
“Meu sonho era ter um negócio meu. A Arcelor matou meu sonhou”. No dia 8 de fevereiro de 2019, o sonho de Katiane e Jovelmar (Nêgo), de ter seu próprio empreendimento, de poder sustentar a família, os filhos Igor e Vitor (Vitinho), as filhas, Ludmila e Jennifer e o neto Anthony, terminou. O casal tinha um trailer de comida em Pinheiros e com o acionamento do Plano de Ação de Emergência para Barragens de Mineração (PAEBM), tiveram que abandoná-lo. Isso porque a área onde trabalhavam é uma área de risco e caso haja um rompimento da barragem, o trailer seria atingido.
Katiane largou o emprego que tinha como cozinheira para realizar seu sonho, pensou no melhor lugar da comunidade para colocar a barraca de comida, um lugar que realmente iria vender e assim poder sustentar a família. No início era uma barraquinha feita no improviso, usando luz emprestada de um amigo que trabalhava como caseiro perto do local, e a vontade de vencer com seu trabalho. Depois de alguns meses no local, o casal foi denunciado e a Prefeitura do município exigiu a regularização do pequeno comércio. Katiane conta que fizeram várias visitas à Prefeitura e então decidiram investir em um trailer e legalizar a situação para não ter mais problemas e poder seguir com o sonho do negócio próprio.
E assim fizeram, se endividaram para comprar o trailer e seguiram vendendo seus lanches e seu cafezinho em Pinheiros. Não passou um mês quando teve o acionamento do Plano e tudo desmoronou. De onde iriam tirar dinheiro para pagar a dívida do trailer e ainda sustentar a família?
Mas aí você se pergunta: Katiane e Jovelmar poderiam colocar o trailer em outro lugar, assim o sonho pode voltar!
Não, não pode!
Katiane pensou muito antes de colocar o trailer e escolheu o lugar mais movimentado da comunidade, onde passa muitos caminhões, de dia e de noite. “Às vezes conseguíamos tirar 800 reais por dia ali, em nenhum outro lugar vamos conseguir vender como antes, a comunidade parou, não há trabalho”, contou Katiane. No trailer trabalhavam Katiane, Jovelmar e Vitinho. Dali duas famílias tiravam seu sustento: Katiane e família, Vitinho e companheira. Toda a família ajudava no que podia. E a vida seguia, a família estava feliz construindo os sonhos e pensando em um futuro melhor.

Hoje, tudo mudou: “Depois do acionamento meu filho começou a beber mais e sai pela rua gritando. Passei a tomar remédio controlado, vou a psicóloga, minha filha mais nova e meu esposo estão sempre nervosos. Me sinto constrangida, humilhada, as pessoas falam que a Arcelor está pagando, mas ninguém sabe o que isso fez com a gente. Tem dia que tenho vontade de ir embora, fiquei desgostosa, perdi as esperanças”, confessou Katiane.
“Tem 15 anos que moro aqui. Vim pra cá adolescente e conheci meu marido, nos casamos e éramos caseiros em um sitio em Pinheiros, mas eu não gosto muito de mato (risos), então depois de um tempo mudamos para Betim, depois compramos um terreno de Juatuba, ficamos lá uns 5 anos e decidimos voltar para Itatiaiuçu, porque quem bebe a água do Pinheiros sempre volta. E decidimos que aqui era o melhor lugar para viver e isso tem 15 anos”, revelou Katiane.
Com mais de um ano do acionamento, perguntei Katiane qual seu sonho hoje: “Comprar uma casa no meio do mato e ficar lá”. Questionei Katiane sobre este sonho, já que ela não gosta de “mato”: “Quero ficar lá sozinha, não tenho vontade de nada, estou desanimada, não vejo esperança”.
O desanimo, a tristeza não é só de Katiane. Jovelmar, que é pedreiro, também não tem vontade de fazer nada. “Nossa casa começou com dois cômodos, hoje ela é grande, mas temos que terminar e falo com Nêgo (como Katiane chama o esposo) para ele arrumar umas coisas, colocar uma janela, mas ele não tem vontade, não é preguiça é desanimo mesmo”. O medo também assusta as filhas, Ludmila e Jennifer: “as meninas nunca foram de falar muito, mas hoje elas estão mais caladas e quando saio de casa e elas precisam ficar sozinhas elas não ficam, vão para a casa da vizinha. Sei que elas sentem algo, mas não falam comigo”, explicou Katiane.

Muitas coisas mudaram na vida da família de Katiane, mas ela lembrou que a comunidade também está diferente. Katiane mora na comunidade Retiro Colonial II, ela recordou que antes as pessoas ficavam na rua, debaixo das árvores conversando, existia mais interação, mas que agora não é assim mais: “Antes estavam sempre na rua conversando, sentávamos debaixo da árvore, mas hoje é todo mundo dentro de suas casas”.
Volto a perguntar a Katiane sobre seu sonho, o que espera para o futuro: “que passe essa crise, estamos na incerteza e queremos o fim para poder decidir coisas pra nossa vida, parece que estamos sem rumo, nunca me senti assim”, desabafou. Katiane vai ser avó pela segunda vez, sua Filha Ludmilla está no sétimo mês de gravidez, Thaís está chegando e espero que ela traga esperança e renovação para Katiane e sua família, que o riso volte a prevalecer na casa e que as incertezas de hoje possam ser a certeza de amanhã.