Confira a cobertura feita pela Aedas das atividades promovidas ao longo do dia, no marco de seis anos do desastre-crime

Celebração Eucarística em memória das 272 joias | Foto: Felipe Cunha/Aedas

São seis anos de saudades das 272 joias, vítimas fatais do desastre-crime do rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, de propriedade da mineradora Vale S.A., no município de Brumadinho, ocorrido em 25 de janeiro de 2019. Desde então, um grito por justiça e contra a impunidade ecoa pelas diversas vozes do território atingido.

Neste sábado (25/01), em que se completa mais um ano do rompimento, a Região Episcopal Nossa Senhora do Rosário (Renser) promove a VI Romaria pela Ecologia Integral a Brumadinho, com o lema “A esperança não se engana”, a partir das 9h. Em seguida, às 11h, a AVABRUM realiza o Ato Por Justiça, Encontro, Memória, Não-Repetição e Direito dos Familiares, na Praça Saudade das Joias. Já no Córrego do Feijão, epicentro do rompimento, acontece uma missa em memória das joias, na Igreja Nossa Senhora das Dores, às 11h.

Coletiva de Imprensa

Mesa foi composta por pessoas atingidas, Renser e Aedas, que assessora as Regiões 1 e 2 | Foto: Felipe Cunha/Aedas

Na coletiva de imprensa, que abre a programação da Romaria, Dom Francisco Cota, bispo da Diocese de Sete Lagoas e referencial para a Comissão Episcopal de Ecologia Integral e Mineração da CNBB Leste 2, destacou a luta por memória e justiça. “Nossa presença hoje é de memória, de não deixar que o crime caia no esquecimento e tudo normalize como se não tivesse acontecido. Não deixar que a morosidade da justiça se afirme em forma de impunidade”, disse.

A atingida Maria Regina da Silva, mãe da joia Priscila Elen Silva e representante da Associação de Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão (AVABRUM), destacou a impunidade das pessoas responsáveis pelo desastre-crime. “Existem 272 pessoas enterradas vivas e existem 16 pessoas e duas empresas que vivem tranquilamente. Nós estamos enterrados todos os dias, nós estamos vivendo o 25 todos os dias”, afirmou.

Maria Regina da Silva, da AVABRUM | Foto: Felipe Cunha/Aedas

Cláudia Saraiva, atingida da comunidade de Ponte das Almorreimas e representante do Coletivo de Pessoas Atingidas de Brumadinho, denunciou os desmandos da mineradora no território e criticou a falta de efetividade da justiça em relação ao rompimento no Córrego do Feijão. “Que justiça é essa que vem uma multinacional entra na nossa casa, destrói nossa vida e ainda manda no território?”, questionou.

Claudia Saraiva, representante do Coletivo de Pessoas Atingidas de Brumadinho | Foto: Felipe Cunha/Aedas

Tata Mebagandi, representante do coletivo PCTRAMA, da Região 2, falou sobre os danos ao Rio Paraopeba e à natureza, que impactam a qualidade de vida e a relação com o sagrado dos povos tradicionais. “A gente vive nas comunidades nas margens do rio e a gente sente na pele, vê todos os dias a situação da natureza. E os povos e comunidades tradicionais, os povos africanos, nossos deuses, o nosso Deus é a própria natureza”, contou.

Ele ainda denunciou a pouca efetividade do Acordo Judicial de Reparação nas comunidades atingidas. “Nós vivemos do Rio, nós vivemos do ar, nós vivemos da terra e a gente vê nesses seis anos o descaso, a falta de piedade com a natureza e principalmente com os seres humanos que vivem na bacia. Nada foi feito pela natureza até hoje, não foi feito para nós, seres humanos. As pessoas que vivem às margens do rio da Colônia Santa Isabel, as crianças, com doenças respiratórias. São vários anexos [do Acordo] que não anexam ninguém”, completou.

Tata Mebagandi, do Coletivo PCTRAMA, da Região 2 | Foto: Felipe Cunha/Aedas

Cacique Sucupira, da aldeia Naô Xohã Paraopeba, povo Pataxó e Pataxó Há-Hã-Hãe, de São Joaquim de Bicas, falou da necessidade de que se cumpram legislações destinadas aos povos tradicionais para garantia de direitos diante dos danos do desastre-crime. “Quem tem voz é a Vale, ela quem manda no processo e diz como serão as regras. Isso não pode acontecer. Nosso país tem que garantir nossos direitos, de todos nós, e nossa soberania enquanto povos tradicionais”, cobrou.

Cacique Sucupira, da aldeia Naô Xohã, de São Joaquim de Bicas | Foto: Felipe Cunha/Aedas

A gerente geral do Eixo Institucional da Aedas, Gabriela Cotta, destacou o papel da Assessoria Técnica Independente enquanto ferramenta de luta das pessoas atingidas. “No trabalho da ATI, cotidianamente ouvimos relatos de violação de direitos, de agravamento de vulnerabilidade, de adoecimento, de falta de água, de coisas básicas. O processo de reparação acontece de forma lenta, com um Acordo que foi firmado sem a participação dos atingidos. A ATI é um direito das pessoas atingidas, um direito previsto em lei, mas que precisamos trazer também para o campo da luta”, disse.

Gabriela Cotta, da Aedas | Foto: Felipe Cunha/Aedas

Renser promove Celebração Eucarística no sexto ano do desastre-crime

Celebração Eucarística, no Santuário Nossa Senhora do Rosário, em Brumadinho | Foto: Felipe Cunha/Aedas

Após a coletiva de imprensa, a Renser realizou uma celebração eucarística no Santuário Arquidiocesano Nossa Senhora do Rosário, em Brumadinho, que reuniu centenas de romeiros de diversas regiões de Minas Gerais. O local serviu de base às famílias atingidas e aos voluntários que prestaram apoio logo após o rompimento da barragem, em janeiro de 2019.

Segurando e erguendo cartazes com os nomes das 272 joias, vítimas fatais do rompimento, familiares e amigos prestaram sua homenagem no sexto ano da tragédia-crime.

Fotos: Felipe Cunha/Aedas

A celebração foi conduzida por Dom Francisco Cota, bispo de Sete Lagoas e referencial para a Comissão Episcopal de Ecologia Integral e Mineração da Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB Leste 2, com a presença de Dom Joel Maria dos Santos e do Padre Marcos Albuquerque, da Paróquia São Sebastião em Brumadinho.

Além de romeiros de município atingidos da Bacia do Paraopeba, participaram da Romaria pessoas da Bacia do Rio Doce, região de Governador Valadares e Itabira. Romeiros da Arquidiocese de Belo Horizonte, Betim e Contagem, dentre outros municípios mineiros também se somaram em solidariedade à atividade. Comunidades tradicionais como povos indígenas e quilombolas também marcaram presença na celebração.

Romeiros percorrem ruas da cidade na VI Romaria pela Ecologia Integral a Brumadinho

Romaria em direção à Praça Saudade das Joias | Foto: Felipe Cunha/Aedas

Por volta das 11h20, os romeiros saíram do santuário em direção à Praça Saudade das Joias, local onde a AVABRUM organizava uma série de homenagens. No percurso até a praça, os participantes da Romaria levantaram cartazes, fizeram orações e cânticos. Também presentes, os povos indígenas tocavam maracás e ecoavam cantos tradicionais. A imagem de Nossa Senhora da Abadia foi levada do Santuário até o ato dos familiares.

Em uma das esquinas entre o Santuário e a Praça, o olhar saudoso de Dona Maria, de 96 anos, relembrou o neto, Max Elias de Medeiros, que perdeu a vida no rompimento, aos 38 anos de idade. Na calçada, ao lado da filha e da comadre, sentada em uma cadeira de rodas, Dona Maria fez da presença na Romaria um grande ato de memória.

“Para mim é muito triste, meu neto está no meio aí [uma das 272 vítimas]. É saudade demais, nós era muito apegado demais. Foi a maior ‘facada” que eu já levei’”, disse Dona Maria, tentando traduzir em palavras a dor que carrega depois de seis anos de luto.

Ao lado da mãe, Anélis Cândida Medeiros contou que aquela era a maneira como podiam acompanhar o dia de hoje. “É uma coisa que marca pra sempre, a gente nunca vai esquecer. Eu acho que é uma lembrança boa para eles, acho que nunca será esquecido”, contou Amélis, emocionada pela memória do sobrinho.

Familiares de Marcos Medeiros, vítima fatal do rompimento | Foto: Valmir Macêdo/Aedas

A atingida Valéria Carneiro, do Assentamento Pastorinhas, chamou a atenção para a necessidade de contar a história do crime de Brumadinho, que ainda tem impunes os responsáveis pelo rompimento. Ela alerta para a falta de cobertura da grande imprensa das atividades. “A busca por memória e perpetuação dessa memória é também a busca por justiça. Hoje, eu fiquei muito preocupada quando a imprensa não cobre os atos populares. Isso mostra que a história de Brumadinho teve a página virada”, disse.

“Isso nos traz muita preocupação, porque não há justiça se não houver perpetuação da memória. E o povo que não conta sua história, está fadado ao fracasso. Hoje, diante de todas as dores e tristezas, essa também foi uma que me alertou, em como que essa história está sendo contada para o mundo”, lamentou.

Em contrapartida, ela destaca o papel da mobilização popular em memória das joias. “Eu estou muito feliz de ver várias pessoas participando e acreditando na força popular. Se de um lado essa força midiática não quer contar nossa história, nós vamos na contramão da sociedade contando que teve um crime e que a gente ainda luta por justiça”, afirmou.

Atingidas levaram cartazes com nomes das vítimas fatais | Fotos: Felipe Cunha/Aedas

Em solidariedade aos atingidos de Brumadinho, a comissão de atingidos da R2, Adeíva Maria da Conceição, da comunidade Boa Esperança, de São Joaquim de Bicas, participou das atividades deste sábado. “Hoje é um dia triste para mim. Eu vim aqui para mostrar minha solidariedade enquanto líder da minha comunidade. Eu também sofri danos, mas aqui em Brumadinho foi pior porque perdeu vidas. Foram 272 vítimas fatais, além da contaminação pelo rompimento”, disse.

Uma das preocupações de Adeíva após seis anos do rompimento é com a pouca efetividade do acordo em promover a reparação. “É uma coisa inexplicável até hoje nós não termos uma reparação e agora eles vão diminuir o PTR. O rio não foi despoluído até hoje, nós não podemos pescar no rio mais. Se o PTR acabar, não sei o que o povo da Bacia vai fazer, porque reparação até hoje não tivemos”, lamentou.

Camila Moreira, que integra a comissão de atingidos de Brumadinho, citou a presença das pessoas atingidas do Paraopeba como uma força nesse momento de solidariedade. “A união faz a força. Acho que a presença deles é fundamental. Brumadinho chora pelas 272 pessoas e, junto a eles, foram impactados no Rio Paraopeba. Eu acho que todo mundo tem que andar de mãos dadas, porque eu acho que junto somos mais fortes”, afirmou.

“Eu acho gigantesco o movimento em homenagem às joias, acho também um momento dificílimo que, independente de divergências, a gente se une em prol de homenagear as vítimas, dar esse conforto aos parentes. É um momento triste, mas eu acho importante para que a gente continue relembrando desse homicídio programado pela Vale”, completou.

Memória Irreparável: ato da AVABRUM chora a saudade das joias e clama por justiça diante da impunidade

Anastácia do Carmo, mãe da joia Cleiton Luiz Moreira Silva, abraça bombeiro que atuou na busca das joias | Foto: Felipe Cunha/Aedas

No sexto ano de ausência das joias, vitimada pela mineradora Vale S.A. no desastre-crime do rompimento da barragem da Mina Córrego do Feijão, a Associação de Familiares de Vítimas e Atingidos pelo Rompimento da Barragem Mina Córrego do Feijão (AVABRUM) promoveu o Ato por Justiça, Encontro, Memória, Não-Repetição e Direito dos Familiares, na Praça Saudade das Joias, sede de Brumadinho.

Fotos: Felipe Cunha/Aedas

O ato teve início com a chegada da imagem de Nossa Senhora da Abadia da Água Suja, representando a mãe que sofre pela partida do filho, e da cruz com os nomes das 272 joias.

Às 12h28, foi feito o minuto de silêncio e a soltura de 2.195 balões, representando a quantidade de dias desde o rompimento. Neste mesmo horário, em 25 de janeiro de 2019, foi quando a estrutura da barragem colapsou, despejando uma avalanche de lama sobre as vítimas fatais e provocando danos socioambientais sem precedentes na Bacia do Rio Paraopeba.

Balões com sementes de girassóis foram lançados ao céu de Brumadinho representando o número de dias desde o desastre-crime; são 2.195 | Foto: Felipe Cunha

A presidente da AVABRUM, Nayara Cristina Ferreira, comentou sobre o ato, que tem como objetivo acolher os familiares e fazer memória das 272 joias. “A gente tenta fazer desse evento um abraço para os familiares. É um momento que realmente a gente tem a troca, porque tem pessoas do mundo inteiro. É o momento que eles têm para se reencontrarem, conversarem, se abraçarem, porque pra gente é muito doído. A gente vive realmente no dia 25 todos os dias”, afirmou.

Dentro do processo de reparação, há uma realidade de que vidas são irreparáveis. Chamando a atenção pra essa realidade das famílias das joias, a AVABRUM definiu para a celebração dos 6 anos o tema Memória Irreparável. “Vidas não se reparam. Não há reparação para a morte na verdade. Eles não vão voltar, mas que a memória deles fique viva e que reflita para todo canto, que mostre a verdade sobre o que realmente aconteceu aqui em 25 de janeiro de 2019”, completou Nayara.

A celebração contou com a presença da ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania, do Governo Federal, Macaé Evaristo, que destacou a necessidade da memória e da reparação diante da especulação e do dinheiro. “Na retomada da democracia brasileira, é a gente fazer com que os crimes contra a vida, com que a especulação que passa sobre a vida das pessoas, ela seja lembrada, que a verdade seja estabelecida e que as comunidades tenham reparação”, disse.

“Nesses seis anos do crime aqui em Brumadinho, é muito importante a presença do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania para reafirmar, primeiro o compromisso do presidente Lula com a verdade, com a justiça, com a reparação e com a vida humana. E segundo, para dizer que é necessário que, além das reparações individuais, a gente tenha um compromisso efetivo com a reparação coletiva, que passa por ter memória, verdade, memoriais que lembrem isso, mas, mais do que isso, com a dignidade humana, com o respeito a esses territórios, com a cessão daqueles mecanismos que fizeram que o crime ocorresse. Tudo em nome da vida, nada em nome só da especulação e do dinheiro”, afirmou.

Veja o vídeo do dia 25 de janeiro de 2025 em Brumadinho

Caminhada pela comunidade e missa celebram a memória das 272 joias, no Córrego do Feijão

Comunidade é o epicentro do rompimento da barragem, em 2019 | Foto: Patrícia Sousa/Aedas

O dia de celebrações no Córrego do Feijão iniciou com uma caminhada pela comunidade, conduzida por moradores locais e pelo Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), sinalizando nas casas e terrenos os nomes das joias perdidas, seus familiares e entes queridos que tiveram que deixar o território, em um deslocamento forçado pela Vale S.A., responsável pelo desastre-crime.

Hoje, a maioria dos imóveis se tornou propriedade da mineradora. A sinalização com o nome das joias foi finalizada na portaria de acesso para a área de remanso da Mina Córrego do Feijão.

Portaria da Mina Córrego do Feijão | Fotos: Patrícia Sousa/Aedas

Em seguida, a Igreja Nossa Senhora das Dores abriu suas portas para uma missa em memória das 272 vítimas do rompimento. A celebração deste 25 de janeiro foi conduzida pelo padre José Evair. A igreja e o campo de futebol, destaques da comunidade, foram o ponto de apoio para as operações de resgate. Desde 2019, em todo dia 25 é realizada uma missa para homenagear as vítimas.

Foto: Patrícia Sousa/Aedas

Às 12h28, horário em que rompeu a barragem, o sino da igreja ressoou em 272 badaladas em memória às joias perdidas.

Para a atingida e moradora do Córrego do Feijão Carmem Sandra, a memória das joias deve ser cultivada diariamente. “Que o dia 25 seja todo dia, que nós possamos fazer as nossas preces, as nossas orações onde quer que a gente esteja, sempre lembrando deles, não só no 25 de janeiro, porque 25 é todo dia”, afirmou.

A celebração, segundo ela, é a forma de manter viva a história dessas pessoas. “O dia 25 não é uma comemoração, nós temos que lembrar que hoje é um dia de memória, de a gente lembrar e ver que esse dia foi e é muito triste para todos aqueles que viveram. E fazer memória a essas 272 joias é não deixar que a morte aconteça. A morte existe quando cai no esquecimento”, disse.

Reportagem: Júlia Rohden, Patrícia Sousa e Valmir Macêdo

Cobertura fotográfica: Felipe Cunha

Edição de conteúdo no site: Diego Cota

Cobertura nas redes: Isis de Oliveira

Design para redes: Aleff Rodrigues

Cobertura audiovisual: Douglas Keesen e João Paulo Dias

Coordenação: Elaine Bezerra


Outras atividades realizadas na semana que marcou os 6 anos do rompimento