Matérias especial do jornal Vozes do Paraopeba resgata reflexões históricas sobre a atividade minerária e a exploração da população negra

A origem da mineração em Minas Gerais é marcada pela ação e cultura dos bandeirantes, descendentes da primeira e segunda geração de portugueses em São Paulo. As bandeiras consistiram em expedições a procura de ouro, escravizando homens e mulheres indígenas e africanos, deixando o rastro de morte em sua passagem, com dizimação de aldeias e quilombos. O desenvolvimento da mineração marcado pela industrialização, é cenário de um contínuo histórico para exploração de mão de obra humana sujeitada a sucessivas tragédias, acidentes, adoecimentos e péssimas condições de trabalho.
Os africanos da Costa da Mina, região que abrigava os países de Togo, Benin e Nigéria eram conhecidos por sua habilidade e experiência com a mineração, por isso muitos deles foram trazidos para a região aurífera no Brasil, introduzindo o emprego de diversas técnicas à atividade minerária brasileira.
Começou-se a exploração de rochas localizadas nas encostas das montanhas. Grandes sistemas de extração foram construídos, desde escavações das encostas até canais de drenagem e ventilação. A partir daí, os acidentes e desastres foram progressiva e continuamente aumentando. Na edição de maio do Vozes do Paraopeba, chamamos atenção para o 13 de maio e 1 de maio, referentes a Abolição da Escravatura e ao Dia do Trabalhador.
Mulheres

No passado, mulheres negras e indígenas estavam presentes no comércio, na alimentação e nos serviços necessários para a existência da mineração. Quebrar pedra nas minas, por exemplo, era uma função muito exercida pelas mulheres. Elas resistiram à escravidão, às violações sexuais e exploração trabalhista. Hoje, mulheres atingidas, em decorrência da atividade mineradora e do rompimento, enfrentam problemas de violência doméstica, aumento da jornada de trabalho, sobrecarga de cuidados com familiares entre outros danos e agravamentos.
Acidentes de trabalho na mineração
Atualmente, Minas Gerais e Pará são os estados brasileiros nos quais os trabalhadores/as vivem com maior probabilidade de morte no trabalho. Nestes lugares é que estão, não por coincidência, as maiores instalações de mineração do país e do mundo, por exemplo a Serra dos Carajás (PA). A Fundação Jorge Duprat e Figueiredo (Fundacentro) aponta em pesquisa que o “Índice Médio de Acidente Geral no Brasil foi de 8,66%. Por sua vez, o indicador de acidentes de trabalho na mineração em Minas Gerais, tem índice de 21,99%, quase o triplo que a média do país.

Isso evidencia que a sequência de relatos de episódios de adoecimentos, acidentes e mortes na atividade minerária, que apresentamos, é um contínuo histórico atrelado às violações de direitos humanos e trabalhistas que acontecem constantemente neste setor.
Entre escravizados/as e trabalhadores/as

Os trechos a seguir fazem parte de pesquisa das Equipes de Relações Étnico-Raciais e Povos e Comunidades Tradicionais da Aedas e explicitam relação histórica dos acidentes de trabalho, marcados pela relação entre Raça e Mineração nos territórios atingidos pela atividade minerária até dias de hoje.
Origem
“…tirar o ouro he mui arriscado, porque sucede muitas vezes de cahir a terra e apanhar os negros debayxo deitando-os enterrados vivos”
Fonte: Diário do Conde Assumar, 1717
Os escravizados trabalhavam sob risco de morte. Soterramento ou afogamento devido o rompimento de barragens eram os acidentes de trabalho mais comuns.
Fonte: Diário do Conde Assumar, 1717.
No início do século XVIII, o cirurgião Luis Gomes atendeu em Vila Rica/MG muitos casos de doenças e fraturas provocadas pelo trabalho minerário
Fonte: Diário do Conde Assumar, 1717.
As péssimas condições de trabalho dos negros escravizados se somavam à fome, a proliferação de doenças como desinteria, malária e doenças pulmonares.
Fonte: Diário do Conde Assumar, 1717.
Desenvolvimento
“O horror de um homem em uma mina por um dia […] de ouvir estalar a cada instante a montanha sobre sua cabeça, esperar a cada passo pela morte.”
Fonte: Couto, J. V. 1799
Na mineração de ouro não Silvestre Antonio da Silva, 2023 havia equipamentos de proteção para escravizados. Muitos desenvolveram doenças pulmonares como silicose e tuberculose.
Fonte: Coelho, T. 2013
A Mina do Morro Velho, em Nova Lima/MG, se destaca na história da mineração. Pertencia à ingleses e em parte do século XX, foi a mais produtiva no país.
Duas tragédias marcam sua história. Em 1867, 17 escravos morrem soterrados na mina, e em 1886, a história se repete. A mina foi desativada em 2003.
Fonte: Coelho, T. 2013; Moura, C. 2013.

A mineradora inglesa Saint John Del Rey se destacou no setor mineral no Brasil nos séculos XIX e XX, chegando a ser a mais produtiva do país e do mundo. Seu histórico inclui vários acidentes de trabalho e mortes de escravizados, evidenciando a violência e exploração empenhada por brancos brasileiros e estrangeiros e sofrida por negros e indígenas na mineração nacional.
O uso de equipamentos de segurança do trabalho só se tornou obrigatório nos anos 40, a partir de legislações trabalhistas que surgiram na época.
Fonte: EAKIN, 1989
Cenário Atual
Durante a história da mineração em Minas Gerais houve pouca ou nenhuma regulamentação e/ou fiscalização quanto à segurança dos trabalhadores.
Fonte: EAKIN, 1989.
Em 2015, em Mariana/MG acontece o rompimento da barragem da Samarco, que causa 19 mortes, a destruição do Rio Doce e de cidades mineiras e capixabas.
Fonte: G1, 2015.
“A primeira coisa [instrução] sobre acidente de trabalho, que eu lembro, eu tinha mais de 10 anos de rede ferroviária, quando veio a turma de prevenção de acidente explicar. O que tínhamos era a consciência dos mais velhos e experientes até então. Você aprendia com eles. Mas
treinamento, não existia isso não.”
Silvestre Antonio da Silva, 2023
No ano de 2019, em Brumadinho/MG acontece o maior acidente de trabalho do mundo. O rompimento da Barragem da Vale deixa 272 trabalhadores mortos.
Fonte: Brasil de Fato, 2019
Texto: Equipes de Relações Étnico-Raciais e Povos e Comunidades Tradicionais da Aedas
Revisão: Equipe de Comunicação
Cartaz especial
Na página 12, a edição traz um cartaz especial em alusão ao 13 de maio, com colagens de fotos e ilustrações históricas que retratam o tema Raça, Mineração e Trabalho, tema das páginas 6 e 7.

Colagem: Aleff Rodrigues/Aedas
