele dia, que mudou para sempre a vida gente”.
Maria Dalva de Sousa vestia a camisa “S.O.S Brumadinho”. Do inglês, o código SOS é utilizado como uma mensagem para pedido de ajuda. Um dos significados para a sigla é “Save Our Souls”, que significa “salvem nossas almas” em português.

“É exatamente isso, um pedido de socorro, pela população, pelo rio, por nós todos que moramos aqui. A sensação depois de 5 anos é de impunidade. Os culpados estão aí, sorrindo da nossa cara”, disse a moradora da comunidade Progresso II, que trabalhava na comunidade do Córrego do Feijão na época do rompimento, e onde perdeu amigos.
Ato dos familiares

Fotos: Felipe Cunha – Aedas
Com muita emoção e simbolismo, a caminhada chega à Praça das Joias, próxima ao Letreiro de Brumadinho, onde um grupo de familiares já aguardava os romeiros. A cruz com o nome das vítimas foi repassada para o palco montado na praça, dando início às homenagens.
Uma apresentação do coral Chita Chic abriu a série de mensagens de amor e memória às vítimas que perderam a vida com o rompimento da barragem da Vale. Os familiares fizeram coro a diversas denúncias e violações que foram lembradas durante a programação da AVABRUM na data do dia 25.
“Nós não vamos esquecer”, ecoavam os familiares diante das afirmações feitas. “A Vale sabia, meses antes, que quem estivesse a menos de 2 km de distância da barragem, não teria tempo para sobreviver, por isso nós não nos esqueceremos”, afirmou Alexandra Andrade, da diretoria da AVABRUM durante o ato.
“O dano morte causado a 272 vidas humanas”, afirmou Andresa Rodrigues, presidente da AVABRUM, que foi seguida pelo coro de centenas de familiares que repetiam: “Nós não vamos esquecer”.



Fotos: Felipe Cunha – Aedas
O ato foi encerrado com 272 balões sendo soltos pelo público que estava presente. Cada balão representava uma vítima fatal. Feitos com material biodegradável, os balões guardavam sementes de girassóis que flutuaram pelo céu. Cada ponto vermelho simbolizava uma vida perdida e abrigava consigo uma semente que virá a germinar em algum dia.






Fotos: Felipe Cunha – Aedas
Ainda na mística dos balões, os familiares também liberaram 1.826 balões, que marcavam a quantidade de dias que as famílias haviam vivido com a dor da ausência de seus entes queridos. O ato foi encerrado com um abraço no Letreiro de Brumadinho. Local em que fotografias das vítimas estão estampadas em cada uma das letras da cidade.
Texto: Diego Cota, Felipe Cunha, Lucas Jerônimo e Valmir Macêdo