Os problemas enfrentados pela população atingida e os caminhos da reparação foram os principais temas da audiência 

Na noite da última segunda-feira, (26), ocorreu uma Audiência Pública na Câmara Municipal de Brumadinho cujo tema foi a situação das comunidades do município após 4 anos e 5 meses do rompimento da barragem B1 e soterramento das barragens B-IV e B-IV A da mina Córrego do Feijão, pertencente a mineradora Vale S.A. 

A Audiência teve duração de 4 horas e 30 minutos e contou com mais de 17 falas de pessoas atingidas na Tribuna Livre, que pontuaram os problemas vivenciados pós-rompimento, propostas para melhoria e retomada da qualidade de vida, denúncias frente ao Acordo de Reparação e demandas por reparação das diversas comunidades de Brumadinho. 

Na Audiência, presidida pelo Deputado Federal Pedro Aihara (Patriota), que faz parte da Comissão Externa da Câmara dos Deputados que fiscaliza rompimentos de barragens, estavam presentes para responder aos atingidos: Norberto Giovannini Ribeiro, Secretário de Planejamento e Coordenação Municipal, representando o Prefeito de Brumadinho, Avimar de Melo Barcelos (PV); Alessandra Cristina de Oliveira, Vereadora (Cidadania) e Representante do Presidente da Câmara Municipal de Brumadinho; Gabriel Parreiras, Vereador (PTB); Gustavo Barcelos, Secretário Municipal de Desenvolvimento Social; Christiane Passos, Secretária Municipal do Desenvolvimento Econômico; Eduardo Diniz Callegari, Secretário Municipal de Saúde e Eduardo Gomes Ângelo da Silva; Coronel Comandante-Geral do Corpo de Bombeiro Militar de Minas Gerais.  

Também se fizeram presentes membros da Associação dos Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão (Avabrum), da Comissão dos Não Encontrados, do Comitê de Brumadinho, representantes e lideranças de associações e comissões das pessoas atingidas, além de centenas de pessoas atingidas residentes nas comunidades de Brumadinho.

É importante destacar que o convite foi feito e que não estiveram presentes representantes do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), da mineradora Vale S.A, da Secretaria de Planejamento de Minas Gerais, do Governo Estadual, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça. 

Alexandra Andrade, familiar de vítima fatal e membro da Avabrum, foi a primeira a falar na Audiência e reforçou que a luta da Avabrum é por Justiça, para que todas as pessoas responsáveis sejam punidas; pelo Encontro de todas as vítimas, pela Memória, para que a história da tragédia-crime seja contada da forma como realmente foi e por Não Repetição; para que mais pessoas não percam suas vidas trabalhando.  

“Foram 250 pessoas [que tiveram a vida ceifada] na área da barragem, fora as pessoas das comunidades e da pousada. Lutamos também pela não repetição para que nenhum familiar passe pelo que nós estamos passando e nenhuma comunidade ou município vivencie tudo que nós estamos vivenciando na pele. O acordo [de reparação] não tem política pública específica para os Familiares de Vítimas Fatais, desde o início não foi considerado. Tudo que conseguimos até o momento foi porque os familiares, com toda dor e tristeza, voluntariamente, reuniram com representantes”, pontua Alexandra.  

Marlene dos Reis, moradora de Brumadinho, diz que os moradores estão com a saúde mental cada vez mais fragilizada, “vivo de medicação e a Vale S.A continua matando todos os dias de nossa vida.” 

Pautas como o Programa de Transferência de Renda (PTR) e o planejamento do município para geração de emprego e renda foram colocadas pelas pessoas atingidas. 

Segundo o Secretário de Planejamento e Coordenação de Brumadinho, que também estava representando o prefeito da cidade, disse que dentro do Acordo Global, há uma iniciativa do Distrito Industrial [Anexo I.4], “que envolve tanto obra física, construção de um loteamento industrial e que […] envolve infraestrutura, água, luz, esgoto, internet, estrada, escoamento de chegada e saída da produção, treinamento da população de Brumadinho, cursos de qualificação. O projeto é grande e que a gente busca em um futuro médio diversificar a nossa matriz econômica e reduzir a nossa dependência da mineração”, argumenta o secretário. 

Cartazes de manifestação na Audiência

O representante do Comitê de Brumadinho pontuou que “a cidade está um caos, só quem anda e mora aqui que consegue falar o que está acontecendo. Cada comunidade tem sua particularidade.” Também, trouxe a situação que sua comunidade enfrenta: “No Tejuco, quando rompeu a barragem, o Tejuco foi o único caminho para todas as comunidades. O crime continuado da Vale S.A ocorreu no Tejuco. A Vale, em uma obra da estrada, sujou nosso manancial, nossa nascente, comunidades centenárias e que tinha água em abundância. A comunidade agora não tem água e depois vem Vale, a prefeitura e faz Termos para levar a água do Monte Cristo. A Vale faz a obra e passa a concessão para Copasa, tenho uma pergunta: Quem vai pagar a conta de água? A comunidade nunca pagou a água, era direito nosso, nascente do nosso território”. 

Samanta Blenner, moradora de Brumadinho abordou a questão das enchentes pós-rompimento da barragem: “A enchente trouxe do Rio Paraopeba o rejeito e foi parar nos quintais e na casa das pessoas.  A Vale diz que não é dela. Mas a lama tem dona e a dona é a Vale. Isso também traz agravamento de saúde. O SUS não tem um Protocolo de Saúde específico para tratar da saúde dos atingidos por barragem. O SUS não tem uma maneira de tratar. Gostaria que fosse levada e discutida para ter essa priorização.” 

Já Maria dos Anjos, da Rua Amianto, disse que na Rua Amianto, Comunidade Tradicional Ribeirinha, “os quintais foram inundados e contaminados com a Lama da Vale. Nossas crianças cresceram nadando naquele rio, era a piscina deles, e hoje eles não podem usar nem o quintal para jogar bola”.  

Outras demandas colocadas na Tribuna Livre foram sobre os acordos extrajudiciais e que foram negados, reparação ambiental, punição aos responsáveis pelo desastre-crime, fomento de renda, contenção de deslizamento de terrenos devido à sedimentos depositados no Rio Paraopeba, segurança de barragens, homologação do Anexo I.1, problemas com tráfego intenso de caminhões, poeira intensa nas comunidades, estradas esburacadas, desconfiança da qualidade da água, desmotivação dos alunos no setor da educação, atenção e olhar voltado para a saúde integral das crianças. 

Assista a Audiência completa

Texto: Felipe Cunha