Nesta 4ª edição, seguimos fortalecendo a memória, a informação e o registro da luta das comunidades atingidas na busca por direitos. Os conteúdos abordam temas essenciais do processo de reparação, como a atuação das mulheres atingidas, a luta das comunidades quilombolas por reconhecimento, além das datas e prazos abertos no processo de reparação.

Trazemos também reflexões sobre datas importantes, como o 14 de março – Dia Internacional de Luta contra as Barragens, o Dia Mundial da Água e o Dia Mundial da Infância. A edição ainda destaca a Caravana Interministerial realizada pelo Governo Federal na Bacia do Rio Doce e apresenta o calendário cultural, destacando os 27 anos de existência do Assentamento Liberdade.

Acompanhe o Editorial desta edição e acesso a versão digital.

Anunciamos o que foi, o que é e o que será! 

Mais uma edição do Jornal Territórios pronta para circular nas comunidades atingidas pelo rompimento da barragem de Fundão. Esta é a quarta vez que esse impresso, recheado de informações sobre o processo de reparação, memória da luta popular e registros da constante busca por direitos, chegará às mãos das pessoas atingidas no Vale do Aço, no Leste de Minas e em outros territórios. E por falar em números, trazemos para destaque um especialmente significativo: dois anos. 

Esse é o tempo que completamos desde que a Aedas, escolhida como assessoria técnica independente para 15 municípios no Médio Rio Doce, iniciou sua atuação nos territórios, com equipes multiprofissionais chegando às comunidades para apoiar o processo de reparação. 

O direito à Assessoria Técnica foi uma conquista alcançada pelos atingidos e atingidas, fruto de uma intensa mobilização popular iniciada em 2016, mas só efetivada em novembro de 2022 por decisão judicial. 

Desde março de 2023, depois do período de implementação inicial, o trabalho realizado pela Aedas segue acontecendo com uma metodologia principal: a participação ativa na tomada de decisões das pessoas que foram atingidas pelo desastre-crime de responsabilidade das mineradoras Samarco, Vale e BHP. 

Sabemos que a reparação integral só acontece com protagonismo dos atingidos e atingidas. É por isso que seguimos fortalecendo a mobilização popular, através das Comissões organizadas, dos Grupos de Atingidos e Atingidas e dos Agentes Multiplicadores em cada território. 

Nesses espaços participativos e no trabalho com as lideranças, as pessoas atingidas têm apresentado diversas demandas comunitárias. As equipes técnicas têm acolhido, registrado, tratado e encaminhado as reivindicações a partir da elaboração de ofícios e pareceres que foram endereçados para as instituições do sistema reparatório vigentes à época e seguirão encaminhadas ao Governo Federal, novo ator do processo após a repactuação. 
 
Com escuta, conhecimento, aprendizado, apoio, fortalecimento, compartilhamento de saberes e conversa, temos ajudado a aprofundar a luta por justiça com aqueles que são os legítimos protagonistas da reparação. São mulheres e homens, povos e comunidades tradicionais, indígenas, crianças, trabalhadores e trabalhadoras das cidades e do campo. 
 
 

Por causa deles, a luta continua: por acesso contínuo a água potável e em quantidade adequada, pela indenização justa dos danos ainda não reparados, pela garantia de direitos fundamentais a todas as pessoas, pela restauração dos modos de vida, dos costumes e cultura, dos laços comunitários, do trabalho e da renda. É para garantir a saúde plena, física e mental, de todas as famílias.  

Para permitir que todos e todas possam voltar a conviver com um meio ambiente equilibrado, limpo, saudável. Para que as enchentes deixem de ser um medo, porque agora não trazem mais a fertilidade para as plantações, mas rejeitos de mineração e destruição para as casas das pessoas. Para que possam, mais uma vez, tomar banho no rio que passa no quintal de suas casas, onde as crianças brincavam e os pais pescavam um peixinho, da forma como aprenderam com seus avós. A luta é para que as mulheres sejam sempre reconhecidas iguais aos homens. É por igualdade racial. É para que comunidades tradicionais, quilombolas e indígenas tenham seus direitos garantidos, seus modos de vida e sua cultura respeitados e valorizados. 

A luta continua porque o povo atingido tem que viver bem. Porque o povo atingido tem que ter o direito de viver bem de novo. Porque cada comunidade tem a esperança de voltar a viver. E a esperança movimenta. E o movimento dá vida. 

É como um rio: nasce forte, rompe o chão. Vira riacho, escorre pelo caminho, se junta a outros, vira potência. Serpenteia pelo mundo, percorre o território, fica bravo quando precisa avançar, coloca força na correnteza e fica calmo quando encontra terra boa. Irriga o em torno, fertiliza a plantação, traz boa colheita. Conhece histórias, cria outras, leva o que precisa ir. Desagua no mar e vira imensidão. 

 
Entendemos que o tempo pode não ser algo possível de tocar, mas ele consegue se materializar através das transformações humanas e sociais que percebemos a partir dele. Dois anos de atuação após um direito conquistado, que nos preparam para mais. É por isso que o escritor Eduardo Galeano, em seu livro As Veias Abertas da América Latina, destaca: “A história é um profeta com o olhar voltado para trás: pelo que foi, e contra o que foi, anuncia o que será.”.  

O passado nos ensina, o presente nos convoca e o futuro nos desafia junto a cada atingido e atingida. Sigamos fortalecidos pelo coro de justiça: povo em luta, rio de esperança!